“Na pandemia, caí de cabeça no trabalho, não consegui fazer nem ovo mexido”, diz Fernanda Abreu


A gravação do DVD “Amor Geral | (A)live”, que acabou sendo feita sem público por causa da Covid-19, é um dos projetos dos 30 anos de carreira da artista. Completando 60 anos em 2021, ela conta que mantém a forma cuidando da alimentação e fazendo exercícios, sem recorrer a procedimentos estéticos. “O que a gente viu de uns anos para cá foram muitas mulheres perdendo um pouco a mão, às vezes ficando com muito botox. É uma loucura. Fora que fica uma coisa meio falsa. Bota o queixo, tira um pouco do nariz, tira a bochecha. As pessoas piraram um pouco nesse negócio”, comenta.

*Por Simone Gondim

Mãe do Pop Nacional, Madrinha do Funk Carioca e, agora, Precursora das Lives no Brasil. Em março, quando decidiu gravar, mesmo sem público, o DVD “Amor Geral | (A)live”, na casa de shows Imperator, no Rio de Janeiro, Fernanda Abreu não poderia imaginar que ditaria uma tendência destes tempos de pandemia e distanciamento social. “Uma hora e meia antes do espetáculo, com fãs na fila lá fora, vieram ao camarim dizendo que tinha um decreto do governador proibindo shows e eventos, valendo a partir daquele momento”, lembra Fernanda. “Foi aquela loucura, aquele corre-corre, pedi para a minha produção avisar ao público, que saiu desolado do teatro, claro, mas compreendeu. Lá dentro, juntei a banda e a equipe toda e falei: vamos gravar assim mesmo, porque não sabemos o que vem pela frente. Estamos com o circo todo montado, temos muita experiência, muitos anos de palco, isso não vai abalar a gente. Nós vamos gravar o show de cabo a rabo. Foi assim que criei, involuntariamente, a primeira live da pandemia. Acabei gravando o DVD em um momento histórico para a humanidade”, acrescenta.

Aos 59 anos, sendo 30 de carreira solo, a artista conta que tinha vários projetos presenciais engatilhados para 2020, mas precisou parar por causa dos riscos relacionados à Covid-19. Assim como aconteceu em 2016, quando lançou o CD de estúdio “Amor geral” após um período difícil na vida pessoal, que incluiu a morte da mãe e o fim do casamento com Luiz Stein, pai de suas duas filhas, Sofia e Alice, Fernanda libera o DVD ao vivo em meio a uma temporada turbulenta – além da pandemia, o pai dela morreu em março, em consequência de câncer. “Caí de cabeça no trabalho. Acho que muito pela tristeza de perder o meu pai e a situação de não poder sair de casa, emburaquei no meu estúdio e acabei trabalhando intensamente na mixagem, masterização e edição do DVD, com toda a parte gráfica, release e fotos de divulgação”, explica.

(Foto: Alexandre Calladinni)

O mergulho no lado profissional rendeu ainda outro projeto de CD, chamado “Fernanda Abreu, 30 anos de baile”, ainda sem previsão de chegar ao mercado. “São 13 remixes inéditos de DJs que acompanharam minha carreira. É uma cena que sempre esteve muito próxima de mim e, por isso, quis fazer uma homenagem. Tem a participação de Tropkillaz, Dennis DJ, DJ Corello, Memê, Zé Pedro, Gui Boratto, Projota e Emicida“, adianta a artista. “Ficou incrível, a gente tem vários estilos, house, charme, electro e música eletrônica. Estou esperando só um pouco para ver se essa vacina chega, porque é um disco muito para pista, para baile, para balada. Para aglomeração”, resume.

Enquanto muitas pessoas aproveitaram o período de distanciamento social para desenvolver habilidades na cozinha ou em consertos domésticos, Fernanda apostou no que faz melhor: música. Além do DVD ao vivo “Amor geral”, foram lançados o single “Do Ben”, parceria com Pedro Luís em homenagem a Jorge Ben Jor, e a coletânea “Slow dance”, que traz canções como “Um amor um lugar”, “Hello baby” e “Valsa do desejo”, entre outras. “Fui emendando uma coisa na outra, não parei. Imagina o que é fazer um projeto desse tamanho, de um CD e um DVD, e de um CD de remix com 13 DJs, inclusive do exterior. É uma quantidade de autorização, fotos, imagem, mixagem, masterização, release.. Para 2022, ainda quero montar uma exposição”, diz. “Trabalhei bastante, de manhã até de noite, nesses projetos dos 30 anos de carreira. Não consegui fazer nem ovo mexido”, confessa.

(Foto: Alexandre Calladinni)

Além da questão humanitária, Fernanda tem mais um motivo para torcer pela vacina contra o coronavírus: a chegada dos 60 anos, em 2021. “Adoraria fazer um festão. Tomara que dê e em setembro já consiga fazer uma festa incrível, com muita dança e muitos amigos. É ótimo chegar nessa idade, porque você olha para trás e vê as coisas que conseguiu conquistar. Tive uma vida de muito trabalho, muita inspiração e muita transpiração, mas muita sorte, também. Construí uma carreira legal”, afirma. “Hoje, as pessoas me consideram a mãe do pop nacional, isso para mim é um título superbacana, como o de madrinha do funk carioca. Só coisas boas, quando você chega aos 60 anos e tem esses títulos que passou cada dia construindo, desde os 19 anos de idade. É uma sensação gratificante e animadora, dá estímulo para continuar fazendo coisas novas e surpreendendo o público. Eu me sinto uma menina”, completa.

Fisicamente, Fernanda também está ótima, com a mesma energia que é uma de suas marcas registradas, assim como o lindo sotaque carioca. Mas, por enquanto, nada de procedimentos estéticos. “Tento ficar relaxada. Vai cair a cara. Caiu? Quando cair e eu tiver coragem, quem sabe não faço um lifting, uma plástica. Mas, por enquanto, meu medo ainda é maior do que a coragem de entrar em uma sala de cirurgia”, assume. “Sou um pouco de uma outra geração, na minha casa sempre se valorizou muito a leitura, a inteligência. Tenho esse lado físico, claro, moro no Rio de Janeiro e vou à praia, sou figura pública, quero estar bonita. Mas também acho que não dá para ficar maluca. O que a gente viu de uns anos para cá foram muitas mulheres perdendo um pouco a mão, às vezes ficando com muito botox. Daqui a pouco, chegaremos a um equilíbrio. Mas é uma loucura. Fora que fica uma coisa meio falsa. Bota o queixo, tira um pouco do nariz, tira a bochecha. As pessoas piraram um pouco nesse negócio”, opina.

(Foto: Alexandre Calladinni)

A forma é mantida sem paranoia, cuidando da alimentação e fazendo exercícios. “Como absolutamente tudo: gordura, linguiça, batata frita, hambúrguer. Só que pouco, tenho um equilíbrio. Tento comer coisas orgânicas e fazer uma alimentação bem legal em casa. E tem que fazer exercício todo dia. O corpo tem memória”, ensina. “Fiz balé a minha vida inteira, depois fiz ioga e dança contemporânea, em seguida Pilates. Vou misturando. Nesses últimos anos, misturei caminhada, ioga, Pilates e balé. Acho que o mais importante é uma certa vontade de viver, produzir, sonhar, realizar, ter energia. Isso é que te move para a frente. Movimento gera movimento”, observa.

Lutar contra a vontade de não fazer nada é outro ponto importante. “Algumas vezes, quando você cai em uma coisa mais acomodada, é aquela preguiça, o papo de eu ia começar hoje a ginástica, mas não comecei essa segunda e vou começar na outra segunda. Só que, aí, já passou terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo. Não pode. Não começou essa segunda, começa terça. Não tem problema. A preguiça é ruim para a gente”, alerta. “Isso é uma coisa que eu não tenho. Vou à luta. Acho que muito da minha disposição vem da vontade de acordar todo dia e fazer coisas. Não procrastinar. Não desistir. Está chovendo? Não dá para andar, então deixa eu deitar um pouquinho nesse tapetinho e fazer um alongamento. Estou com preguiça? Tudo bem, vou fazer só um alongamento de 15 minutos. Mas todo dia fazer alguma coisa”, pondera.

(Foto: Alexandre Calladinni)

A pressão da sociedade machista em cima das mulheres também é algo a ser combatido. “Vários homens se descontrolam e ninguém chama de histérico. Tive que botar muito o pau na mesa, como diz um amigo meu. Tem que ser assertiva, mesmo, senão o povo te engole. E existe essa coisa chata de ficar provando alguma coisa o tempo todo. Não é possível que a mulher seja bonita e também inteligente. É demais para os homens”, comenta. “A mulherada precisa fazer essa pressão que está rolando mesmo, porque senão montam em cima. Não adianta os homens ficarem dizendo ‘ai, que chato esse assunto’. Chatos são vocês”, afirma.

No que se refere aos haters e à cultura do cancelamento, Fernanda faz a linha “Sem tempo, irmão”. “Se tem muito hater, deixo falando sozinhos. Minha relação com rede social é assim: gosto de mostrar para as pessoas o meu trabalho e um pouco do que eu penso sobre a vida, sobre política, sobre a casa, sobre as coisas. Sou bem verdadeira nas redes sociais. Se a pessoa não gostar, paciência”, garante. “Fico preocupada com as pessoas mais novas, tem gente que se mata. É muito sério. Estava vendo outro dia um documentário no qual os próprios caras que criaram as redes sociais admitiam que perderam o controle. Fica uma coisa maluca, uma vida virtual em que as pessoas não se encontram, não falam, e ao mesmo tempo seguem vivendo dessa maluquice de rede social, de ser aceito e mostrar uma vida que não tem. Todo mundo é feliz, aí a pessoa que não tem estrutura olha aquilo e pensa: nossa, só eu que sofro”, lamenta a artista.

Em relação às filhas – Sofia tem 28 anos, e Alice, 21 – Fernanda observa uma grande diferença no trato com a internet. “A Sofia é médica, não curte muito esse negócio de rede social. Ela estuda o tempo inteiro, está fazendo residência em neurologia, então não tem tempo. Nem posta muito, a rede dela é privada. A Alice, não. Trabalha com moda, gosta de acompanhar as pessoas que estão aí, meninas que são influenciadoras de moda e tal”, descreve. “Aqui em casa a gente está sempre conversando sobre isso. Elas são muito situadas. Fico feliz. Minha melhor missão, meu melhor papel na vida foi conseguir dar uma educação e aprender com elas, também, estar sempre próxima. Acho fundamental. Tem um monte de pai e mãe que são muito ausentes, aí os filhos ficam malucos”, resume. “Tomei cuidado para ficar bem próxima, me desdobrei muito para estar em todos os dentistas, todas as reuniões de escola, levar e buscar, fazer dever, estar presente em todos os momentos. Na adolescência, principalmente, quando começa a pintar fumar um cigarro, beber um chopp, é fundamental estar sempre junto, dialogando, para não perder o bonde”, conclui.

Confira a lista completa de músicas do DVD “Amor geral | (A)live”

  • Amor geral
  • Outro sim
  • Eu vou torcer
  • Saber chegar
  • Você pra mim
  • Bidolibido
  • Veneno da lata
  • Garota sangue bom
  • Medley Sla 1 (A noite / Kamikases do amor / Sla Radical Dance Disco Club)
  • Deliciosamente
  • Kátia Flávia, a Godiva do Irajá
  • Dê um rolê (citação, durante a apresentação da banda)
  • Baile da pesada
  • Double love amor em dose dupla
  • Tambor
  • Rio 40 graus