‘Existe uma obrigação de felicidade tóxica’, diz a cantora e atriz Danni Carlos ao relembrar que venceu a depressão


Autora de 110 músicas, incluindo o mega sucesso ‘Coisas que eu sei’, hoje, a cantora, atriz e compositora está pleníssima dando o start prévio às comemorações dos 20 anos de carreira. Mas relembra as pressões que enfrentou nesta caminhada, que incluiu uma forte depressão tratada durante três anos: “Sempre fui sincera com o meu gosto musical, me mantive fiel, prezei pela qualidade. Também tentei lutar pelo trabalho autoral e, olhando para trás, vejo que podia ter tido mais apoio”.

Danni Carlos volta aos palcos neste sábado após dois anos (Divulgação)

Danni Carlos (Divulgação)

*Por Brunna Condini

Uma saudade que se traduz em show. É assim que Danni Carlos, cantora, atriz global e com a experiência de ter sentido na pele o que é enfrentar um reality show no Brasil – ela ficou em segundo lugar em A Fazenda – está se preparando para o start às prévias de comemorações de seus 20 anos de carreira. E avalia o caminho até aqui: “Tomei, como qualquer ser humano, decisões das quais me arrependi. Como por exemplo, sair de uma gravadora grande e assinar com uma menor. Fui com promessas de novos trabalhos e não lancei nada. O fato é que não podemos ter preconceitos com gravadoras. Quando errei, foi erro de aposta, acontece. O que sinto mesmo é que faltou apoio para o meu trabalho autoral. Daí faltou estímulo para outras coisas. Mas lancei os meus autorais e meu público adora. Ainda tenho planos com tantas músicas que desejo fazer. Não me limito”.

Aos 46 anos, Danni tem curtido a plenitude que o amadurecimento traz. Mas recorda um momento difícil que atravessou há alguns anos, quando chegou a engordar mais de 20 quilos por conta de uma depressão. “Comia pra tapar um buraco. Foi um sintoma. Me tratei durante três anos e fiquei boa. Faço terapia e nunca vou largar. Sou muito sensível e fui absorvendo as coisas. Acredito que a depressão acontece quando ficamos distantes da nossa essência. O cérebro é um órgão como outro qualquer do corpo. Temos que tratar da alma para evitar que isso aconteça. A vida não é fácil, mas não podemos nos deixar ser esmagados pelas pressões”, divide a cantora.

"Sempre fui sincera com o meu gosto musical nestes anos. Também tentei muito lutar pelo trabalho autoral, e olhando para trás, vejo que podia ter tido mais apoio nisso. Mas ainda tem tempo" (Foto: Guilherme Scarpa)

“Sempre fui sincera com o meu gosto musical nestes anos. Também tentei muito lutar pelo trabalho autoral, e olhando para trás, vejo que podia ter tido mais apoio” (Foto: Guilherme Scarpa)

“Olha, para quem estiver se sentindo assim, busque se cuidar, tem jeito. É importante não se descuidar de tratar do que é primordial, do seu querer, aquilo mais íntimo, que nos faz feliz. As exigências de aparência, de ser bem-sucedido… isso vai massacrando as pessoas. Hoje tem tratamento terapêutico no SUS para quem não pode pagar. Existe uma obrigação de felicidade tóxica. Uma alma inteira, é uma alma plena. Acho uma roubada a pessoa não abraçar o seu inteiro. Com todas as cores que temos. Essa cobrança de felicidade, às vezes, causa a depressão. Ninguém é feliz o tempo inteiro, a vida não é retilínea. É um relevo. A depressão é relevo, como na geografia. É feita de subidas e descidas. Fica perigosa quando você não ‘sobe’. Fica tempo demais ‘embaixo’. Depressão é apatia. Não é tristeza. Chorar e ficar triste é normal. A depressão tira a vontade das coisas. Temos que assumir nossos relevos de todas as formas”.

Intérprete 

Com seu álbum de estreia ‘Rock’n’road‘, em 2003, Danni já reunia milhares de fãs que admiravam seu trabalho interpretando canções compostas por outros artistas, releituras de faixas pop norte-americanas, os covers. Foram quatro edições com o tema, incluindo um disco com temas de cinema. Mas foi em 2007, com o ‘Música Nova’, que a cantora alcançou o 1° lugar nas paradas de todo o país, e foi tema de novela, com ‘Coisas que eu sei‘. Disco e música foram indicados ao Grammy Latino. Ela lembra com carinho da fase. “Pedem ‘Coisas que eu sei‘ até hoje nos shows, acho natural, adoro e canto. Ontem, um amigo meu me mandou um vídeo dele escutando no carro ‘Coisas que eu sei’, tocando na rádio. Estamos em 2022. Curto muito isso. Embalei namoros, casamentos com essa música. Ajudei a fazer muitas crianças (risos). As mulheres me contam nos shows, com os filhos prontos. Não tive filhos, mas ajudei a povoar o mundo”, diverte-se Danni, casada com o mixologista Daniel Estevan.

No show que fará no sábado, no The Rock Bar, no Jardim Botânico, às 22h, a cantora revisita grandes hits da carreira e também vai apresentar novas interpretações. “Queria fazer um show depois desse tempo de isolamento. Estou com dois discos autorais e três de versões. Pensei em como juntar um pouco de tudo e fazer algo bacana. Não estou andando para trás, estou fazendo uma homenagem ao que já vivi, ano que vem são 20 anos de carreira”, anuncia, acrescentando: “E digo que o balanço é muito satisfatório. Sempre fui sincera com o meu gosto musical, me mantive fiel, prezei pela qualidade. Também tentei lutar pelo trabalho autoral, e olhando para trás, vejo que podia ter tido mais apoio. Mas ainda tem tempo. Antes da tecnologia, precisávamos das grandes gravadoras para ter aval e chegar às pessoas. Agora conseguimos chegar. Não sou contra as grandes gravadoras, estive dentro delas durante esses 20 anos. Mas, hoje, o artista tem mais liberdade, as rédeas do que ele que contar e cantar”.

"Se a música moveu meu coração quero interpretar e passar adiante. A canção mesmo sendo sua ou não, se propaga no ar. Essa almiquia é o que me emociona, o que preciso como artista" (Foto: Guilherme Scarpa)

“Se a música moveu meu coração quero interpretar e passar adiante. A canção mesmo sendo sua ou não se propaga no ar. Essa alquimia é o que me emociona, o que preciso como artista” (Foto: Guilherme Scarpa)

Ela comenta ainda sobre o preconceito que possa existir na indústria musical com relação aos artistas que escolhem fazer mais canções covers do que autorais em algum momento de suas carreiras. “Tenho umas 110 músicas próprias, componho desde os 16 anos. As versões vieram com tudo, em atropelo, mas adoro que tudo tenha acontecido exatamente como foi. Me considero uma intérprete, tanto das minhas canções, como das outras”, analisa. “O Brasil sempre foi permeado por grandes cantoras mulheres, que chamo de ‘atrizes que cantam’, cantavam cações de outros compositores, como Elis Regina, Elza Soares, Cássia Eller. E acho bacana fazer parte disso. Se a música moveu meu coração quero interpretar e passar adiante. A canção mesmo sendo sua ou não, se propaga no ar. Essa alquimia é o que me emociona, o que preciso como artista”.

"Ainda tenho planos com tantas músicas que ainda quero fazer. Não me limito" (Foto: Guilherme Scarpa)

“Ainda tenho planos com tantas músicas que ainda quero fazer. Não me limito” (Foto: Guilherme Scarpa)

Guiada pelos oráculos e pelo autocuidado

A cantora e compositora também é taróloga, além de numeróloga e astróloga, e conta que os oráculos auxiliam nas suas escolhas há mais de 20 anos. “Jogo tarô desde os 13 anos. Astrologia estudei com a Maria Costa Ribeiro. Atendo amigos. E estou abrindo, aos poucos, para amigos de amigos. O tarô me guia. Não faço show em lua minguante, por exemplo. Digo que a lua é o ‘primeiro livro’ das bruxas. Cada lua tem sua influência. A lua cheia é a de show”.

"As pessoas estão sem tempo, o momento de uma consulta, é um momento de foco, orientações de energia, e a pessoa pode fazer escolhas melhores, amplia a visão" (Foto: Daniel Estevan)

“As pessoas estão sem tempo, o momento de uma consulta, é um momento de foco, orientações de energia, e a pessoa pode fazer escolhas melhores, amplia a visão” (Foto: Daniel Estevan)

“Acredito que a espiritualidade é dinâmica, temos o livre arbítrio. É um trabalho de autoconhecimento que ajuda a clarear a mente, para tomar decisões. As pessoas estão sem tempo, o momento de uma consulta, é um momento de foco, orientações de energia, e a pessoa pode fazer escolhas melhores, amplia a visão”.

"Existe uma obrigação de felicidade tóxica. Uma alma inteira, é uma alma plena. Acho uma roubada a pessoa não abraçar o seu inteiro" (Foto: Guilherme Scarpa)

“Existe uma obrigação de felicidade tóxica. Uma alma inteira, é uma alma plena. Acho uma roubada a pessoa não abraçar o seu inteiro” (Foto: Guilherme Scarpa)

E finaliza, sobre a maturidade: “O melhor que senti foi atravessar os 40 anos. Certa vez, Tony Bennet disse a Amy Whinehouse: ‘Se você vive tempo suficiente, a vida te ensina a viver’. Acho que a gente assenta. Falo como mulher. A sabedoria que vem com a idade. Focamos mais e ficamos mais seletivas com tudo. Queremos qualidade. Não temos mais paciência para conversa fiada. É muito bom e libertador”.