Pepeu Gomes estava descansado no horário marcado para essa entrevista. Mas também pudera: mudou o horário de seu ensaio e ficou até tarde tocando guitarra. Na segunda tentativa, estava ajeitando detalhes no estúdio para continuar os trabalhos. Rotina de quem está ensaiando o show de seu novo disco, o já no mercado “Alto da Silveira”, só de faixas instrumentais. Um tiro no escuro, já que o Brasil, como o próprio Pepeu foi tácito ao afirmar, não têm a cultura de apreciar um som sem voz.
“Eu faço porque eu sei que no Brasil nós temos grandes artistas fazendo muito instrumental de qualidade e não tem espaço. Então tem que ser eu, que já tem uma história na música falando para o público e mostrando que não tenho vergonha de ser um guitarrista brasileiro, de tocar chorinho na guitarra, quebrando tabus. Faço para abrir espaço e ter continuidade”. Continuidade essa que é como “matar um leão por dia”. “A gente acaba tendo que ir para os teatros menores por causa dessa falta de cultura”, confessou.
Pepeu também vê a própria guitarra, instrumento que o alçou a reconhecimento internacional, em situação de dificuldade. Segundo ele, é um “dos poucos instrumentos que vêm atravessando gerações” como suas músicas fazem “desde anos 70” e que sobreviveu a luta contra uma mídia chamada de “anti democrática”. Democracia musical, aliás, é o que sobra em seu projeto paralelo, o Conexão Brasil. Ao lado do cantor e compositor Marco André e do o trio de percussão Manari, ele mistura sons do Pará, terra de Marcos, e da Bahia, seu reduto.
“A gente toca umas músicas que mostram as vertentes de Belém, mas também umas que mostram a Bahia ou o Rio de Janeiro através do samba-funk, por exemplo. Tudo que a gente descobriu com o projeto é alquimia. E isso é interessante para sair um pouco da mesmice. O ‘Conexão’ é uma coisa muito free, que mistura bem sem aqueles compromisso de ter muitos arranjos . É muito dançante, muito divertido”, adiantou. O projeto, estimulado por Marcos após um encontro com Pepeu no camarim, vai findando no Rio de Janeiro nos dias 29 e 30 de julho no Teatro Rival Petrobras.
Segundo Pepeu, por mais que pareçam diferentes, os sons do Conexão Brasil são bem uniformes. “A percussão baiana tem um pouco da de Belém. E a guitarrada também, já que a minha guitarrada é brasileira. Ela não é clichê, não é cover de nada. É uma coisa típica do Pepeu, algo que marcou a minha relação com a música”, falou. E no mesmo tom que fala de sua própria música, também não se faz de rogado ao analisar o que está no topo das paradas de sucesso.
” O Brasil é respeitado no exterior pelas harmonias que fazemos, nós temos um conhecimento disso. Todo tipo de música é válido, mas a gente tem que se inspirar mais no Tom Jobim e no João Gilberto. Ninguém aguenta mais música de dois acordes. Eu não sou contra nada”, lamentou. Ah, e quando Pepeu fala isso, não é da boca para fora. Radicalismo e crítica gratuita não é seu forte, nem quando afirma que não tem religião e é colocado a comentar as posturas religiosas polêmicas de sua filha, a pastora Sarah Sheeva.
“A minha religião é a música. Ela me leva para Deus, para pensamentos bons. Mas eu e ela conversamos sempre sobre isso. A gente tem um respeito mútuo e ela me aceita do jeito que sou”, disse, já aflorando seu pai paterno dando conselhos: “conflito de religiões é motivo para brigas e divergências. A inteligência tem que estar acima de tudo isso. Quando se é inteligente, se aprende a sublimar coisas desse tipo”. Pepeu, bom citar, fala com um tom tão tranquilo que não parece ter vivido os áureos tempos da loucura na década de 70. Falar de caretice com ele nem pensar. “Nós estamos no terceiro milênio. Essa coisa de careta e louco já acabou. Hoje a gente é da tecnologia, o mundo esta caminhando para uma evolução. Uma hora os carros vão voar, e a gente têm que voar também”, divagou.
É sendo lembrado do slogan de “sexo, drogas e rock’n roll” que Pepeu recorda da época em que usou drogas. “Passei por todos os tipos que você possa imaginar e sou um sobrevivente sadio disso. Hoje não acrescentaria em nada para minha cabeça, nem na minha evolução. O mundo é uma grande droga: tem as coisas ruins e boas e a gente tem as peneiras”, filosofou. O baiano, aliás, é bom em tirar o joio do trigo. Tanto que hoje, em pleno 2015, para ele o slogan mudou. “Agora é saúde, amor e compreensão”. Compreensão, por exemplo, com a escolha do próximo de querer se relacionar com alguém do mesmo sexo. “Quando eu fiz ‘Masculino e Feminino’ eu estava falando isso. O Brasil é um país livre e cada um têm o direito de fazer o que quiser com sua vida”.
Esse novo Pepeu, aos 63 anos, só pensa em duas coisas: música e família. Em setembro próximo ele vai conseguir unir os dois pilares de uma forma muito esperada. No palco do Rock in Rio, a convite da ex-mulher Baby do Brasil, eles vão revisitar os grandes sucessos – principalmente em novelas – que eles emplacaram. “É um reencontro familiar que meu filho Pedro [Baby] conseguiu. Vamos mostrar para as novas gerações toda aquela formação com pouco mais de 300 músicas que a gente construiu. Vai ser uma vibe muito grande, um show bárbaro para mostrar para essa galera mais nova, de uns 27 anos”, nos adiantou.
A animação com que conta os dias para o festival é a mesma com que faz planos para um futuro que não sabemos se é distante ou não. “Quero ainda fazer show com um orquestra sinfônica, morar um pouco nos Estados Unidos, estudar novas culturas e ver meus filhos crescerem com o DNA da música da família Gomes”. HT ia perguntar se ele pensa em se aposentar. Ia.
Serviço
Conexão Brasil com Pepeu Gomes, Marco André e Trio Manari
Teatro Rival Petrobras
Dias 29 e 30 de julho, quarta-feira e quinta-feira, às 19h30
Rua Álvaro Alvim, 33/37 – Cinelândia – Tel.: 2240-4469
Preço:
R$ 60 (Inteira)
R$ 40 (Promoção para os 200 primeiros pagantes)
R$ 30 (Meia-Entrada)
Classificação: 16 anos
Capacidade: 458 lugares
Artigos relacionados