Zezé Motta celebra a fase garota-propaganda e agenda lotada de trabalho: “Viram que represento, né?”


São mais de 50 anos dedicados à cultura do Brasil, como atriz, cantora e militante. Zezé tem sido convidada para uma série de publicidades – “os convites não param”, diz -, ela pode ser vista linda linda e empoderada. E mais, muito mais: integra o elenco do longa ‘Alemão 2’, que dá sequência do sucesso de 2014; na segunda temporada de ‘Arcanjo Renegado’, que estreia esse ano, e também atua em ‘Fim’, que reinicia as gravações em breve, na TV Globo. Além disso, se prepara para entrar em estúdio e gravar um disco com as canções do show ‘Coração Vagabundo’, no qual canta músicas de  Caetano Veloso. E ainda revela: “Penso em me dedicar à direção”

*Por Brunna Condini

Desde que a pandemia da Covid-19 começou, há pouco mais de dois anos, Zezé Motta contabilizou ganhos e perdas. São mais de 50 anos dedicados à cultura do Brasil, como atriz, cantora e militante, e, recentemente, como mulher-propaganda. “Nunca fiz tanta publicidade. Na época de “Xica da Silva’ (1976), fiz uma grande para uma marca de cerveja. Mas, neste período até agora, já foram 35 propagandas. Viram que represento, né?”, avaliou, em entrevista exclusiva. A atriz e cantora também integrará o elenco duas séries produzidas pela TV Globo, está em cartaz no cinema em Alemão 2, prestes a filmar mais um longa, e por mais um ano interpretará Maria na ‘Paixão de Cristo’, em 15 de abril, no Paço Municipal da Prefeitura de Nova Iguaçu, em superprodução com 28 atores e 80 figurantes.

Aos 77 anos, Zezé garante estar trabalhado como nunca. “Os convites não param. E não reclamo, viu? Essas campanhas foram uma bênção, porque durante a pandemia não estava fazendo shows. Então, essa grana foi importante. Sobre o fato de estar sempre sendo lembrada, devo muito ao trabalho do Vinicius Belo. Ele realmente é um excelente produtor”. E revela: “Já fiz de tudo, mas acho que ainda falta algo, sim. Outro dia me lembrei de uma vez que dirigi uma peça e foi muito prazeroso. Achei mágico, essa experiência de construir um projeto que, de repente, você vê existindo. Penso que daqui a pouco vou parar um pouco de correr para lá e pra cá, e me dedicar mais a esse lado da direção”.

Zezé Motta estará mais um ano como Maria na 'Paixão de Cristo', em 15 de abril, no Paço Municipal da Prefeitura de Nova Iguaçu em superprodução com 28 atores e 80 figurantes (Foto: Vinicius Belo)

Zezé Motta estará mais um ano como Maria na ‘Paixão de Cristo’, em 15 de abril, no Paço Municipal da Prefeitura de Nova Iguaçu em superprodução com 28 atores e 80 figurantes (Foto: Vinicius Belo)

E lista, com orgulho da própria produção em série: acaba de estrear nas principais salas de cinema do Brasil, o longa ‘Alemão 2‘, que dá sequência do sucesso de 2014; está no elenco da segunda temporada de ‘Arcanjo Renegado‘, que estreia esse ano, e também atua em ‘Fim‘, que reinicia as gravações em breve, na TV Globo. Além disso, se prepara para entrar em estúdio no segundo semestre e gravar um disco com as canções do show ‘Coração Vagabundo‘, no qual canta músicas de  Caetano Veloso. A artista afirma que se sente plena e isso tem a ver com o investimento em autoconhecimento e autocuidado. “Tudo começou com a terapia que busquei fazer neste período. Sou uma pessoa, modéstia à parte, muito generosa. Chegava ao ponto de priorizar os outros e não a mim. Sempre me deixei para depois. Tenho trabalhado isso na análise isso”, divide.

“Era uma espécie de autossabotagem. Parecia que não merecia usufruir de todos os privilégios que tenho. Acho até que podia ser uma espécie de culpa. Tenho sido bom olhar para mim agora. Percebi que dizer ‘não’, em hipótese alguma não é um crime, faz parte da vida. Às vezes me sacrificava para dizer ‘não’, profissionalmente, pessoalmente. Pensava mais no outro. Até mesmo com os meus filhos errava muito no sentido de não dar limites. Ficava sempre querendo atender, mas para filho tem que passar real e fim de papo. E tem dado certo. As relações que já eram boas, melhoraram”.

"Tenho achado bom olhar pra mim agora. Percebi que dizer 'não', não é um crime, faz parte da vida" (Foto: Vinicius Belo)

“Tenho achado bom olhar pra mim agora. Percebi que dizer ‘não’, não é um crime, faz parte da vida” (Foto: Vinicius Belo)

Ela conta ainda que voltou a se exercitar: “Agora estou com personal trainer, faço massagem, limpeza de pele, e sempre fui adepta dos cremes, do dedão do pé ao último fio de cabelo (risos). Agora me cuido por dentro e por fora como mereço. Sou filha de Oxum, muito vaidosa. E sou muito romântica também. Tenho que estar bem para mim, e também para algum senhor idoso, viúvo (risos). Quando era jovem, sempre tive namorados mais jovens. Mas hoje em dia não encaro mais. Que dizer, não sei (risos)”, diverte-se Zezé, que já foi casada cinco vezes.

Aliás, quando o assunto é a vida amorosa, a atriz é direta. “Estou há anos sozinha. Confesso que sou movida à paixão, mas não tenho mais aquela ansiedade que tinha quando era jovem. Estou sozinha, mas tranquila, se tiver que acontecer, vai ser bom. Já amei muito e fui muito amada”. E avisa: “Casar nem pensar. Já sei como é. Agora tem que ser cada um na sua casa”.

Cabeça erguida e força na militância

Recentemente, Zezé publicou em seu Instagram um texto sobre a população do país e sua luta de muitos anos para combater o racismo estrutural. “Nós somos a maioria. O Brasil é negro. Somos mais de 56% da população. A maioria da população brasileira é negra e feminina. Deixe que te chamem de prepotente, mas não deixe de ter a sua cabeça erguida, eu disse erguida, bem erguida…. Eu aprendi a andar de cabeça erguida no final dos anos 60, quando fui aos Estados Unidos pela primeira vez. Lá eu percebi que os negros andavam de cabeça erguida, e comecei a me perguntar: ‘Por que no Brasil a gente anda tão encolhido? Por que a gente se sente tão inferior?’. Começaram esses questionamentos todos na minha cabeça. Hoje entendo perfeitamente sobre isso, por isso te digo, cabeça erguida! “, desabafa a atriz, tendo postado o texto horas depois de publicar um vídeo sobre uma matéria, que divulgou imagens de uma mulher branca agredindo uma mulher negra na portaria de um prédio, na Zona Sul de São Paulo.

Sobre o tema, ela também fala ao site: “É cansativo bater na mesma tecla, mas se não insistirmos no assunto, baterá a frustração de não ter tentado. Pode virar um assunto que nunca se resolverá. E em uma país tão miscigenado, isso não dá”.
"É cansativo bater na mesma tecla, mas se não insistirmos no assunto do combate ao racismo, baterá a frustração de não ter tentado" (Foto: Reprodução Instagram)

“É cansativo bater na mesma tecla, mas se não insistirmos no assunto do combate ao racismo, baterá a frustração de não ter tentado” (Foto: Reprodução Instagram)

Militante do Movimento Negro Unificado (MNU), ela também foi uma das criadoras do Centro de Informação e Documentação do Artista Negro. “Quando cobrávamos a quase invisibilidade do negro na mídia alegavam que não sabiam onde encontrar os atores negros. Então, organizamos o CIDAN que, posteriormente, se tornou uma página na internet. Ficamos sem patrocínio e ela não continuou, mas foi útil para os produtores. O Lázaro Ramos, por exemplo, foi visto na peça ‘Ó Paí, Ó’, por um diretor que ficou impressionado com a atuação dele, e que anos depois foi convidado para dirigir o filme ‘Madame Satã’, lembrando do Lázaro.

Ele o encontrou através do nosso cadastro. Comparando ao início da minha carreira e ao meu engajamento nessa luta houve uma abertura. Temos Taís Araújo, Lázaro, e outros artistas. E eu mesma tenho feito atuações com destaque. Mas ainda falta”.

Perdas e ganhos

Há dois anos, Zezé Motta perdeu a mãe, Maria Elazir, para uma pneumonia, e também um sobrinho durante uma cirurgia no coração, e um primo próximo vítima de Covid-19. “Foi um dos períodos mais difíceis da minha vida. A fé me ajudou muito. Faço oração da hora que acordo até dormir. Como aqui não é o paraíso, estamos sujeitos a uma série de embates na vida, e surpresas dolorosas por vezes. A fé me fez ter a humildade de entender que eu não era a única perdendo pessoas, tendo perdas”, lembra.

“Outro dia estava pensando na minha historia e cheguei à conclusão que tudo valeu a pena. Sou realizada e tenho trabalhado sempre, tudo que amo e me move. Toda semente que plantei, estou colhendo frutos na minha idade. São mais de cinco décadas de carreira. Tenho meus filhos, um menino, e três meninas, filhos de coração, são presentes, cuidam muito de mim. O que desejo hoje é saúde. Cuido muito bem dela, na medida do possível. Meu sonho é envelhecer com dignidade. Mantendo os amigos duradouros e os filhos por perto. E ainda tenho a expectativa de ter um encontro afetivo, não gostaria de envelhecer sozinha”.

"Meu sonho é envelhecer com dignidade. Mantendo os amigos duradouros. E os filhos por perto. E ainda tenho a expectativa de ter um encontro afetivo, não gostaria de envelhecer sozinha" (Foto: Stéph Munnier)

“Meu sonho é envelhecer com dignidade. Mantendo os amigos duradouros. E os filhos por perto. E ainda tenho a expectativa de ter um encontro afetivo, não gostaria de envelhecer sozinha” (Foto: Stéph Munnier)