Fashion Rio inverno 2014 day #2: das indianas posudas à dança dos cisnes na árdua rotina dos ensaios


Entre referências étnicas da Sacada, bailarinas da Oh Boy e florestas chiques da Iódice, o futebol-arte goleia a moda na Coca Cola Jeans

A moda tocou cítara no segundo dia da Fashion Rio e terminou saracoteando no tecnobrega de Gaby Amarantos. Como assim? Bom, o dia (ou melhor, a noite, já que quase todos os desfiles passaram para o horário noturno por conta da implosão da Perimetral) começou com a Sacada interpretando o estilo das vestimentas tradicionais indianas. Mas quem pensou na simplicidade de Gandhi, Neru e sua turminha paz e amor, deve entrar imediatamente em retiro espiritual e rezar um mantra, pedindo perdão pelo acinte. A diretora criativa da marca, Beti Speiski, e o stylist Daniel Ueda fizeram uma viagem mais ao norte e preferiram beber na chiquetude dos marajás, naquela gente graúda que mora em palácios no Rajastão e costuma ter de quatro a cinco Rolls-Royces na garagem. E, no último desfile do line up, a Coca Cola Jeans (ex-Coca Cola Clothing após visita ao numerólogo) trouxe o esporte tecnológico embalado pela voz de Gaby (vide nossa exclusiva entrevista com a moça na seção música).

A Sacada mais uma vez comprovou que, entre tantos arroubos criativos de outras marcas mais conceituais, consegue segurar direitinho o Fashion Rio e, sem fazar alardes, dá conta do recado. Dá gosto ver um desfile dessa marca carioca corretíssima na passarela. Para começar, ela misturou neutros, como azul índigo e cinza, com cores quentes das especiarias (laranja-açafrão, amarelo-curry e cereja) em looks com boa alfaiataria e ótimas sobreposições, misturando a rusticidade do jeans com a nobreza dos jacquards adamascados e sedas, com madras e florais rebuscados. E mais: em um momento em que o prata está na moda, mas a maioria dos estilistas, quando arrisca, prefere usá-lo só um pouquinho para ver o que acontece, mantendo a hegemonia comercial do ouro nas coleções, a marca investiu numa quantidade grande de peças prateadas, desde os tais adamascados (com arabescos indianos) até tecidos lisos mais fluidos. E, sublinhando tudo, a ótima trilha sonora de Max Blum, usando bangra music, a moderna eletrônica do país com direito a sonoridades étnico-indianas.

A Oh, Boy, a marca jovem do grupo que detém a Sacada, foi a segunda a desfilar, usando o movimento pós-punk, os balés russos e o lifestyle das bailarinas como tema, mixando a atmosfera dos palcos com a rotina das salas de ensaio. Plumas dos figurinos (tipo as cisnes Odille e Odette) foram tricotadas à mão e transformadas em peças esportivas como pulls e casacos. Ou seja, o sportswear de luxo que está na moda recebeu roupagem nova através dessa releitura dos looks teatrais, com os tricôs e blusas cropped sintetizando o despojamento das malhas e moletons usados pelas bailarinas nas salas de aula e na barra de ensaio. Tudo meio oversized, solto, como manda a atual cartilha do esporte, também permitindo que as profissionais de dança tenham liberdade de movimento na árdua preparação para o espetáculo. E, last but not the least: ficou lindo o cenário com o imenso block letter com o logo da marca, evoluindo sobre a passarela como se fosse uma bailarina avançando em um grande jeté!

A Iódice apresentou o melhor desfile deste segundo dia, com coleção enxuta, precisa e pontual, se lançando nas profundezas das florestas em cores como terracota, mostarda, bordô, vermelho e verde folha, além de preto. A linda luz, com efeito de galhos seco projetados no chão, valorizou o mix de estampas com xadrezes e prints de folhagens, árvores secas, flores escuras e penas de coruja. Very british! Destaque para os couros, devorês e chamois ecológicos e para os parkas, uns dos mais belos desta temporada. No mais, é sempre uma delícia ver Aline Weber abrindo e fechando um desfile.

Por fim, a Coca Cola Jeans brincou com o universo do esporte e do futebol, estabelecendo contrastes entras as cidades e a natureza. Da cidade, vieram os grafismos e recortes em peças modernas confeccionadas em tecidos tecnológicos como o chevron, tyvek, nylon, couro ecológico e peles falsas, tudo com efeitos matelassados. A natureza compareceu em estampas de vegetação exuberante em duas versões: preto&branco e em colorido vívido. E, em meio a um casting colossal, as presenças bacanas das atrizes Isabelle Drummond e Bruna Marquezine, além dos sonhos de consumo Marlon Teixeira e Evandro Soldati. No mais, vale também à pena mencionar a beleza criada por Max Weber, uma das mais bonitas da temporada, com cabelos para trás, meio podrinhos, com pinceladas em cores fortes nas madeixas, vindo da direção das têmporas para trás, acompanhando a evolução do colorido na edição de moda. Gratificante ver como uma marca que surgiu como estratégia de imagem de um refrigerante consegue apresentar boa moda exibida em um belo show.

Fotos: Vinícius Pereira