Roberta Rodrigues é sinônimo de empoderamento. Nascida e criada no morro do Vidigal, ela descobriu que seria uma artista ainda nova, foi formada pelo grupo Nós do Morro e a partir disso precisou batalhar muito para chegar aonde chegou: estrela de novela das 9h da Globo e cantora de uma banda famoso de hip hop, o Melanina Carioca. Embora tenha saído do conjunto musical para começar um projeto pessoal com Cintia Rosa, Sabrina Rosa e Roberta Santiago chamado Linda Flor, segue brilhando em Segundo Sol com a sua personagem Doralice que vem dando o que falar. Apesar do papel ser de uma mulher forte e que ama a família, ela possui um ciúmes doentio que a destrói chegando a criar situações em sua cabeça que incriminam o marido. “Ela acredita realmente que este sentimento é algo natural, não pensa que pode ser uma doença. Ela é simplesmente maluca. Acredita que o marido a está traindo e paga pessoas para seduzi-lo para saber se ele cai. Grita e bate, mas um dia esse homem cansa”, adiantou. Além disso, é filha do dono de um terreiro de Candomblé e, mesmo o pai querendo que ela assuma o local, a mais nova não quer esta responsabilidade.
Os preconceitos e o julgamento antecipado desta personagem geram uma dinâmica muito interessante para o seu núcleo dramatúrgico. O público está acostumado a ver cenas nas quais a mulher é oprimida como foi ilustrado em Outro Lado do Paraíso, a novela que antecedeu Segundo Sol. Embora a violência doméstica contra o gênero feminino seja mais problemática e corriqueira, Roberta vai mostrar outro lado da moeda com sua personagem e questionar estas relações opressivas. “As pessoas pensam que é engraçado ver um homem apanhando de sua companheira, mas não é. Ninguém deve apanhar do outro. A novela mostra esta outra face da discussão que é importante”, salientou.
Com diversas passagens pela Globo, seja em novelas, séries ou programas de televisão, Roberta Rodrigues sempre relembra as suas origens. Ela alcançou o sucesso após ter ficado conhecida por sua participação no filme Cidade de Deus. “Eu fico chateada por nunca ter reprisado na Sessão da Tarde, mas é muito pesado. Ele teve uma repercussão muito grande. Fico contente”, contou. No entanto, embora tenha começado nas telonas, o que mais lhe encanta é fazer TV. “As novelas são o que sabemos fazer de melhor no Brasil. Impressionante como nenhum lugar do mundo consegue fazer igual. O nosso diretor, o Dennis Carvalho, falou que a gente se vira nos 30 e é verdade. Sou grande admiradora do gênero, porque nos damos ao máximo e mergulhamos mesmo no personagem. A comida e o cenário são tão reais que é como se estivéssemos em outro universo. Agradeço e me sinto privilegiada por fazer parte da indústria da telenovela”, comemorou.
Fazer sucesso é complicado. Nem sempre o seu trabalho emplaca, mas a artista conseguiu tanto na música quanto na dramaturgia. Enquanto existem muitos atores lutando por um lugar ao sol, Roberta Rodrigues alcançou o privilégio de estar trabalhando em projetos de sucesso. Mesmo isto sendo uma vitória, a atriz lamenta pelos seus companheiros. “Eu vim do teatro, onde fazíamos peças para não ganhar nada, às vezes, mal tínhamos o almoço e o jantar. Ficávamos o dia todo trabalhando e ensaiando, mas alguém me escolheu. Sei que tem uma galera que infelizmente não consegue. Acho um pecado que nossos governantes não invistam na arte, porque acredito que é a única coisa que realmente transforma e consegue fazer com que o ser humano se livre de suas mazelas. Infelizmente nosso país não valoriza ninguém, seja o artista, o teatro ou o músico. Temos que nos unir e batalhar e enquanto isso não acontecer nada vai mudar. Fico triste por termos no teatro tantos artistas incríveis em peças sem patrocínio. Não sei o que pensar e não consigo ter sabedoria para saber aonde iremos parar com essa loucura que está acontecendo no Brasil”, garantiu.
Toda esta trajetória de êxito é fruto de muita luta e talento, mas também contou com a grande colaboração do projeto Nós do Morro. O grupo ajudou a formar diversos atores de sucesso no meio que moravam, principalmente, na favela do Vidigal e um deles foi a própria Roberta. No entanto, a atriz lamenta o estado atual da cia teatral. “O Nós do Morro é meu chão, onde comecei e sou grata. Nós não pensávamos em ser famosos, queríamos só fazer arte e trocar conhecimento. Acho que depois de um tempo degringolou, porque muita gente foi para lá visando os holofotes e aí começou a perder a essência. As fases passam, assim como a ideia de virar uma celebridade, e por isso as pessoas literalmente abandonaram o projeto. Fico muito triste pelo projeto não ter um patrocínio e estar meio abandonado, mas infelizmente não tenho como transformar isso sozinha”, criticou.
A atriz mostrou ser muito pé no chão. Mesmo tendo se mudado da comunidade que nasceu há cerca de dois anos, ela nunca deixou o local de lado. “Ter nascido no Vidigal foi um privilégio. É um lugar maravilhoso com pessoas incríveis e me tornei isto graças a eles. Sinto que tenho uma responsabilidade de cuidar da minha comunidade, mas isso não é um peso, na verdade faço com todo amor do mundo. É um lugar que eu quero ver florescer. Não moro mais lá, mas ali é a minha origem. Infelizmente, existe muito descuido com aquele lugar e as pessoas que ali moram”, lamentou. Mesmo estando longe, ela possui um projeto social no qual mobiliza diversas pessoas a doarem brinquedos e alimentos para fazer festa de Natal, de Dia das Crianças e da Páscoa para os mais novos.
Para ela, não é nenhum sacrifício voltar para as suas origens e tocar projetos sociais, no entanto esta iniciativa própria não é fruto de uma culpa que sente por ter tido oportunidades que os outros não tiveram. “Cada um tem seu caminho, sua estrela e sua oportunidade e se não tiver, crie. Tiveram dias que desci do morro sem dinheiro para pagar a passagem para fazer os testes de elenco. Eu ia andando do Vidigal até Botafogo e não falava nada para ninguém. Saía três horas antes, porque sabia que minha mãe e meu pai não tinham dinheiro, mas ia feliz da vida pensando que nada é por acaso”, salientou. Viva, Roberta!
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