O Limce: “Eu sempre achei que, em muitas rimas e analogias do rap, o coração não fala”


O compositor, poeta e rapper, autodidata, nascido e criado na Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, Duque de Caxias, acabaça de lançar a faixa ‘Suave na Nave’. Ele faz um chamado para que o universo do rap seja mais suave, com mais consciência, e para que haja mais respeito à memória ancestral. Também coloca holofotes sobre letras que ofendem e mostram a ostentação

O Limce: “Eu sempre achei que, em muitas rimas e analogias do rap, o coração não fala"

O rapper O Limce pede mais verdade no universo do rap brasileiro, na faixa ‘Suave na Nave’ (Foto: Diogo Lisboa)

*Por Rafael Moura

Depois de pedir o fim da corrupção e da politicagem no manifesto ‘Eu, Resisti’, o rapper Luciano Moreira Pinto, mais conhecido como O Limce, traz a faixa ‘Suave na Nave’  e em seus versos um chamado para que o universo do rap seja mais suave, com mais consciência, e para que haja mais respeito à memória ancestral. Ao mesmo tempo em que pede essa suavidade, o artista também chama a atenção para o quanto rimas que ofendem e a ostentação que podem ser prejudiciais. “Eu sempre achei que, em muitas rimas e analogias do rap, o coração não fala. Em ‘Suave na Nave’ eu abordo o que entendo como falta de suavidade e de conteúdo no meio e nas rodas. É importante estar suave e buscar isso”, desabafa do artista, nascido e criado na Baixada Fluminense, autor dos beats e da letra da música.

(Foto: Diogo Lisboa)

“Eu sempre achei que, em muitas rimas e analogias do rap, o coração não fala”, diz O Limce (Foto: Diogo Lisboa)

A capa e a faixa mergulham no afrofuturismo, estética cultural que combina as filosofias da ciência, história e arte em conjunto com elementos de ficção científica, fantasia, arte africana, além do realismo mágico com cosmologias não-ocidentais para criticar não só os dilemas atuais dos negros, mas também para revisar e reexaminar os eventos históricos do passado. O movimento foi cunhado pelo autor americano Mark Dery, em 1993, e explorado no final da década de 90 através de conversas lideradas pela estudiosa Alondra Nelson. O gênero artístico aborda temas e preocupações da diáspora africana através de uma lente de tecnocultura e ficção científica, abrangendo uma variedade de meios de comunicação e artistas com um interesse compartilhado em imaginar futuros negros que decorrem de experiências dessa migração cultural.

Em um ano em que a emergência sanitária causada pela Covid-19 provocou muitos alto e baixos no mundo – políticos, econômicos, social e mental -, o músico propõe no single uma reflexão olhando para a ‘Era da Empatia’, pedindo por mais verdades e suavidades no meio do rap. O EP é a primeira parceria do rapper com a produtora Mix Lab, em ascensão, dos jovens produtores musicais 2F U-FLOW, responsável pela masterização, e Medeirin, que co-criou os beats com O Limce e mixou o single. A capa é uma criação exclusiva do designer e artista carioca Rafael Fuly.

A capa do single ‘Suave na Nave’, criação do artista carioca, Rafael Fuly, especialmente para o rapper O Limce

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Os versos mandam um papo reto que, segundo o artista, é a melhor forma de conscientizar a sociedade. ‘Por aqui…/ A missão é sinistra no ir e no vir/ Quem devia ajudar, atrapalha/ É o boné, é um cordão, é o falso MC/ É o tempo encurtando, é o verso que arrasta / A bandeira, a divisa pra dissuadir/ Pano sujo os moleque, é a rima que ofende’. No primeiro trabalho com Medeirin, O Limce explica que o produtor fez uma “transliteração” das bases criadas por ele. “Ele acrescentou uma visão diferente, trazendo um frescor que deu personalidade aos beats”. E completa: “Acho que o principal recado de Suave na Nave é que quando você quer encontrar a plenitude, seja no meio do rap ou em qualquer lugar, precisa expandir a cabeça e não o exterior”.

Na faixa o multiartista mergulha nos conceitos afrofuturistas refletindo sobre um novo horizonte para a diáspora

A carreira desse multiartista se apropria das linguagens urbanas para mostrar as mazelas sociais, as desigualdades, as inequidades e o retrato de um Brasil injusto. Autodidata, começou a escrever em 1994 quando ainda trabalhava na construção civil e auxiliava em diversos projetos sociais nas ruas de Caxias. Nessa mesma época, começou a se relacionar com o rap. Incentivado pelos amigos, ele transformou seus textos em música e começou a criar beats. Hoje, com mais de mil textos escritos, O Limce tem um livro de poesias, ‘Cavalo de Troia’, publicado pela Editora Autografia. Na música, ele acaba de lançar o álbum ‘1985’ (2020) e tem em seu repertório os EPs: ‘Outra Dimensão’, de 2020 e ‘Cavalo de Troia’, 2018, além de singles e séries para o YouTube.