Bom Velhinho S.A: enquanto no Natal não chega, agente de Papai Noéis fatura alto com imaginário natalino


A Christmas carol! Um verdadeiro time de profissionais cuida dos agitos natalinos nos shoppings com o mesmo afinco que duendes embalam presentinhos!

Há quem diga que o Natal só chega mesmo no finzinho de dezembro, mas, quem trabalha às suas custas – pondo a mão na massa, ou melhor, em bengalinhas listradas, pinheiros mágicos, trenós puxados por renas, fadinhas açucaradas e soldadinhos de chumbos -, já está em plena atividade há pelo menos um mês. Ou bem antes disso. Afinal, assim como aquele exército de duendes que dá duro o ano inteiro, sob as ordens de Papai Noel, para garantir que a virada de 24 para 25 de dezembro seja impecável, existe um verdadeiro time de profissionais que se prepara o ano inteiro e que, pelo menos desde novembro, já pôs o bloco na rua, muito antes de os consumidores começarem a pensar de fato no animado vovô e sua trupe.

Por exemplo, Limachem Cherem é um agente de Papais Noéis. Como assim? Bom, ele começa a cair em cima dessa rosquinha glaceada já no meio do ano, quando começa a arregimentar o grupo de profissionais que vão esquentar os troninhos vermelhos nos shoppings Brasil afora.  Ele é uma espécie de empresário de elenco, só que, ao invés de atores e modelos, cuida de uma espécie de casting daqueles velhinhos barrigudos que serão encontrados nos shoppings centers, agitando o Natal e cuidando para que a imaginação dos pimpolhos possa se reverter em alguns milhões de faturamento nas lojas. Xerém já entrega o ouro ao bandido, ou melhor, o produto embalado ao cliente. Ou seja: o Papai Noel contratado muitas vezes já vem com o figurino, incluindo a barba branca, que pode ser natural ou não. Ele explica: “existem clientes que só querem saber de Papai Noel com barba de verdade porque ficam com medo que as crianças puxem e saia tudo do lugar. Outros são mais tranquilos e não estão preocupados com isso”. Ele ainda brinca, afirmando que, quase sempre, as barrigas proeminentes são fakes também, até porque prefere escalar senhores que se cuidem bem e que, por isso, nem são chegados a uma protuberância abdominal. “Evito a rapaziada que exagera demais no chope’, comenta. “Já pensou se a criançada senta no colo de um velhinho com bafo?”

Tudo começou há 20 anos, quando o empresário fundou a Escola de Papai Noel do Brasil, uma entidade que se propõe a formar profissionais nesse campo. Diretor de teatro, ele pega pesado no pé dos aspirantes à profissão. São ministradas aulas de interpretação, canto, postura corporal e tudo aquilo que se espera de um bom velhinho. Já são 500 deles formados em todos esses anos de estrada. Alguns estão por aí, espalhados pelo mundo, atauando no sul do Brasil e em Minas. Outros são agenciados por Cherem, sobretudo no Estado do Rio. “Quando chega abril e maio, os clientes já começam a sondar e ver quem está disponível. Faço uma triagem de acordo com o perfil de cada empresa e, aí, já compareço ao casting com uns cinco ou seis candidatos, já direcionados”, confessa.

Fotos: Hélio Araújo

Cherem desconversa sobre os custos, afirmando que tudo depende do período em que aquele agenciado será contratado. “Negocio cada detalhe”, despista com a mesma malandragem com que o Rei dos Ratos, no enredo do balé Quebra-Nozes, leva no bico a menina Clara e a bondosa Rainha da Neve.

Outro que se diverte nessa época é o coreógrafo André Vagon, da Scena Ludica, contratado para montar mini espetáculos de Natal que vão daqueles tradicionais musicais novaiorquinos que costumam ser apresentados no Radio City Music Hall, em Manhattan, até versões populares do balé Quebra-Nozes. “O público dos malls e eventos corporativos quer a magia do Natal americano ou europeu, mas não dá para exagerar em repertórios de balé clássico ou espetáculos muito longos porque esse tipo de público não está em um teatro, no escurinho da caixa preta. Tudo precisa ser pocket. Os shoppings são lugares dinâmicos e cheios de vida, tudo acontece ao redor de um show e, por isso, é preciso ter noção de timing, caprichando muito nos movimentos de cena, música e figurinos, fazendo tudo bem agitado”, esclarece Vagon.  E completa: “Já viajei com meu sócio várias vezes para passar Natal em Londres, Paris e Nova Iorque para poder assistir esses musicais de perto e me inspirar”.

Ele, que já foi primeiro-bailarino de companhia artística e dançou, durante anos, na TV Globo e em eventos corporativos, shows e musicais, ainda se diverte nesse tipo de ação, interpretando personagens de acordo com seu biotipo, como Burgo-Mestres, prefeitos de cidades encantadas, arautos e duendes.

Fotos: Nan Giard e divulgação

Há três semanas, Vagon deu início ao movimento natalino no Rio Design Barra, em uma data que o povo de marketing chama de “chegada do Papai Noel”. É quando a decoração de natal é lançada, junto com a campanha publicitária e o circo, ou melhor, a árvore é armada. Literalmente. É aquele momento em que o público descobre que o shopping se preparou para o maior evento de varejo do ano e acaba se entregando à magia. Momento perfeito para alavancar as vendas. “O London Christmas é o maior Natal que já fizemos no Rio Design Barra e, para todo o período, esperamos um crescimento de 15% nas vendas e de 20% no fluxo”, afirma a gerente de marketing do Rio Design Barra, Cecília Figueiredo. Neste ano, o tema escolhido foi um evento inglês e até os soldadinhos de chumbo viraram guardas da Rainha da Inglaterra, com presença de uma sósia de Elizabeth II – entre duendes, burgo-mestres, Quebra-Nozes, noeletes e outros personagens saídos de balés de Tchaikovsky e de contos de Charles Dickens. “O conjunto ficou um must”, comenta Cecília, com os olhinhos brilhando.  “Além disso, caprichamos na cenografia, uma fortuna, projeto executado por Cecília Dale com direito à roda gigante de verdade”, completa. A executiva do shopping se refere a uma roda gigante montada no imponente cenário inglês, fazendo alusão à famosa London Eye.

Fotos: divulgação

Quando fala do Natal deste ano, Cecília Figueiredo se refere à sua xará, Cecília Dale, conhecidíssima decoradora natalina que é contratada, a peso de ouro, para conceber a decoração dos shoppings nesta época do ano. Foi dela, por exemplo, o projeto que encantou os clientes do Shopping Leblon ano passado, com guaritas espalhadas, entre os corredores, e o maxi pinheiro, todos exibindo ursinhos Teddy Bear, Quebra Nozes e outras figurinhas mágicas, com movimentos animatronics em seu interior. Luxo perde. Dessa vez, a profissional se superou no Rio Design: criou uma cidadezinha londrina que parece saída de um livro de Dickens, com pub, cafés, delicatessens, teatrinho do East End londrino com soldadinhos de chumbo animados e a tal roda gigante. Surpreendente, mas digno de se esperar, já que, no passado, o mesmo cliente pediu um carrossel de parquinho antigo. Pura magia.

Cecília, inclusive, acaba de inaugurar também no Rio, no Fashion Mall, uma pop up store onde vende suas criações para os endinheirados dispostos a abrir a carteira para tornar seus festejos de final de ano mais deslumbrantes. Muito mais deslumbrantes, aliás. “Hoje em dia, já não cabem mais aquelas soluções caseiras, tipo montar cone de cartolina, colar macarrão fusilli e pintar o conjunto com spray dourado”, se diverte o coreógrafo Vagon, lembrando de alguns natais que viveu quando era criança, no Sul do Brasil, em vilarejos povoados por descendentes de colonos europeus. Dale faz coro com ele e ressalta o caráter de super produção do Natal também na casa das pessoas. Por isso mesmo, profissionais como ela se dedicam a abrir lojas, nos moldes daquelas que costumam pipocar nos Estados Unidos, onde os consumidores podem vestir a casa toda para o evento. Com 9 lojas em são paulo e 1 em Curitiba, é a sua primeira em solo carioca. “Não é uma loja de decoração, móveis e objetos e ao mesmo tempo é um pouco de tudo isso”, comenta, feliz ainda por ter criado também a própria decoração do shopping, com um trenzinho  para entreter a gurizada. “Não só as crianças, mas os pais também. O bacana do Natal é que, neste período, todo mundo é pequeno”, completa.

Fotos: Miguel Sá

A superintendente do Fashion Mall, Jini Nogueira, é enfática ao concordar com Dale, quando esta fala sobre o período natalino aflorar a criança que existe em todas as idades: “Operações como o trenzinho proporcionam mais interatividade com o cliente do mall, e fazem muito sucesso”. Ela alega que tudo que tem movimento desperta o lado lúdico da clientela, independente da idade, e completa: “O trenzinho tem feito muito sucesso e aumentou significamente o fluxo. Para este ano, a nossa expectativa de crescimento está em torno de 10%. ”

A gestora ainda ressalta que o caráter fantasioso do projeto de decoração não pode ser nivelado pela média,  precisando ser fantástico: “Neste ano, uma enorme árvore com 10 metros de altura e 17 mil lâmpadas compõe o conjunto junto com o trenzinho, com capacidade para circular com até oito crianças por viagem. Além disso, temos uma Town House, ao lado da qual fica o Papai Noel sentado em sua poltrona, completada por baú de cartas, caixas de presentes, gnomos, bonecas de porcelana, pequenos soldados, carrinhos, entre outros componentes da decoração. E, do outro lado da casa, está o ateliê da Mamãe Noel”. Uau, clima de super produção é pouco para definir.

 

Fotos: Divulgação

Sobre o Papai Noel que dá expediente no shopping, ela endossa os critérios que Cherem alega ser vitais para esta vocação: “todo ano, o profissional é contratado de uma empresa e, para isso, é necessário, como pré-requisitos, que ele tenha brilho nos olhos ao ver as crianças, que saiba conversar com elas. Não basta apenas o physique du rôle para o papel, é preciso ir além e incorporar cenicamente o arquétipo”. É, produção cinematográfica perde. E quem disse que não são os encantos de um Natal de cinema que impulsionam as vendas?