Ex-vendedora de frangos em feira, Naira Lili, que debutou na última SPFW, vai modelar em Londres: “Quero dar uma vida de princesa para minha mãe”


Com o sonho de ser uma angel da Victoria Secret’s, Naira já emagreceu 9 kg desde que começou a se dedicar à carreira. Agora, sua agenda é extensa, com entrevistas, drenagem, dentista, aulas de inglês, dermatologista, nutricionista e até personal trainer

A história da capixaba Naira Lili, de 19 anos, pode facilmente ser dividida entre pré e pós São Paulo Fashion Week. É que depois de cruzar a passarela de Lenny Niemeyer, a rainha do beachwear brasileiro, na última edição da semana de moda paulista, ocorrida em abril, sua vida mudou. Antes, Naira acordava às 4h30 e trabalha em uma feira de rua da periferia de Serra, município vizinho a capital do Espírito Santo, Vitória. Ao lado de sua mãe, Tiana, vendia asas e peitos de frango até por volta de 13h. “Domingo à tarde era o único momento que a gente tinha livre. Porque, além da feira, de segunda a sábado, a gente ainda cuida de crianças. Os pais começam as deixá-las por volta de 5h lá em casa. E tem criança que fica até 22h30”, conta em entrevista exclusiva ao HT. Ela está falando no passado, porque esse mês de junho será o último dela e de Dona Tiana na feira. O motivo? A jovem está de passagem comprada para Londres, a capital da Inglaterra, onde, a priori, passará dois meses trabalhando como modelo – tempo maior vai depender do comportamento do mercado.

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(Fotos: @jeffsegenreich)

“Estou muito feliz e ao mesmo tempo ansiosa. Tenho um pouco de medo porque nunca morei fora da casa que estou hoje. Quando eu falo que vou viajar como modelo algumas pessoas dizem: ‘Cuidado ein!’. Mas estou indo com muita fé e muita garra. Espero encontrar muito trabalho lá fora e quero conhecer tudo”, diz ela, que ainda reside em Serra (com um irmão mais novo e a avó materna) e deve embarcar para a Europa na primeira semana de agosto. Enquanto isso, está estudando inglês há alguns dias e cumprindo uma agenda de entrevistas como essa, além de academia, nutricionista (ela emagreceu 9 kg desde que começou a preparação) , dentista, aula de dança, drenagem e dermatologista. De olho em todas essas mudanças também está Dona Tiana, a mãe, “com um pouco de medo”, já que as duas nunca ficaram separadas. A distância, Naira garante, vai ajudar a realizar seu grande sonho: “Quero tirar minha mãe da feira, fazer com que ela pare de trabalhar, e poder dar tudo para ela. Uma vida de princesa. Quero também pagar uma boa faculdade para o meu irmão”.

Dona Tiana, no entanto, ainda não vai abandonar o bico de criação de crianças. Mas para Naira, só de conseguir tirar a mãe da feira já é um alívio. “É o mais desgastante”, explica ela. Tudo paulatinamente, assim como a entrada de Naira no mundo fashion. Foi em um dia tradicional de feira em Serra que ela foi abordada por um olheiro que a entregou um cartão. Anderson Bonella, seu agente, conta que, a priori, ela recusou qualquer convite ou proposta. A própria Naira lembra: “Eu reneguei no começo, porque eu não me achava bonita. Eu achava que para você ser modelo você tinha que ser perfeita. Que se não fosse assim, não servia. Eu contei para minha mãe o que tinha acontecido e ela falou: ‘Minha filha, você tem alguma coisa a perder? Então vamos ver, vamos conversar. Não custa nada’. Aí a gente viu que era sério eu comecei a aprender a fotografar, a desfilar”. Foi quando, num desfile abarrotado de influências japonistas, Naira deu seu primeiro pivô na maior semana de moda da América Latina (HT estava lá e até contou um pouco de sua história).

NAIRA LILI

De lá para cá, já foi um ensaio na Argentina para a “Vogue” brasileira, duas campanhas para uma marca tupiniquim de perfumes, uma de sapatos, outra de moda praia e um plus que a gente descobriu em primeira mão: será anunciado, nos próximos dias, um “super contrato” de Naira com uma marca que pretende guardar tudo em segredo para aproveitar ao máximo a divulgação da parceria. Em meio à isso, ela ganhou a mídia como a “feirante que virou modelo”. “No início foi um pouco estranho. Eu não tenho vergonha da minha história, mas é esquisito as pessoas começarem a te parar, parabenizar, a falar do preconceito, que achavam muito bom aquilo que estava acontecendo. Comecei a servir de exemplo para muita gente. Uma porção de meninas vieram falar comigo no Instagram, que se sentem muito felizes por mim, que se inspiram, que vendo minha história, percebem que a delas pode dar certo”, conta ela, que não sentiu tanto o preconceito social nesses últimos meses. “É porque eu nunca fui de freqüentar lugares onde atualmente vou”, justifica. Por outro lado, sua cor negra já a fez sofrer. “Eu sofri muito, em todos os lugares”, começa.

“De todas as vezes, a pior foi quando cheguei em um consultório médico com minha mãe e a médica disse que não iria atender porque, segundo ela, minha mãe não era minha mãe (dona Tiana é causasiana). Tivemos que voltar para casa, buscar um documento que comprovasse minha filiação, para que ela, enfim, me atendesse”, lembra. Episódios enfrentados, Naira agora só pensa com positivismo para seu futuro. Enquanto sonha em ser uma angel da Victoria’s Secret (posto já ocupado por Alessandra Ambrósio, Gisele Bündchen e Laís Ribeiro), a promissora modelo cai no sonho com a nossa pergunta: “Quando a gente voltar a se falar, daqui a seis meses, o que você estará me contando para uma reportagem, se tudo der certo?”. Ela não titubeia: “Eu vou te contar que consegui tirar minha mãe de lá onde a gente mora atualmente, que hoje eu já sou considerada uma grande modelo, que ainda tenho muito para trabalhar e muito para fazer, que eu já me sinto 100% segura da minha profissão”. O telefone quase estava indo para o gancho quando Naira volta e completa: “Ah, e muito feliz”. Assim seja.