Em nada ele se parece com um desses agentes top secrets que circulam por aí à espreita de uma nova carinha bonita para enfeitiçar o circuito fashion. Ainda que longe dos estereótipos corriqueiros, o gaúcho Dilson Stein é dono de um sorriso fácil e de uma conversa para lá de encantadora – detalhes infalíveis para convencer a maioria das famílias de meninas entre 11 e 15 anos a apostarem numa tentadora carreira profissional de modelo. Foi assim, com esse jogo de cintura nato, que ele assegurou o ingresso de Gisele Bündchen às passarelas. Na época, a garota desajeita do interior do Rio Grande do Sul, estava atrás apenas de aulas de postura. Mas bastou que Dil – como é chamado – colocasse os olhos nela, para o script mudar completamente.
O passo seguinte foi falar com os pais e persuadi-los a deixá-la embarcar para São Paulo. Deu certo, e Gisele aterrissou no concreto paulistano ao lado da mãe e de duas irmãs com o objetivo de fazer um curso e passear pela cidade. A sonhada excursão ao parque de diversões jamais aconteceu; Gisele acabou no prédio da Elite (consagrada agência de modelos), de onde saiu com um contrato assinado.
O fato de ela ter apenas 14 anos em nada impediu sua ascensão meteórica. Foi aterrissar em Nova York para que os desfiles e as campanhas pipocassem. Perto de completar duas décadas de carreira, a musa brasileira ainda figura entre o seleto time de poderosas, com trabalhos cada vez mais exclusivos e milionários. É bom frisar que La Bündchen se casou e teve dois filhos – o que não apagou o seu brilho natural.
Hoje, a relação de Dilson com a família Bündchen vai além do usual scouter-top model e já se transformou em parceria profissional. Valdir Bünchen, sociólogo e pai da maior modelo do mundo, faz parte da equipe do Projeto Modelo, que atualmente circula por cidades à procura de talentos de todas as idades para a moda, teatro e TV.
Se apenas essa descoberta já teria endossado a expertise de Stein no mercado, imagina enumerar as outras belas que compõem o seu portfólio? Alessandra Ambrósio, Carol Trentini e Thairine Garcia, por exemplo, foram algumas das apostas do scouter. “Mesmo morando em Horizontina (RS), tenho um batalhão de profissionais espalhados por regiões inusitadas do país. Já encontramos potenciais modelos até na roça. A internet facilita muito o nosso ramo de atuação”, diz.
O talento reconhecido não faz com que ele baixe a guarda. “A abordagem precisa ser cautelosa, jamais falo diretamente com a moça; é essencial procurar os seus responsáveis e apresentar com seriedade aquilo que fazemos. Como boa parte dessas candidatas ao estrelato ainda é pré-adolescente, reforçamos a necessidade de continuarem com os estudos. Há casos que não dão certo… A própria Gisele acabou largando a escola”.
Sexo, drogas e anorexia
A maior dificuldade ao trazer essas meninas para os centros urbanos é afastá-las das armadilhas que rodeiam o meio. “As drogas estão por todos os lados, portanto, é importante que esse tema seja discutido, especialmente dentro de casa, com o intuito de evitar problemas futuros”, alerta Stein.
Não é raro também a gravidez precoce, o que pode significar o fim de algumas promissoras trajetórias. Entretanto, é a anorexia o tema que mais perturba quem vive da moda. “Essas gurias estão com o corpo em fase de formação, então, é compreensível que ganhem curvas e isso, impulsionado pela ditadura da magreza, pode surtir efeitos devastadores. Mas não dá para viver de alface, né? Hoje as agências contam com especialistas que garantem apoio psicológico, o que certamente minimiza os impactos da doença.”
Por causa da pouca idade das modeletes e do constante zunzunzum sobre a legislação trabalhista – que impede menores de exercerem funções remuneradas (e jornadas extensas) – há algumas temporadas, a fiscalização endureceu. Nessa edição do SPFW, a ausência mais sentida é a de Thairine Garcia, impedida de desfilar graças aos 15 anos escancarados no RG. “É um contrassenso, já que ela participa do line-up internacional e das principais campanhas do segmento, além de estampar diversas capas de revistas por aqui e no exterior. Acho que isso faz o Brasil perder visibilidade e também tira dela [Thairine] a oportunidade de se aperfeiçoar ainda mais. É fundamental expor que a top está agora no auge e estamos perdendo a chance de desfrutar desse momento.” Tópico que merece cada vez mais atenção, tanto pelo viés sociológico do trabalho infantil – vale trazer à tona a questão dos atletas mirins – como da eminente condição transformadora que os holofotes podem assegurar. “Enfim, o show tem que continuar”, encerra Dil Stein.
* Por Patrícia Favalle
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