Bárbara Paz estava excitada na noite passada. A poucas horas de completar 39 anos, a atriz foi responsável por uma excelente performance na estreia em ‘Vênus em Visom’ na noite desta quarta-feira (16), no Rio. Em temporada no Teatro Leblon, a peça é a adaptação brasileira para o super sucesso da Broadway escrito pelo dramaturgo David Ives, recentemente transposta para a tela grande pelo controverso diretor Roman Polanski, indicado por esta obra à ‘Palma de Ouro’ do Festival de Cannes 2013. A versão brazuca do espetáculo tem a produção de Chyntia Graber e direção do argentino Hector Babenco, maridão da protagonista.
‘Vênus em Visom’ conta a história de uma jovem atriz determinada a protagonizar – a qualquer custo – uma peça baseada em um clássico, Venus. Depois de passar por alguns contratempos, Wanda (o personagem de Bárbara) chega atrasada e esbaforida no teatro para fazer o teste de atriz e, após muita insistência e jogo de cintura, convence o diretor, interpretado por Pierre Baitelli, a dar-lhe uma chance. O teste para o papel acaba se tornardo um eletrizante jogo que ultrapassa todos os limites entre fantasia e realidade, sedução e poder.
“Apesar de ser uma peça de gênero”, como disse o Babenco, o plôt conta com pitadas de humor e aquele palavreado usado nos bastidores de teatro por quem é do meio, com o lado cômico de Bárbara à flor da pele. A misteriosa personagem passa por várias transformações de humor em cena durante a tal passagem de texto, fomentando fetiches de dominação que começam como um simples jogo de sedução e descambam na total humilhação da condição masculina. Naturalmente, as repentinas viradas do personagem são prato cheio para a atriz extravazar seu talento, pois, em poucos segundos, ela consegue modificar a temperatura do personagem com calor superior àquele que alguém sentiria caso usasse um casaco de visom na praia.
O cenário onde a história se passa é simples, uma sala de ensaio com luz fria, mesa de escritório, sofá de consultório de analista e um casaco de visom – um dos fetiches do diretor Thomas, encarnado com precisão por Baitelli. O ator, aliás, está ótimo e, obviamente, Babenco deve ter deitado e rolado na química que existe entre o casal de protagonistas, ambos emprestando aos seus personagens o nervosismo neurótico que cada um leva em sua bagagem pessoal, tanto nas cenas de humor quanto nos momentos de tensão. Como cobra criada, Babenco sabe dirigir atores com afinco, arrancando deles aquilo que pretende passar como se fosse uma espécie de estripador pronto extrair o pâncreas de suas vítimas. O resultado fica visível e o embate entre os dois personagens em cena lembra o mesmo tipo de competência que o diretor usou para conduzir os jogos de atuação entre Meryl Streep e Jack Nicholson em ‘Ironweed’ nos idos de 1987.
Assim como Babenco, o diretor interpretado por Baitelli é perfeccionista ao extremo e, mesmo possuindo uma noiva, é capaz de sucumbir em pouco tempo aos encantos de Wanda apenas assistindo ao charme da moça durante o teste, provando que os clichês de sexo frágil, na verdade, são voláteis e muito mais subjetivos do que se possa imaginar. E, claro, os diálogos dos dois personagens são repletos de subtextos, se misturando com a realidade vivida em cena pelos dois de maneira visceral.
O prazer de ver Bárbara em cena aberta é semelhante à satisfação de sentar na frente da telinha esperando que ela se entregue aos rompantes neurastênicos que sua Edith comete em ‘Amor à Vida’. A impressão que sempre dá é de que a atriz tem dentro de si a mesma verve de loucura dos personagens que lhe são cabidos. Só que, no teatro, essa percepção fica muito mais aguçada. Ao vivo, é possível perceber quase olho no olho a forma doentia com que ela se entrega à arte de representar, afirmando uma intimidade singular com os palcos. E, talvez, uma das coincidências da montagem brasileira com a adaptação de Polanski para o cinema seja justamente o conhecimento que o diretor (Babenco) tem do talento de sua mulher na vida real, dominando o caminho das pedras para exorcizar o que pretende obter dela, assim como possivelmente deve ter feito o diretor polonês com Emmanuelle Seigner, a estrela francesa que interpreta Wanda na adaptação cinematográfica e que também é mulher do diretor.
Em entrevista exclusiva após a estreia, foi a vez Babenco interpretar, brincando de marido orgulhoso. E afirmou: “Bárbara é um bicho que não se dirige, se doma”. A estrela da peça, ao seu lado, completou: “Eu sou indomável. Vou improvisando e criando em cima disso. Por isso, quase sempre estou em processo de transmutação”, confessando ainda que a personagem domou o diretor, assim como muita vezes Bárbara faz com ele na vida real. “Quando o diretor escolhe uma atriz, ele, antes de mais nada, precisa desejá-la para poder criar em cima”, revelou a atriz. Pelo visto, com o casal da vida real não foi diferente. Perguntada sobre qual seria o visom que Babenco usou para seduzi-la, Bárbara foi categórica: “a inteligência extraordinária.”
Embora o tempo não tenha ajudado, com uma chuva forte caindo do lado de fora, o teatro estava lotado, com muitos famosos marcando presença na estreia: Rosamaria Murtinho, Fernanda Machado, Ricardo Pereira, Carla Daniel, Nathália Rodrigues, Zezé Polessa, Bianca Castanho, Thaila Ayala, Letícia Colin, Daniel Del Sarto e Larissa Maciel. Confira quem foi prestigiar o espetáculo na galeria de fotos.
Fotos: Vinicius Pereira
*Com Alexandre Schnabl
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