Salve, Jorge! Celebs e a homenagem ao santo guerreiro, no Rio, e em tempos de pandemia


Em meio ao isolamento social, como fica a homenagem a São Jorge, para os católicos, e Ogum, no candomblé e na umbanda? Artistas devotos do santo guerreiro, como a cantora Fernanda Abreu, o ator Nando Cunha, o coreógrafo Carlinhos de Jesus, o estilista Beto Neves e o diretor Jorge Farjalla, contam o que farão neste 23 de abril

*Por Simone Gondim

Todo ano, em 23 de abril é feriado no Rio de Janeiro e palco de homenagens a São Jorge, para os católicos, e Ogum, no candomblé e na umbanda. A festa começa cedo: a partir das 5h tem a tradicional alvorada, com queima de fogos, toque de clarinete e badalar dos sinos, seguida de missa. A Igreja Matriz de São Jorge, no bairro de Quintino, e a Igreja de São Gonçalo Garcia e São Jorge, no Centro, ficam lotadas de fiéis, que estão lá para agradecer, pedir a ajuda do santo guerreiro ou apenas receber sua bênção.

Mas, em tempos de isolamento social, a fim de conter a pandemia provocada pelo coronavírus, a comemoração vai ser diferente. As igrejas estarão fechadas, transmitindo a alvorada e as missas por meio de links em suas respectivas páginas no Facebook – a recomendação é que a população fique em casa e evite aglomerações. Entre as celebridades devotas de Jorge, também houve mudança de planos: a cantora Fernanda Abreu, por exemplo, vai fazer uma live no pequeno estúdio que tem em casa, enquanto o ator Nando Cunha cancelou a feijoada que promove nessa data, mas vai distribuir a moradores de rua quentinhas com a iguaria.

Fernanda Abreu fará uma live em homenagem a São Jorge (Foto: Murilo Alvesso)

Embora não se defina como religiosa, a cantora Fernanda Abreu conta que é uma pessoa de fé e sempre se identificou com a figura de São Jorge, especialmente depois de ter ido a um centro e ouvido que ele era seu protetor. A partir daí, foram várias coincidências envolvendo o santo guerreiro, que levaram a artista a estreitar essa relação. “Tinha há muito tempo um São Jorge grandão, lindo, que coube exatamente em um nicho que já existia no jardim da casa onde moro desde 1995. Ele fica ali na mata, cuidando do imóvel e da gente. Passei a ter essa devoção, a celebrar todos os anos e pedir proteção”, lembra ela. “Uma das músicas que eu mais gostava era a reza que o Jorge Ben Jor musicou, ‘Jorge da Capadócia’. Quando lancei meu primeiro disco, era bem dançante, mas sempre me falavam que eu tinha que fazer uma regravação de MPB. Quis regravar ‘Jorge da Capadócia’, fiz o arranjo e consegui a aprovação do Ben Jor, que adorou”, acrescenta.

Conforme viajava pelo Brasil, Fernanda foi comprando imagens de São Jorge que achava bonitas. “Tenho um altar com um monte de imagens legais. Acabei ficando apegada e sempre recorro a São Jorge”, revela. “Quando ficou determinado o isolamento social e a quarentena, a primeira coisa que eu pensei foi: ‘como iria celebrar o Dia de São Jorge?’. Normalmente, acendo uma vela perto da imagem do meu jardim e vou à igreja do Centro. Esse ano, não vai dar para ir lá. Acho muito importante que as pessoas permaneçam em casa”, diz. Para homenagear o santo guerreiro, a artista vai transmitir em seu canal no YouTube, às 19h, uma live feita em seu estúdio caseiro, ao lado do marido, o baterista Tuto Ferraz. “Vou começar cantando ‘Jorge da Capadócia’. No fim, vou mostrar uma música inédita, que fiz em homenagem ao Ben Jor, chamada ‘Do bem’. Resolvi chamar a live de Live do Bem, para ter vários sentidos, ainda mais no momento em que estamos vivendo, no qual precisamos de muita solidariedade”, adianta ela.

Nando Cunha vai distribuir feijoada para moradores de rua (Foto: Reprodução Instagram)

No caso do ator Nando Cunha, a ligação com o santo guerreiro vem de família. O avô materno era devoto, se chamava Jorge e nasceu em 23 de abril. “Minha mãe tinha essa devoção por conta dele. Ela me levava à igreja do Centro. Depois, passei a ir na de Quintino. Havia feito teste para a peça ‘Grande Otelo’ e levei minha carteira de trabalho e um crucifixo para benzer. Saí da Igreja de São Jorge lotada e encontrei com a produtora da peça, que disse que meu teste havia sido ótimo. Entrei para o elenco do espetáculo e tive a ideia de fazer uma feijoada para agradecer”, recorda.

A feijoada começou em 2003, reunindo 30 pessoas no play de uma amiga de Nando. Com o passar dos anos, o evento cresceu. Em 2019, foram dois mil convidados no Club Municipal, na Tijuca, pedindo em troca donativos para quem estava em situação de rua. “Minha relação com São Jorge é de brother. Acendo vela, boto cerveja para ele e converso”, conta. “As minhas conquistas, como o trabalho na novela ‘Salve Jorge’ e meu apartamento, devo muito a ele. Sei que está sempre ao meu lado”, reconhece. Este ano, para evitar aglomeração, o ator não fará a feijoada aberta ao público, mas isso não significa que deixará de ser solidário. “Farei minha parte, preparando em casa o feijão que der. Vou colocar em quentinhas e distribuir na rua para quem precisa”, resume.

O diretor Jorge Farjalla (de óculos escuros) em momento de oração perto da Igreja de São Gonçalo Garcia e São Jorge, no Centro (Foto: Arquivo pessoal)

Praticamente todo ano, o diretor Jorge Farjalla vai à missa na Igreja de São Gonçalo Garcia e São Jorge, no Centro, em 23 de abril. A ligação com o santo guerreiro vem desde a infância, quando era responsável por trocar a lâmpada do oratório de São Jorge instalado na fábrica do avô, na cidade de Catalão, no interior de Goiás. “Aprendi a oração do santo com 11 anos de idade e rezo todos os dias. Ela é muito poderosa”, garante.

Farjalla frisa que o mundo todo vive um momento muto sério por causa da pandemia e as pessoas precisam se resguardar. “São Jorge aparece no catolicismo, na umbanda e no candomblé, é meio ecumênico. É o guerreiro, o santo de proteção da casa e de nós mesmos. Vou acender uma vela em casa e devo levar minhas rosas vermelhas para jogar ao mar”, explica.

“Minha fé transcende a venda de camisetas”, diz Beto Neves (Foto: Reprodução Instagram)

O coreógrafo Carlinhos de Jesus vai passar o Dia de São Jorge sentindo na pele os efeitos do coronavírus. Ele e a mulher testaram positivo para Covid-19 e estão sob cuidados médicos domiciliares, com a temperatura e os níveis de oxigênio sendo monitorados o tempo todo. “É muito ruim, mas vamos superar”, pondera. “Tenho um altar com todas as imagens de São Jorge que você possa imaginar, incluindo uma esculpida em palito de fósforo. Normalmente, em 23 de abril eu iria à missa em Quintino ou no Centro, mas vou ficar em casa e fazer uma oração diante do meu altarzinho, pedindo ao santo guerreiro que cuide de todos nós”, diz.

Ficar em casa também é a opção do estilista Beto Neves, da Complexo B, que tem São Jorge como ícone da marca, e do ator Jorge Caetano. Assim como outros fiéis, eles farão o possível para reverenciar o santo, mas sem arriscar a saúde. “São Jorge tem a característica de promover a reunião das pessoas, a feijoada é um símbolo disso. Como eu moro sozinho e não sei preparar esse prato, provavelmente ficarei só na oração. Minha fé transcende a venda de camisetas”, fala Beto Neves.

“Vou acender uma vela para o meu santo, diante de um quadro que o retrata e foi trazido de uma viagem a Cusco, no Peru. Também cantarei a oração dele, ouvindo ‘Jorge da Capadócia’ nas vozes de Jorge Ben Jor e Fernanda Abreu”, descreve Caetano. “São Jorge simboliza o combate e a força. É o que precisamos para lutar contra a Covid-19”, conclui.

O quadro que o ator Jorge Caetano trouxe do Peru mostra o santo guerreiro (Foto: Arquivo pessoal)