Parte 2! No especial da entrevista exclusiva de David Brazil para o site HT, ele relembra os empregos que teve quando chegou ao Rio, o início da carreira e explica o codinome: “Amava a loja Yes, Brazil”


No Rio, ele morou de favor na casa de um casal que conheceu em Campina Grande, depois dividiu um quarto com um alcoólatra em um sobrado em Botafogo, no qual compartilhava o banheiro com mais 14 pessoas, até conseguir pagar por um quartinho de empregada em Copacabana. Hoje, ele mora de frente para a praia na Barra da Tijuca

“Oi, prazer! Eu sou a David, bonita, guerreira e danada. Eu sou aquela brasileira que não desiste nunca. Que enfrenta tudo e entra em qualquer buraco do mesmo jeito. Comigo não tem favela ou cobertura, rico ou pobre. Sou igual com todos”. E o papo continua… Depois de viajar para as lembranças de David Brazil em Campina Grande, onde ele passou a infância com a mãe e os quatro irmãos, e contar um pouco desta personalidade que cativa artistas e anônimos, é hora de pôr o pé na estrada rumo ao Rio de Janeiro.

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Em um ônibus, por três dias e sem banho, David realizou seu sonho de conhecer a Cidade Maravilhosa tendo a casa de um casal como moradia provisória. “Eles eram primos da Maria do Carmo, uma moça que eu ia para a casa dela para lavar o carro, varrer a casa e ajudar com as tarefas. Era uma rica da Paraíba que me adorava e me dava empregos”, lembrou David que dividiu seu sonho com este casal durante a festa de São João de Campina Grande, considerada o maior arraiá do mundo, de acordo com seu habitante ilustre. “Disse para eles que era doido para ir para o Rio passar férias e eles falaram que eu poderia ir ficar um tempo na casa deles. Quando chegou dezembro, eu resolvi viajar. Na época, eu tinha 18 anos e lembro que minha mãe e todo mundo da Paraíba ficou chorando muito. Mas eu vim”, contou.

E quando chegou, teve a praia de Botafogo, onde este casal morava, como primeiro cartão postal. Com o Pão de açúcar como plano de fundo e aquele mar da enseada completando a vista, David Brazil não teve dúvida: “Meu Deus, eu nasci para isso. Que Jesus me perdoe, mas, para Campina Grande, eu só volto a passeio. Daqui eu não saio e nem ninguém me tira”. E ele estava certo. O bom-humor à primeira vista foi um dos combustíveis que o manteve na cidade grande. Apenas um. Na mala, além dos sonhos, David trouxe garra e muitos brilhos. Afinal, discrição não é uma de suas habilidades mais poderosas. “Eu cheguei aqui achando que ia ser modelo ou ator. Mas não foi nada disso. Eu cheguei no Rio em uma quarta-feira e, na segunda, já estava em uma fila enorme para ser caixa de um restaurante natural em Ipanema. Eu lembro que fui com uma camisa de viscose ouro que brilhava muito. A minha ideia era chegar e já ser notado”, contou David Brazil aos risos da roupa que havia trazido na mala de Campina Grande.

Em uma série especial, o site HT irá revelar as mil e uma histórias e facetas de David Brazil (Foto: Heloisa Tolipan)

Não é que deu certo? Além do figurino, David Brazil também se destacou entre os candidatos à vaga de um restaurante natural em Ipanema pela confiança que passou ao dono do estabelecimento. Após a entrevista, que era para trabalhar como balconista, o empresário decidiu contratar o nordestino para mexer com o tesouro do restaurante: o dinheiro. “Ele disse que me daria uma semana para eu ficar no caixa e que, se não desse certo, me passaria para o balcão. Mas, desde a primeira entrevista, ele explicou que eu tinha passado confiança a ele”, explicou. E ele se achou atrás do caixa. O trabalho, sem muito glamour, garantiu experiência e novos conhecimentos e, com uma semana no posto, “já estava arrasando”, como ele mesmo garantiu.

Como caixa do restaurante, David Brazil começou a conviver com artistas e personalidades da época. Tudo bem, não era uma relação que ia muito além do “qual a forma de pagamento”. Mas, entre um troco e outro, ele ousava trocar algumas palavrinhas com pessoas que, até então, viviam apenas em seu imaginário global. “Uma vez, eu fui passar o cartão do Diogo Vilela, mas era outro nome que estava escrito. Aí, eu perguntei e ele me explicou que este é o nome artístico dele, que o verdadeiro é José Carlos. Eu lembro que fiquei encantado com isso e disse que um dia também teria um nome artístico”, contou ele que, nesta época, ainda se apresentava como Francisco.

Porém, se algumas palavras eram permitidas entre David Brazil e os clientes ilustres do restaurante natural em Ipanema, as fotos ficavam apenas na vontade. E olha que ele sempre foi um admirador preparado para as oportunidades. “Todos os globais iam nesse restaurante e eu ficava babando. Só que eu tinha que deixar a minha maquininha escondida. Desde pequeno, eu sempre fui tiete de artista e, por isso, andava com uma máquina fotográfica para tirar foto com famoso”, disse.

David Brazil e Fernanda Rodrigues nos anos 2000 (Foto: Reprodução)

Mas o emprego por lá não era suficiente. Com o período de férias acabando e a hospedagem na casa do casal carioca com os dias contados, David Brazil precisou se desdobrar para garantir um cantinho para morar. Quando saiu da praia de Botafogo, ele morou por uma temporada em um sobrado no mesmo bairro. O clima por lá? “Eram 14 pessoas dividindo um único banheiro. E o meu quarto eu ainda compartilhava com um alcoólatra que ficava o dia todo bebendo”, lembrou. Foi então que ele conseguiu mais um emprego e passou a morar em um quartinho de empregada em Copacabana.

No entanto, apesar dos gastos para se manter na cidade grande, David Brazil ainda tinha a preocupação de enviar dinheiro para o Nordeste. Na verdade, mais que isso. Além de ajudar financeiramente a família que havia ficado em Campina Grande, ele também comprou um artigo de luxo da época para estreitar a distância entre seu passado e o presente. “Naquela época, o telefone era caríssimo. Na Paraíba, ainda mais. Eu trabalhei muito para conseguir comprar um para dar para a minha mãe e este foi o primeiro presente que eu dei depois que vim para o Rio. Como eu era muito carente e me sentia sozinho aqui longe da família, eu comprei um telefone para consegui me comunicar com a Paraíba”, disse David que contou o que escutava da mãe nestas ligações. “Ela dizia para eu voltar, que o Rio não era cidade para mim”, lembrou o nordestino sobre o pavor que a mãe tinha da urbe.

Até que a vida de David Bazil teve uma reviravolta. Lá atrás, no começo dos anos 1990, aquele Francisco Santos, sonhador de Campina Grande, poderia até não ter muita noção. Mas, foi entre as carnes de uma churrascaria, que tudo começara a mudar. Depois de sair dos dois empregos que tinha, David passou a trabalhar no Búfalo Grill, famoso e super badalado restaurante do Rio de Janeiro dos anos 1990. “Lá, eles me chamaram para ser caixa durante a noite e, de dia, ser relações públicas do restaurante. O meu trabalho era rodar todos os hotéis com um voucher para convencer os gringos a irem lá na churrascaria. Eu ia andando a pé do Leme até o fim do Leblon”, lembrou sobre o restaurante que era frequentado por personalidades como Claudia Raia, Alexandre Frota e Maurício Matar.

Em suas caminhadas, além de ter o Rio de Janeiro como plano de fundo, David Brazil ainda garantia a queima de calorias na cidade maravilhosa. De certa forma, era uma consequência obrigatória de seu trabalho como relações públicas. Mas ele lembra da experiência com humor. “Naquela época eu era uma lacraia paraíba. Só tinha cabeça de tão magra”, afirmou. Até que um dia ele agregou mais uma função ao trabalho na churrascaria Búfalo Grill. “Um dia, a recepcionista faltou e eles pediram para eu substituir. Mas a minha função era só ficar na porta dizendo ‘olá, boa noite’ e ‘obrigado, boa noite’. Só que eu não conseguia falar só isso. Ficava puxando papo na fila, elogiando a roupa e conversando com todo mundo. Depois que a recepcionista voltou, que eu fui para o caixa de novo, os clientes começaram a perguntar do gaguinho da porta. Foi então que eu comecei a ser promoter”, contou.

E aí o personagem David Brazil começou a aparecer na sociedade carioca. “Teve uma noite que ocorreu o coquetel da peça ‘A Dama e o Vagabundo’, protagonizada por Adriana Esteves e Leonardo Vieira, e eu fui todo arrumado. Aí, o Paulo Jabour, que era fotógrafo dos maiores colunistas do Brasil, fez uma foto minha com os dois e a Andrea Veiga. Na hora de pôr o nome, eu disse David Santos, mas depois mudei para David Brazil. Ah, e Brasil com Z”, lembrou. A razão pelo codinome artístico? “Amava a loja Yes, Brazil”, revelou.

Com nome artístico como havia sonhado naquele episódio do cartão de Diogo Vilela e do lado dos artistas nas fotos que haviam sido proibidas em seu trabalho no restaurante natural em Ipanema, David passou a ser promoter de um dos maiores restaurantes da época do Rio de Janeiro. Reconhecido e quase uma atração da churrascaria, o emprego ainda lhe revelou novas possibilidades. “Um dia, o ator Marcos Breda foi fazer um gago em uma peça e pediu para fazer laboratório comigo. E eu topei”, lembrou ele que passou a ensinar como eram a respiração, comunicação e gestos de seu distúrbio.

A partir daí, David Brazil se viu inserido em um novo cenário. Dos bastidores do mundo de glamour dos artistas, ele passou a ser iluminado também pelos holofotes do meio. “A assessoria da peça do Marcos Bredas usou isso para promover o espetáculo. Como consequência, eu apareci pela vez primeira vez em um programa de televisão quando dei entrevista para o Jô Soares. E depois disso estou aqui até hoje”, comemorou. Para além da figura de fã, hoje, David Brazil também é ídolo para diversas pessoas. Referência no cenário gay e idolatrado pelo seu carisma, Claudia Raia e Susana Vieira agora são amigas pessoais daquele nordestino que apenas as tinham como ícones intocáveis. Ah, mas isso é papo para sexta-feira!