Deize Tigrona lança música em parceria com DJ Chernobyl e manda o papo: “Alguns formadores de opinião dizem que gostam do funk, mas não é verdade”


Além de cantora, Deize é gari das ruas do Rio de Janeiro há dois anos. Apesar das dificuldades, ela disse ao HT que nunca pensou em desistir da carreira. “Eu pensava em continuar gravando e seja o que Deus quiser”

Ela era faxineira, foi sucessos do funk nos anos 90, ficou afastada da música por problemas familiares, há dois anos é gari da Comlurb – empresa que presta serviços de limpeza das ruas, no Rio – e agora volta ao pancadão com “Madame”. Sejam apresentados à carreira de Deize Tigrona. Em bate-papo com o HT, ela contou que a nova música veio de “um momento de ira”. Calma leitor, a gente te explica: durante um debate do movimento “Rio Parada Funk” que ela participou no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, um rapaz da plateia disse que ela só estava ali por não estar inserida na mídia. “Ou seja, ele quis dizer que quem vai a esses encontros são MCs que não estão na televisão. E eu fiquei chateada, porque ele não perguntou se eu queria estar na mídia. Então, essa música foi uma resposta à crítica desse menino que teve a audácia de dizer isso. Essa letra, para mim, foi uma ira contra tudo o que está acontecendo no mundo e algumas pessoas bobas e bestas”.

A nova música, que trouxe Deize Tigrona de volta ao cenário do funk carioca, foi produzida pelo DJ Chernobyl e recebeu o selo “Funk na Caixa” – que apresenta o funk junto da música eletrônica. O processo de composição e produção de “Madame” demorou cerca de três meses, segundo Deize, e teve um resultado diferente ao que ela imaginou quando começou a escrever. “Eu pensei que fosse sair uma melodia reta que deixasse aparecer mais a letra. Mas eu fiquei surpresa com a produção dele, porque deu uma atualizada para o que está se ouvindo hoje em dia. Foi uma surpresa ótima. O Chernobyl me surpreendeu. Tá louco, a produção está massa”, disse a funkeira. E essa não foi a primeira vez que Deize teve uma composição produzida por DJ. A música “Bandida” também ganhou o ritmo do eletrofunk após passar pelas remixagens do produtor americano Diplo. “Esses trabalhos me incentivam a compor não só as letras com putaria, mas também as dançantes. Eu gosto de pôr a minha música com conteúdo, não gosto muito de batida com montagem. Para mim, tem que ter uma história por trás da letra” explicou.

E tem mais: ao HT, a funkeira mostrou a parte que não foi incluída na versão final de “Madame”. Segundo ela, a estrofe nem foi enviada ao DJ Chernobyl “porque a letra já tinha ficado muito grande”.

“O mundo não tem dúvida, quem controla é a tarja preta.

A cocaína é branca e o ouro é a cerveja.

O café não vale nada, tu sabe como é.

Quem manda nesse mundo são os três poderes da mulher”.

De fato, as composições de Deize trazem uma mensagem por trás do pancadão. No entanto, ela disse que ainda enxerga preconceito de determinados grupos da sociedade com o gênero. “Alguns formadores de opinião dizem que gostam do funk, mas não é verdade”, opinou. Porém, com a internet, ela acredita que seja possível divulgar o trabalho sem que precise “maquiar”, como é necessário para estar na mídia tradicional. “A internet é uma expansão da televisão, é muito mais que uma emissora”, afirmou. Embora no passado ela tenha negado mudar a letra de “Prostituto” para que pudesse fazer um programa de TV, hoje em dia ela contou que aceitaria a solicitação. “Quando um artista maquia a música, é só para divulgação. Não critico as pessoas que fazem isso e nem digo que não faria. Só que eu tive um momento de não querer fazer isso, em que eu estava triste e abalada. Eles queriam que eu mudasse ‘Prostituto’. E essa música não tem maquiagem. E na cabeça que eu estava, nossa! Eu estava surtada. Eu disse que essa eu não queria e não ia maquiar para fazer programa de TV. E não maquiei. Mas ajeitaria sim, eu acho que a informação tem que ser passada. Tem mais é que fazer, divulgar, espalhar a arte e a sua ideia”, explicou.

Além da questão de modificar as letras para estar em programas de TV, outro ponto que, atualmente, Deize Tigrona não vê problema é um funkeiro passear por outros ritmos musicais para atingir um público maior e abandonar o “MC” do nome artístico após obter fama. “Eu acho legal porque muita gente diz que MC não canta, grita. E a Anitta e Ludmilla, por exemplo, estão mostrando na prática que não é isso. As meninas estão conseguindo um espaço que é das pessoas que fazem aula de canto. Elas podem continuar atuando no funk e ficar fazendo a Kelly Key. Isso significa que o espaço está aberto, tanto para elas quanto para mim. Não estou dizendo que funkeiro tem que cantar funk até morrer, depende da pessoa”, disse.

"Elas podem continuar atuando no funk e ficar fazendo a Kelly Key", disse Deize sobre o fato de Anitta e Ludmilla apostarem em outros ritmos além do funk (Foto: I Hate Flash)

“Elas podem continuar atuando no funk e ficar fazendo a Kelly Key”, disse Deize sobre o fato de Anitta e Ludmilla apostarem em outros ritmos além do funk (Foto: I Hate Flash)

Percursora da defesa da figura feminina dentro do funk, Deize vê a mulher hoje como uma poderosa que se impõe e, muitas vezes, não tem limites. E, para muitas, a trajetória da própria artista é uma inspiração. “Eu vejo a mulher como uma guerreira. Não só eu, mas várias outras também. No meu trabalho (como funkeira), tem muitas mulheres que não aguentam e acabam ficando loucas e se matando porque não conseguiram se manter no mercado. Para muitos cristãos que me conhecem, a minha história carrega multidão. Muitas outras me veem como um espelho. Alguns me chamam de maluca, mas outros dizem que o funk não é o mesmo sem mim. Eu não vejo assim. E o funk, no caso, está ajudando muito as mulheres abrir a mente, dizer não, dizer sim”, relatou Deize Tigrona que é católica.

Apesar das dificuldades da vida, a artista disse ao HT que nunca pensou em desistir da carreira de cantora. “Eu pensava em continuar gravando e seja o que Deus quiser. Eu não consigo parar de ter ideias, de pensar em letras. Eu até montei um pequeno estúdio na minha casa para, na hora que eu quiser gravar uma voz, eu poder. Só que eu não estou naquela ambição de aparecer que eu tinha antes. Na minha opinião, não precisa de emissora de TV quando se tem internet. Se você reparar, eu não tenho um videoclipe com produção e várias curtidas como os outros têm. E, poxa, eu cheguei onde eu cheguei, conquistei a fama e o nome que eu tenho hoje em dia, lutando. Nunca tive gravadora grande, empresário e produção, maquiador a minha disposição. Nunca foi forte, sempre foi fé”, contou.

"Nunca foi forte, sempre foi fé" (Foto: I Hate Flash)

“Nunca foi forte, sempre foi fé” (Foto: I Hate Flash)

Quando perguntada qual o seu maior sonho neste momento, Deize confessou que não sabia. Segundo ela, nunca ninguém a havia questionado isso. “Meu sonho, ai moça… eu não sei não. Eu acho que quando se fala nisso, você fala em final. Eu acho que o sonho não tem limite. É tanta coisa. Sei lá”, tentou se explicar. Porém, Deize afirmou que tem desejos. Com a dupla jornada de cantora e gari, a funkeira agora acumula mais uma: mãe. “Eu estou terminando de definir o processo de adoção do meu filho, tenho que fazer uma cirurgia de redução de mama, e ainda tenho minha mãe que é alcoólatra. Minha vontade é continuar vivendo, só isso”, afirmou. E completou: “Eu espero continuar participando de debates e fazendo alguns eventos. Mas nada que eu sinta que vá me sufocar. Eu gosto de estar livre. O que eu quero hoje em dia é reconhecimento. Ser funkeira não é um hobby, é uma missão. Eu quero continuar, não tem como parar. Quero que vejam que eu estou viva” mandou o papo. E nós aqui ficamos torcendo, ?