#SaiaDaCaixa de Helen Pomposelli apresenta a arquiteta francesa Laura Beringuer que faz projetos em comunidades brasileiras por preços acessíveis


“Eu penso a arquitetura como um roteiro. As pessoas devem passar por lá e acontecer coisas, como uma história. Numa casa, o mais importante é que seja saudável e confortável, bem ventilada, boa iluminação, que faz parte da saúde da casa”, disse a arquiteta em entrevista à colunista Helen Pomposelli

* Por Helen Pomposelli

Laura Beringuer por Miguel Moraes

 Muitas escolhas profissionais e de estilo de vida não estão mais ligadas ao fato de ganhar dinheiro e de ter projeção social, mas de ir além, de ajudar a transformar o mundo. Isso mostra Laura Beringuer, arquiteta de 31 anos, francesa, casada com um brasileiro do Morro da Babilônia, que se formou na França, em Paris, na Escola Nacional Superior de arquitetura Paris Belleville, e que valoriza o papel social da sua profissão ao oferecer projetos acessíveis às pessoas de baixa renda.

Laura faz projetos através da sua própria empresa, a Trinques Arquitetura, por preços que variam de R$1mil a R$3mil. “Nossa missão é garantir um lar seguro, saudável e confortável construindo de forma sustentável e barata”, diz a fundadora, que entre seus clientes estão a moradora do Morro Chapéu Mangueira, D. Ester, a cozinheira, D. Nice, costureira que mora na Rocinha, e o Neemias, arquivologista que mora num espaço de 30 m2 no Cantagalo.

Laura Beringuer por Miguel Moraes

Ou seja, em apenas, quatro anos de atividades no Brasil, Laura Beringuer já assinou projetos no Morro do Cantagalo, Rocinha, Babilônia, Chapéu Mangueira, Manguinhos, Vila Cruzeiro e em Bangu, no Rio de Janeiro, e até em Aracaju, capital sergipana.

Mas de onde vem toda essa criatividade? “Meu pai é da Argélia fugido da guerra, trabalha como técnico de informática e minha mãe francesa, professora de inglês. Foram eles que fizeram a nossa casa a vida toda e eu sempre participei das obras. Eles influenciaram muito sem querer. Eu nasci na periferia de Paris e morei em um alojamento social chamado Residence Le Parc. O conjunto habitacional, construído no pós-guerra pelo arquiteto Fernand Pouillon, conta com 2.635 apartamentos. Minha avó dela chegou lá em 1962, vinda da Argélia. Depois, mais tarde, nos mudamos para uma casa, onde eles moram até hoje e que tivemos que reconstruir tudo. A cada férias a gente fazia a casa diferente, então era normal pegar coisas velhas e reformar, refazer um cômodo inteiro da casa.  Desde pequena eu adorava pegar coisas velhas como móveis e reformar. Meus pais me deixavam criar. Diziam, veja ali o que você quer fazer com essa escada! E eu  ficava desenhava com lápis de cor na parede cada domingo um pouco de flores, plantas e pássaros”, conta a francesa.

Laura Beringuer por Miguel Moraes

Há 7 anos ano Brasil, Laura chegou pela primeira vez para fazer intercâmbio e depois voltou ao Brasil por causa da crise na França, para tentar a sorte. Trabalhou por pouco tempo no escritório de arquitetura Rua, ganhadores do Pavilhão de Golf das Olimpíadas, onde Laura fez cenografia de exposições e projetos de espaços de escritórios.

“Eu penso a arquitetura como um roteiro. As pessoas devem passar por lá e acontecer coisas, como uma história. Numa casa, o mais importante é que seja saudável e confortável, bem ventilada, boa iluminação, que faz parte da saúde da casa. No caso da arquitetura na favela, a casa deve ser mais segura estruturalmente, ou seja, ter certeza que não vai cair nada e na segurança do uso do dia-a-dia como por exemplo as escadas e a segurança do sistema elétrico. Hoje para mim isso se torna bastante importante”.

Laura Beringuer é arquiteta e trabalha em projetos nas comunidades (Foto: Miguel Moraes)

Laura tem como o seu maior desafio fazer uma casa na comunidade com orçamento baixo que tenha conforto, saúde e segurança. Fazer o projeto caber no bolso da pessoa e criar soluções espertas e criativas. “Eu moro numa casa no Morro da Babilônia com meu marido e meu escritório fica também numa outra casa. Eu também faço a mesma coisa em minha casa, reutilizo materiais de construção, como tábuas”.

“O objetivo é melhorar a moradia popular, trazer um profissional da construção para quem iria construir a sua casa sozinha. Tive essa idéia quando eu estava fazendo uns projetos de freelancer e fui convidada para fazer uma obra para um pedreiro me deu ajuda e ele não sabia como fazer. O pedreiro tem sempre que se inventar arquiteto! O terreno estava muito torto, ai eu falei que podia ver e desenhar uma casa para ele. Desenhei a casa, o pedreiro construiu bem, ficou ótimo e ai outras pessoas começaram a pedir o mesmo”.

Laura Beringuer por Miguel Moraes

A arquiteta montou um projeto para atender pessoas de baixa renda e foi selecionada no projeto Rio Criativo da Secretaria de Cultura, como economia criativa e ganhou uma verba  para fazer por um ano e meio de encubação para se tornar empresa. “O edital era já um prêmio. Ganhei lugar para estudar, pesquisar e trabalhar, 60 mil reais para gastar em consultoria, cursos, especialização e comunicação”.

E como fica a nossa dica para quem quer pensar em “Sair da caixa” ? “Acho que quando a gente gosta do que faz, a gente consegue. Mesmo sendo um pouco “fora da caixa”, querendo de verdade e compaixão dá tudo certo” objetivou a arquiteta.