Com As Bahias e a Cozinha Mineira, Mahmundi e Liniker, Grammy Latino mostra a força da arte ativista


O site Heloisa Tolipan conversou com xs indicados e perguntou como esse prêmio, importante chancela para suas carreiras, valida e consolida seus trabalhos que reverberam mensagens, vontades e desejos

O trio indicado ao Grammy Latino por melhor álbum se apresentou no Rock In Rio com Elza Soares (Foto: Divulgação)

*Por Rafael Moura

A música brasileira definitivamente entrou na ‘era do ativismo’, nossas canções cada vez mais falam da nossa realidade, amores, dores, afinal, representatividade importa! No backstage do Palco Sunset, no Rock In Rio, a diva Elza Soares comentou que “a maior riqueza do Brasil é o nosso povo, temos muitos talentos poderosos”. Com a divulgação da lista de indicados ao Grammy Latino 2019, que acontece no dia 14 de novembro de 2019 no MGM Grand Garden Arena, em Las Vegas, Nevada, a arte ativista mostra sua força com os nomes: As Bahias e a Cozinha Mineira (Assucena Assucena, Rafael Acerbi e Raquel Virginia), Liniker e Mahmundi, que conversaram com o site Heloisa Tolipan sobre esse reconhecimento.

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Segundo dados da ONG Transgender Europe (TGEu), o Brasil matou 868 travestis e transexuais nos últimos oito anos, o que o deixa, disparado, no topo do ranking de países com mais registros de homicídios de pessoas transgêneras. Os dados são assustadores, mas não representa novidade para essa parcela quase invisível da sociedade brasileira, que precisa resistir a uma rotina de exclusão e violência. O relatório da TGEu conta ainda que o país registra, em números absolutos, mais que o triplo de assassinatos do segundo colocado, o México, onde foram contabilizadas 256 mortes entre janeiro de 2008 e julho de 2016. Em números relativos, quando se olha o total de assassinatos de trans para cada milhão de habitantes, o Brasil fica em quarto lugar, atrás apenas de Honduras, Guiana e El Salvador.

Assucena conta que vibrou e explodiu de alegria quando saiu a lista de indicados. “Eu acho que o Grammy é uma chancela incrível. Prêmios são justos e injustos, porque muitos poderiam estar lá também, mas que bom que o trabalho de ‘As Bahias e a Cozinha Mineira’ foi escolhido para concorrer. Essa indicação sinaliza que o nosso trabalho está sendo bem feito, meticulosamente, e é um reconhecimento. Só a indicação já é importante, estou muito feliz”. O trio já esteve na lista de nomes do Prêmio Multishow de Música Brasileira, em 2016, na categoria ‘Revelação’ e, em 2018, venceu no 29º Prêmio da Música Brasileira, como grupo e álbum ‘Bixa’, ambos em Canção Popular.

O trio As Bahias e a Cozinha Mineira lançou o álbum ‘Tarântula’ em maio de 2019 e foi indicado ao Grammy Latino

“Faltam mais investimentos em políticas públicas para nos dar a condição de sobrevivência”, dispara Raquel Virgínia, logo no início da nossa conversa. Já Assucena Assucena conta que “precisamos de educação e cultura de qualidade, que abordem o quanto a humanidade é plural e esse é um dos traços mais belos da raça humana, se não o mais belo, ser diversa”. Um conceito muito presente nesse trio que conheceu no curso de história da UPS, em 2011. Rafa conta que os últimos sete dias foram um turbilhão de emoções. “O encontro com a Elza Soares, o Rock In Rio e a indicação ao Grammy são acontecimentos mais do que em especiais nas nossas carreiras”. O álbum ‘Tarântula’ foi lançado em 31 de maio.

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A capa do álbum ‘Tarântula’ do trio ‘As Bahias e a Cozinha Mineira’ indicado ao Grammy Latino 2019

O próximo destaque é natural de Araraquara. Conversamos com a vocalista da banda Liniker e os Caramelows também foi indicada ao prêmio, com o disco ‘Goela Abaixo’, em ‘Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa’. Com uma essência no soul e na black music, a artista conta que o trabalho teve dois anos de produção. “Estou muito feliz, demais! É um lugar totalmente novo, estou ainda lidando com essa notícia e muito, muito, muito feliz”, disse Liniker. Perguntamos para a estrela sobre a indicação de As Bahias e a Cozinha Mineira e Mahmundi e ela comemorou. “Elas são minhas amigas, além da indicação profissional. É pura amizade. Algo como se ligar e se abraçar para torcer e vibrar juntas. Cada uma tem sua essência em seu pronto de partida”, ressalta.

Liniker e os Caramelows foram indicados ao Grammy Latino pelo disco ‘Goela Abaixo’ (Foto: I Hate Flash/ divulgação)

Liniker tem seu nome de batismo, em homenagem ao jogador, inglês, de futebol Gary Lineker, artilheiro da Copa do Mundo de 1986. Nascida em uma família de músicos, cresceu ouvindo samba, samba-rock e soul. Apesar de seu talento ser reconhecido desde a sua infância, sua timidez, justamente por viver entre profissionais, a fez começar a se arriscar a cantar depois de iniciar a carreira teatral, na adolescência. Em 2015, formou a banda Liniker e os Caramelows, lançando o EP ‘Cru‘ em 15 de outubro daquele ano e o primeiro single foi ‘Zero’. Os vídeos com as interpretações das canções ganharam milhões de visualizações rapidamente. No ano seguinte, a banda lançou o álbum ‘Remonta’, gravado com ajuda dos fãs por meio do financiamento coletivo no Catarse. O disco reverberou internacionalmente e ganhou atenção da imprensa estrangeira. “Para nós, como artistas independentes, ter esse reconhecimento é muito valioso e nos ajuda a caminhar com mais força”, pontua.

A capa do álbum ‘Goela Abaixo’, de Liniker e os Caramelows indicado ao Grammy Latino 2019

Mahmundi era uma explosão de alegria no backstage do Palco Sunset, do Rock In Rio. A cantora nos contou que ainda está tentando entender esse processo. “Eu sou técnica de som há dez anos. E comecei a fazer produção musical, então para mim foi muito forte. Estou processando ainda. Esse disco é especial porque eu produzi com o Lux Ferreira. É uma emoção dupla, que traz um reconhecimento, por conta de toda essa energia”, comemora. O álbum ‘Para Dias Ruins‘ foi lançado em agosto de 2018 e foi indicado ao Grammy Latino 2019, pela categoria ‘Melhor Álbum de Pop Contemporâneo em Língua Portuguesa’.

Mahmundi é indicada ao Grammy Latino 2019, pelo álbum ‘Para dias ruins’ (Foto: Fernando Schlaepfer/ IHF)

Marcela Vale conhecida por Mahmundi aposta em um estilo que flerta com a música eletrônica, indie, lo-fi e a poesia reflexiva brasileira, além de influências da música oitentista. Antes da carreira solo foi vocalista, guitarrista e compositora na banda Velho Irlandês. Em parceria com Lucas de Paiva e Felipe Vellozo, surgiu o projeto Mahmundi, em janeiro de 2012, onde Marcela assumiu a voz, guitarras, sintetizadores e parte da produção. E, de forma intuitiva, também brincou com um pouco de bateria e alguns outros instrumentos. No mesmo ano saiu o EP ‘Efeito das Cores‘ e em maio de 2013, a canção ‘Vem‘, uma das faixas de seu segundo EP, ‘Setembro‘. Em 2014, Mahmundi foi vencedora do Prêmio Multishow de Música Brasileira na categoria Nova Canção (Superjúri) com o single ‘Sentimento‘. A artista fala sobre a indicação de suas amigas ao prêmio. “É muito gratificante, porque todas as histórias são próximas. São artistas incríveis, a gente convive, troca muita ideia. Está sendo muito gostoso marcar de tomar um champanhe com o dinheiro do nosso trabalho, suor e realização. A gente vive um momento atual de uma geração que veio da internet e foi se legitimando pelos fãs e esse tipo de indicação é muito importante”, ressalta.

A capa do álbum ‘Para Dias Ruins’, da cantora Mahmundi indicado do Grammy Latino 2019

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