Rafael Losso é a sensação do momento! Em um papo com o site HT, ele falou sobre a carreira, feminismo, política e eleições em ano de Copa do Mundo


O ator que acaba de se despedir do personagem Zé Victor, em O Outro Lado do Paraíso, ainda pode ser visto na TV e no cinema com outros três personagens. Um deles, um Skinhead que levou Rafael a tomar banho de sal grosso para descarregar as energias. “Um dos produtos mais pertinentes ao mundo que eu fiz”, afirmou.

Aos 14 anos Rafael Losso subiu em um palco pela primeira vez – foi no colégio, durante uma aula de teatro. Desde então, a vontade de atuar só aumentou e, mesmo sem o apoio dos pais no início, o ator persistiu na profissão. Depois de uma longa trajetória no teatro, em peças como Léo e Bia, de Oswaldo Montenegro, e os clássicos Hamlet e Macbeth, de William Shakespeare, o ator chegou às telinhas na novela O Astro, onde interpretou o jovem Olavo Martins. Mas foi recentemente, como o garimpeiro Zé Victor, na novela O Outro Lado do Paraíso, que Rafael Losso conquistou de vez a mídia e o público.

Para Rafael, interpretar o garimpeiro contribuiu para que ele chegasse a um dos momentos mais importantes da profissão de ator. “Ele deu uma dividida na minha carreira. As pessoas puderam começar a entender e reconhecer o meu trabalho. A TV abrange muitos espectadores e, entre eles, estão também pessoas do mundo artístico. Foi muito importante para mim que o pessoal das Artes Cênicas entendesse o meu trabalho e me parabenizasse”. Contracenar com grandes nomes da dramaturgia brasileira, como Marieta Severo, Lima Duarte e Fernanda Montenegro, foi o diferencial nessa experiência de crescimento, segundo o ator. Sobre isso, ele é só agradecimentos a Marieta, que interpretou a vilã Sophia, em O Outro Lado do Paraíso – e de quem o personagem Zé Victor foi cúmplice em um assassinato. “Foi um aprendizado muito grande. A Marieta, que era minha parceira, foi de um profissionalismo inenarrável. Uma atriz desse calibre, trabalhando com vários atores jovens, e sendo muito profissional. Sempre discutindo e trabalhando as cenas, para fazer tudo da melhor forma”, afirma.

Rafael Losso diz que o personagem Zé Victor foi um divisor de águas em sua carreira como ator. (Foto: Leo Fagherazzi/Make: Vanessa Sena/ Stylist: Rafael Menezes)

Quase na mesma época em que se preparava para viver Zé Victor, Rafael também interpretou outros três personagens. No longa Virando a Mesa, que estreia em breve, ele interpreta o melhor amigo do policial protagonista Jonas, interpretado por Rainer Cadete. O filme de ação com doses de humor politicamente incorreto conta a trajetória do policial novato que precisa fechar uma boate clandestina. Em Rio Heroes, série original da Fox, o ator viveu o lutador e antagonista da história Eric.  A série, no ar desde fevereiro, fala sobre o campeonato clandestino de luta livre Rio Heroes. Mas foi o personagem skinhead Capitão, em Rotas do Ódio, série nacional do Universal, que realmente “mexeu” com o ator. A série se baseou no trabalho realizado pela Delegacia de Polícia de Repressão aos Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI) de São Paulo, para mostrar o esforço da delegada Carolina, interpretada por Mayana Neiva, em combater esse tipo de crime.

Para viver o neonazista, Rafael precisou mergulhar em filmes, documentários e séries, mas afirma que a construção de Capitão foi aos poucos. “Eu fui buscando cena a cena. Fui construindo bem devagar, em doses homeopáticas. Pegava uma cena, estudava, entendia aonde ela queria chegar e o que queria dizer, para não ter que carregar os sentimentos do personagem comigo o tempo todo”. O mais difícil, segundo o ator, foi interpretar e humanizar a intolerância. “Eu tinha que chegar em casa e tomar um banho de sal grosso, para poder tirar a energia que a gente começou a carregar. Os assuntos eram muitos pesados, a gente xingava negros, orientais, toda a população LGBT. Mas existem pessoas assim e eu precisava tornar o personagem real”, explica. Levando em conta que o Brasil é o país que mais mata a população LGBT no mundo, segundo dados da TransBrasil, e inúmeros casos de racismo, Rafael defende a necessidade da discussão desses temas na televisão. “Esse assunto é pertinente não só aqui no Brasil, mas no mundo de hoje. A intolerância mata muitas pessoas todos os dias. Se a gente não começar a entender as diferenças, não vamos conseguir viver em sociedade. Nosso papel é questionar, levar à tona, para que as pessoas comecem a repensar”.

Para Rafael Losso, o personagem neonazista Capitão foi o papel mais duro da carreira de ator. (Foto: Leo Fagherazzi/Make: Vanessa Sena/ Stylist: Rafael Menezes)

O personagem Capitão representa tudo o Rafael Losso não é. De espírito livre, como se define, o ator procura viver sem preconceitos. Criado em uma família conservadora, com o pai do interior e mãe filha de alemães rígidos, Rafael atribui essa mente aberta à capoeira e ao teatro. “Meus pais tiveram que sobreviver ao tempo deles, e foi isso que eles passaram para os filhos. Certas etapas da minha vida me ajudaram a desconstruir certas coisas.  Na capoeira, a cultura brasileira veio com uma força para dentro da minha vida que foi muito importante. O teatro me possibilitou ter contato com pessoas de todos os tipos. Essas vivências me fizeram ser uma pessoa mais leve e livre, para aceitar tudo e todos”. O ator, inclusive, adora usar saias e é defensor da causa feminista. “Eu acredito em um mundo dominado pelas mulheres. Elas são muito mais leves e tem uma inteligência emocional muito maior do que qualquer homem. Para evoluir a gente precisa delas”, conta.

Nesse contexto, Rafael fala sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco, do PSOL, há dois meses, e que ainda não foi solucionado. A vereadora defendia os direitos humanos e lutava pelo das mulheres. “A Marielle estava sendo mais que uma pedra no sapato. Eu espero que as pessoas continuem querendo saber quem a matou. Porque parece que os políticos vão deixando o tempo apagar, mas têm coisas que não podem ser apagadas”. Além disso, para ele, o caso Marielle não foi isolado –  ele reflete todo o cenário político brasileiro. “Existe um poder no Brasil que é obscuro e que é contra as pessoas que querem mudar a sociedade. Depois que ela (Marielle) foi morta, cinco dos sete projetos dela foram aceitos. Tem muita gente que acha que isso não tem a ver com a maneira como a política é feita no Brasil, acham que isso foi só mais um dos milhares assassinatos que acontecem todos os dias. E é aí que mora o perigo. Isso é um reflexo do descontrole da nossa política; de pessoas que querem ter um controle total da nação, sem entender como se constrói uma nação melhor”, explica.

Rafael Losso fala sobre o caso da vereadora Marielle Franco e afirma que ela não pode ser esquecida. (Foto: Leo Fagherazzi/Make: Vanessa Sena/ Stylist: Rafael Menezes)

Sobre isso, Rafael fez ainda uma crítica a Copa do Mundo deste ano, que será realizada em junho, na Rússia. “A Copa do Mundo não combina com a época que mundo vive. É mais uma festa para deixar as pessoas achando que está tudo bem, e depois tudo volta ao que era”. Para o ator, os reflexos desse evento aqui no Brasil podem ser ainda piores. “Teremos eleições alguns meses depois. Se as pessoas ficarem extasiadas com isso, ainda mais se o Brasil ganhar, elas podem acabar esquecendo de levar em conta todos os problemas que estamos vivendo. Temos que estudar e tomar muito cuidado na hora de votar”, alerta. Recado dado, viu?