Manifestação tipicamente brasileira, o samba tem lugar garantido no panteão da cultura mundial como a arte e a música da alma de um povo. Generoso, acolhe quem quiser fazer parte de suas tradições, sua estética extremamente particular e seus princípios – o universo do samba é democrático por natureza. Foi proclamado Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Quando compositores se uniram para rodas de samba no quintal da baiana Tia Ciata (1854-1924), no Rio de Janeiro do começo do século XX, abriram o portal que nos levaria ao maior show da terra, o carnaval, espetáculo artístico de cores, esperança, alegria e sonhos que representa, como nenhum outro, a força do brasileiro. Um exemplo emocionante dessa arte está na Pimpolhos da Grande Rio, escola de samba mirim criada em 2002 que atravessou a Marquês de Sapucaí pela primeira vez em 2003, com cerca de mil crianças. Nessas quase duas décadas de existência, a agremiação cresceu e fortaleceu sua atuação social de maneira exemplar, levando luz e esperança a crianças, jovens e famílias.
Hoje, a ONG/escola de samba mirim promove projetos socioeducativos, culturais e profissionalizantes que têm como base a educação. “Nós estamos no guarda-chuva da nossa escola mãe, a Grande Rio, e temos objetivos direcionados para atender crianças, adolescentes e famílias. Somos uma instituição específica. O mote é o carnaval em sinergia com a educação. Os resultados têm sido muito positivos”, avalia Camila Soares, consultora de projetos da “escola-filha” de Duque de Caxias.
“Tivemos um mestre de bateria na Pimpolhos que hoje tem a mesma função na Grande Rio e já ganhou, inclusive, diversos prêmios”. Camila se refere a Fabrício Machado de Lima, que aprendeu a tocar o primeiro instrumento aos sete anos na quadra. Aos 27, está no comando da Invocada, como é conhecida a bateria da escola, e se orgulha em dizer que a Grande Rio valoriza a prata da casa: “Toda renovação é sempre bem-vinda”.
Outro case de sucesso é o de Taciana Couto, que, aos 17 anos, em 2018, foi a porta-bandeira mais jovem do Grupo Especial. Ela havia desfilado na Pimpolhos por dois anos, como segunda porta-bandeira, e por três como primeira a levar o pavilhão da agremiação. Em 2015, Taciana ganhou o Troféu Plumas & Paetês Cultural como melhor porta-bandeira mirim.
Atenta ao imenso potencial de salvar vidas através da educação, a Ortobom patrocina os projetos da “filha” da Grande Rio – sempre inspirada pela tríade qualidade de vida, bem-estar e sustentabilidade que norteia suas ações. Neste ano, o enredo do carnaval da Pimpolhos, “A Cor de Coraline”, é baseado no livro infantil homônimo lançado pelo escritor e ilustrador paulistano Alexandre Rampazo em 2017. “Vamos falar sobre identidade, especificamente sobre a pluralidade da cor da pele”, conta a consultora da Pimpolhos.
“Aliás, já reparou que quando se diz que algo é ‘cor de pele’ muitos só pensam em bege? Pois é, isso não é natural, não reflete a nossa realidade. É um conceito europeu e as pessoas não se ligam, não estão atentas a essa distorção. Precisamos chamar a atenção para essa questão o quanto antes”, acrescenta a professora de danças afro e arte-educadora Luna Leal.
O enredo da Pimpolhos é muito emblemático. Confiram: Eis que no pátio da escola, Pedrinho solta a frase – Coraline, me empresta o lápis cor de pele? Ela confusa começa a procurar na sua caixa de lápis de cor com 12 cores, qual seria o lápis que Pedrinho queria. Viu que o verde era a cor da pele dos marcianos. Pensou e como seria a cor de quem mora onde os Judas perdeu as botas. O amarelo seria dos peixinhos dourados. A pele vermelha como de um rei com raiva e uma rainha vergonhosa, seria este lápis. O lilás tornado um mundo fofo. O azul sendo a cor dos moradores de Netuno e percebeu que moramos num mundo com peles multicoloridas. Por um instante pensou no rosa que era a cor do Pedrinho, mas olhou para sua pele e entregou o lápis marrom para o amigo.
Pedrinho agradeceu e pintou seu desenho com a cor da pele de Coraline!
“O enredo da Pimpolhos da Grande Rio traz essa reflexão sobre qual seria a real cor de pele em um mundo com tantas opções? E que o bom mesmo seria se o amor prevalecesse e formássemos uma única cor, pensando sempre na igualdade para caminharmos em direção a um futuro promissor”.
A questão da representatividade é levada muito a sério pela escola. Segundo a mestra, as oficinas e atividades culturais vêm ajudando muitas crianças a estabelecer uma relação mais saudável com sua própria identidade. “Fazemos questão de acompanhar a vida dos alunos. Notamos que eles melhoram o posicionamento político e a valorização da sua cultura, evoluem socialmente. Quer um exemplo? Muitas vezes essas crianças passam a se relacionar melhor como o próprio cabelo, que antes achavam ‘feio’ ou ‘diferente’. É uma questão de representatividade, de se reconhecerem em imagens veiculadas nos meios de comunicação. E temos uma série de projetos para essas crianças e jovens seguirem em um mundo com mais educação, empatia e respeito a cada identidade”, comenta a professora.
Camila Soares frisa que o trabalho é de muita autoestima e as todas as oficinas têm como eixo transversal o tema do enredo de cada ano do carnaval. “E nós vamos desmembrando durante o ano inteiro com o objetivo de mostrar sempre que todas essas crianças e jovens são capazes de seguir um caminho mais feliz e com isso, valorizá-las, sempre”, pontua.
Luna, que trabalhava como assistente de produção no Museu de Arte Moderna do Rio (MAM-RJ), conheceu a Pimpolhos em 2009 e, no ano seguinte, foi convidada a trabalhar no projeto Escola de Carnaval – Plataforma de Desenvolvimento, Pesquisa e Produção do Carnaval, espaço para pesquisa, reflexão, produção e aprimoramento da cultura carnavalesca que conta com oficinas, visitas a espaços culturais, trocas com profissionais ligados à festa e do mercado de entretenimento e conexões com instituições de ensino. “As oficinas são todas gratuitas. Temos leitura e escrita, iniciação musical, artes, percussão para crianças e adolescentes, dança afro, teatro, dança de rua, mestre-sala e porta-bandeira, maquiagem, capoeira, entre tantos outros cursos”, comenta. Entre janeiro e setembro de 2019, aproximadamente 300 crianças e jovens participaram das oficinas oferecidas pela Pimpolhos. Os demais encontros culturais (passeios e palestras) tiveram uma grande abrangência também.
Mas como manter um programa cultural, educacional e profissionalizante tão extenso? “Nossos recursos vêm principalmente de patrocínios. Nesse sentido, empresas como a Ortobom são peças-chave, por terem acreditado desde o início”, ressalta Luna, acrescentando: “Meu sonho é levar os pimpolhos para uma apresentação no exterior”. Além dos patrocínios, a escola-mirim conta com ações próprias para buscar mais renda para seguir em frente com seus projetos.
O programa Escola de Carnaval é um dos três pilares da Pimpolhos na direção da autossustentabilidade socioeconômica. As outras fontes de renda são o próprio desfile, que a cada ano leva cerca de mil crianças e adolescentes para a Sapucaí com enredos educativos (que fazem com que a criança se aproprie da cultura e reelabore esses conhecimentos) e o projeto de turismo “Carnaval Experience”, que promove visitas guiadas para turistas conhecerem os bastidores do carnaval da Grande Rio ao longo do ano todo. O “Carnaval Experience”, aliás, dá ocupação aos “pimpolhos” mais crescidos. Como fonte de recursos, a escola conta, ainda, com o aluguel do Barracão Axé, espaço de dois mil metros quadrados na Zona Portuária que, no passado, foi utilizado para a produção do carnaval.
“Conseguimos unir uma plataforma educacional com programa profissional de turismo, onde os alunos que se destacam passam a ser guias, produtores, percussionistas, dançarinos, maquiadores fazendo parte do quadro de profissionais do ‘Carnaval Experience‘”, conta Camila. “O turismo é mais uma maneira de viabilizar a sustentabilidade socioeconômica da escola”, complementa Luna.
Atualmente, o carnaval da Avenida reúne mais de 90 escolas de samba que atraem ao redor de cem mil foliões para suas alas e carros alegóricos. Isso sem falar nos profissionais que trabalham o ano inteiro para que a festa aconteça sempre perfeita: coreógrafos, costureiras, artesãos, músicos, dançarinos, cantores e produtores, entre outros.
Para se ter uma ideia da magnitude da festa, o carnaval de 2019 reuniu mais de sete milhões de foliões e movimentou R$ 3,78 bilhões em receitas na economia carioca, segundo a prefeitura. (*) Os números foram considerados recordes. A receita gerada pelos setores de comércio e serviços, por sua vez, aumentou 26% em comparação com o ano passado. Ainda de acordo com a prefeitura, a cidade recebeu mais de 1,6 milhão de turistas e eles ficaram por aqui por uma média de sete a 11 dias. (É preciso lembrar que estamos falando do carnaval como um todo, incluindo os desfiles dos blocos, as vendas efetuadas pelo comércio etc.) *Fonte: Agência Brasil.
Conheça as atividades socioeducativas e as oficinas oferecidas atualmente pela Pimpolhos da Grande Rio
Teatro
A ideia é refletir sobre as transformações do teatro nos diferentes contextos e épocas, estimular o desenvolvimento das habilidades viso-motoras a partir de exercícios e criar uma peça que tenha como eixo estruturador e como conceito as noções de cidadania e de direitos e deveres.
Dança Afro
Aqui, os alunos aprendem a dançar ao som dos ritmos afro-brasileiros (ijexá, coco, jongo e samba-de-roda). No final da oficina, eles montam uma coreografia para apresentação ao público.
Percussão Infantil e Juvenil
Crianças e adolescentes aprendem a tocar instrumentos musicais de escola de samba e, com isso, trabalham a atividade motora e o raciocínio rápido.
Percussão para Adultos
A percussão estimula a troca de experiências com pessoas que já conhecem ou tocam algum instrumento, provoca a sensibilidade com o ritmo e a musicalidade de diferentes instrumentos e proporciona o contato com práticas e técnicas musicais.
Cavaquinho e Canto
Os alunos entram em contato com as primeiras noções e signos musicais através da iniciação ao canto vocal e do cavaquinho. Também são apresentados ao vocabulário musical, assim como a leitura, execução e prática da música.
Maquiagem Realista e Artística
Quem nunca quis saber como fazer aqueles efeitos especiais que transformam qualquer mocinha em uma bruxa nos filmes? Pois nesta oficina os alunos aprendem os conceitos referentes a maquiagem realista e artística, descobrem os itens e produtos utilizados no processo de uma maquiagem, têm atividades como maquiar e se auto maquiar e reproduzem as técnicas, além de estimular a autoestima e trocar experiências com os outros participantes.
Artes
As aulas de artes promovem o conhecimento de técnicas de ações artísticas, a fim de estimular a criatividade e a sensibilidade através do desenho, da pintura e da criação de objetos. O curso também propõe a interação dos participantes, buscando ampliar a visão de comunidade em seus aspectos socioculturais.
Leitura e Escrita
Amplia a visão de mundo, a criatividade e a imaginação a partir da literatura brasileira, propiciando o aprimoramento da leitura e da escrita.
Reforço Escolar
Os participantes têm a oportunidade de relacionar o conteúdo escolar com o universo lúdico do carnaval. Também aprimoram a leitura e a escrita, reforçando o que aprenderam em sala de aula.
Escola de Rua
O objetivo é contribuir com a melhoria da qualidade artística e a vivência em danças urbanas. A oficina é direcionada a crianças e adolescentes.
Mestre Sala e Porta Bandeira
O fascínio e a graça da dança do casal pode ser aprendido através de técnicas específicas. Além disso, a oficina tem como objetivo formar uma ala para o carnaval da Pimpolhos.
Escolinha de Futebol
A oficina de futebol estimula a compreensão do conceito de regra, promove o respeito às regras, aos companheiros e aos adversários, ensina a trabalhar em equipe (cooperação), reconhece as habilidades específicas básicas do esporte (drible, chute, passe, condução e controle de bola), amplia o acervo de jogos/brincadeiras (com bola ou sem) e ensina a brincar de bola com os pés.
Capoeira
A capoeira, que já chegou a ser proibida no Brasil, no começo do século XX, é, hoje, muito valorizada no exterior. A oficina compreende o percurso da origem às transformações históricas; identifica o significado da capoeira pelo viés cultural e filosófico; estabelece contato com aspectos técnicos e táticos básicos; estimula o trabalho coletivo a partir de princípios como respeito, disciplina, autonomia, solidariedade, amizade, cooperação, honestidade e justiça; ensina exercícios preparatórios (pulo, salto e agachamento); e registra por escrito os conhecimentos trabalhados durante o workshop.
Criação de Fantasias e Alegoria
Apresenta as etapas de construção das fantasias, das alegorias e dos tripés que compõem o desfile mirim.
Produção Cultural Carnavalesca
Mostra os processos do planejamento à operacionalização, passando pelas etapas de pré-produção, produção e pós-produção do carnaval.
E a gente escreve aqui o samba enredo da Pimpolhos da Grande Rio para o Carnaval 2020. E viva as crianças, a diversidade, a educação e o amor!
Enredo: A Cor de Coraline
O que é isso?
Não sei responder
Oh! Pedrinho
A cor da pele vai dizer
Minha escola mergulhou numa aquarela
São doze cores
Pra tingir a passarela
O amarelo peixe ouro cor lilás
O marciano esverdeado e demais
Dança das ondas e minha inspiração
No grão de areia meus versos
O teu azul traz encanto ao meu lugar
Netuno faz a estrela brilhar
Oooo eu sou criança inocente e tao confusa
Não sei o lápis que se usa
Sou de Caxias o meu samba da o tom
Da cor da pele o meu lápis e marrom
Será que o mundo um dia vai evoluir
Um lápis feito só pra construir
Sem preconceito vamos dar as mãos
Lembrar que o ser humano é diferente
De mais igualdade a essa gente
Deixar falar a voz do coração
De tom em tom
Brilhou a canção
Eterno amor
Nas cores do meu pavilhão
És minha paixão e de enlouquecer
Chorei de verdade não sei descrever Coraline pintou traço exemplos de vida
Pimpolhos tão bela dá um show na Avenida
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