* Por Carlos Lima Costa
Ícone do telejornalismo brasileiro, Cid Moreira completa 93 anos no próximo dia 29 de setembro. Aposentadoria é palavra que não consta em seu dicionário. Pelo contrário. Sempre reverenciado e lembrado como o eterno apresentador do Jornal Nacional, onde esteve na bancada desde sua criação, em 1969 até 1996, com o tradicional “boa noite”, ele continua ativo e atravessa gerações com destaque, sucesso e se reinventando. Cidão (como é chamado pelos amigos) brilha agora no Instagram, com a contribuição da mulher, a jornalista Fátima Sampaio Moreira, 36 anos mais jovem. A página ocidmoreira já tem 856 mil seguidores. “Devo ser o mais velho influenciador digital. Não conheço quem tem a minha idade e está mexendo com isso”, diverte-se ele, que também tem um canal no YouTube. “Ninguém espera o sucesso. Você vai fazendo e a coisa acontece ou não”, pontua, em sua casa, na serra do Rio de Janeiro, aonde mora e tem um estúdio no qual grava e faz suas edições.
Como locutor de Rádio, narrador dos jornais do Canal 100, antigamente exibidos antes dos filmes nos cinemas, apresentador de telejornal, gravações bíblicas e agora, influencer nas redes sociais, Cid sempre foi bem sucedido. E atinge bastante também o público jovem. “Não conheci o fracasso. Se sou predestinado ao sucesso? Não sei. O que vou fazer? Alguns já nascem com o negócio para a Lua, outros não”, dispara, com uma gargalhada. Ao seu lado, Fátima expressa sua visão: “Isto tudo é resultado da seriedade do trabalho dele. O Cid não entra em um negócio se não sentir que vai dar certo e não faz nada mais ou menos, meia boca. Ele é extremamente dedicado ao que faz, perfeccionista. Agora, está encantado com a gravação de poemas. E não só declama, quer conhecer a história do poeta e da poesia para se entregar totalmente. É muito bonito acompanhar este processo” relata a jornalista.
No Instagram e no YouTube, Cid posta poemas, mensagens bíblicas, momentos do casal, resgata a Hora Social, quadro da época de Rádio, em que parabeniza os aniversariantes do dia. “Ele coloca também três mensagens por semana no Deezer. Coisa bem moderna, é um podcast. O Cid tem um entusiasmo pelo novo, é superantenado, quer saber os números, o que as pessoas estão falando, ajuda a criar as pautas, é muito interessante”, vibra Fátima.
Em tempos de pandemia, Cid acredita que deve comemorar a nova idade somente com Fátima. “Ano passado fizeram uma festa surpresa quando reativei o meu YouTube. Mas nunca fui de festas. Esta vez estou salvo. Não gosto quando fica um monte de gente e eu não posso dar atenção para todo mundo. Prefiro algo mais descontraído com poucos amigos”, explica.
Mas a data, claro, será especial assim como o dia primeiro de novembro, quando o casal celebra 20 anos juntos. Ela torna o isolamento social de Cid mais fácil. “Pra mim, tem sido tranquilíssimo, não me incomoda em nada. Primeiro, porque tenho uma mulher maravilhosa, extraordinária. Fátima é muito alegre, positiva, então, estou bem acompanhado, nada me chateia. Também dei sorte até nisso, mas demorou, tive que fazer uma longa pesquisa. E não há dúvida, ela me ajuda também a ser mais ativo”, assegura. “Temos uma porcentagem pequena de atrito, isso é bem legal, porque na intimidade a gente tem que ter alguém bacana, não dá para se suportar, tem que brincar. Para mim funciona assim, até porque como trabalho com ele, antes mesmo da pandemia já passávamos 24 horas por dia juntos. Um dos maiores problemas dos casais é a competição. Entre nós isso não existe. Uma das grandes vantagens, alegrias do nosso casamento é isso. Não há competição. Ele é bom pra caramba no que faz, é reconhecido, mas também sei meu valor. Agora, amo esse cara com toda a história que temos. É leve e divertido ficar com ele. Tem bom humor, umas tiradas muito legais. Sou feliz. É um encontro muito interessante o nosso”, devolve ela.
Para se manter bem, Cid sempre se cuidou e ainda se exercita diariamente. E não abre mão da rotina. Três vezes por semana conta com a ajuda de uma fisioterapeuta na academia que tem em sua casa para fazer pilates e musculação. “Pela minha musculatura e disposição, ela diz que eu tenho 60 anos, no máximo 70”, conta, orgulhoso. Cid faz ainda 40 minutos de esteira e sauna seca ou a vapor. “Depois, tomo uma ducha gelada. Esse choque térmico é bom, ativa as minhas defesas contra resfriado”, ensina. Ele gosta também de comer muitas frutas e diariamente ao acordar bebe um copo de água com limão. E para manter a voz grave que tanto sucesso faz mastiga um pedaço de gengibre todos os dias. “Evidente que há 20 anos, eu estava com mais disposição. Minha casa tem escada, subo e desço com muito cuidado. Agora, minha musculatura é bem saliente. Não é de um cara de 93 anos”, garante ele. “O Cid fez um check-up agora, tudo tranquilo. Está envelhecendo com uma saúde boa para 93 anos. Não tem pressão alta, colesterol, diabetes, nada dessas coisas. Tem um pouco de desequilíbrio, anda mais devagar. É só o envelhecimento natural”, acrescenta a jornalista.
Em relação a televisão, Cid garante que não sente a menor saudade dos tempos em que estava à frente do Jornal Nacional. Em abril de 2015, chegou a apresentar um bloco na comemoração dos 50 anos da Rede Globo, ao lado de Sérgio Chapelin, antigo companheiro de estúdio. “Deus me deu um dom não só em relação a trabalho, mas a qualquer coisa que eu goste, faça ou seja uma rotina. Por exemplo, vinho era a minha bebida predileta, de repente perdi o gosto. Não tenho saudade, então, é a mesma coisa com relação ao Jornal ou a qualquer outro trabalho que eu tenha feito. Me lembro como algo que passou e superei. Estou em outra, me achando melhor, mais bem posicionado. É assim que penso”, analisa. Cid até entrou para o Guinness Book como o profissional que ficou mais tempo à frente da bancada de um jornal. E lembra um fato interessante de quando William Bonner o substituiu: “Comentei que ele tinha tudo para bater o meu recorde. Mais novo, boa aparência, boa voz, capacidade.” Em cerca de três anos, se nada mudar a profecia irá se concretizar. Na rádio, em Taubaté, Cid tinha vivido situação semelhante. “Certa vez, Wilton Aguiar, o melhor locutor que tinha lá me falou: ‘Um dia, você vai ser o locutor mais conhecido desse país.’ Me predestinou isso e eu predestinei a mesma coisa para o Bonner, porque deu vontade de falar aquilo”, conta.
E cita outra lembrança. Agora, sobre sua atual fase. “Na sala vip do aeroporto, encontrei o Fred, que voltou recentemente para o Fluminense. Era considerado o rei dos stories. Ele me pediu para fazer uma foto e depois um take passando o cetro para mim. Fizemos essa brincadeira. Eu tinha uns 120 mil seguidores. Quando cheguei no avião eu já tinha passado dos duzentos”, recorda Cid, que tem contrato por mais quatro anos com a Globo.
Em momento de recordações, conta outra curiosidade. Um exemplo de como sua dedicação faz algo dar certo. “No ginásio, eu queria ser corneteiro, participar da fanfarra. Todo final de semana ela desfilava pelas ruas de Taubaté. Por influência do meu pai, consegui entrar, mas não sabia tocar, me deram uma corneta e eu fingi que estava tocando. Fiquei com vergonha de ter enganado todo mundo. Depois disso, treinei bastante. Aprendi, não foi fácil, e virei chefe da fanfarra lá e quando fui para o tiro de guerra e acabei tocando para a Força Expedicionária Brasileira, que estava aquartelada lá, antes dela ir para a Itália na Segunda Guerra Mundial”, ressalta ele, que antes da quarentena por conta do Covid-19, quando ia a algum lugar, as pessoas pediam para ele falar ‘boa noite, ‘jabulani’ e ‘Mister M’, termos que ficaram famosos na sua voz.
Para abril estava previsto a estreia do documentário sobre ele, Boa Noite, de Clarice Saliby, mas a pandemia adiou. As novidades nunca cessam. “Estou assinando um contrato para colocar a Bíblia em emissoras de Rádio. Serão cinco a dez minutos em todo o país”, conta, sem detalhes. Para Cid, a Bíblia ainda é o seu objetivo principal. “Quando gravei o clipe do Sermão da Montanha para o Fantástico, escrevi na capa do LP que foi lançado: ‘Há 25 anos, levo notícias nem sempre boas, mas a partir de agora quero levar o evangelho, que são notícias de Deus, até o fim da minha vida.’ Assumi um compromisso com o Divino de levar a palavra e tenho feito isso, ainda entusiasmado. Me sinto bem fazendo isso. Sempre releio e estudo a Bíblia.” Há uns cinco anos, tem se dedicado também a poemas de autores como Álvares de Azevedo (1831 – 1852). “Cada vez mais intensamente”, explica. Em vídeos postados no Instagram e no YouTube, declama obras de autores famosos, mas também de anônimos que lhe pedem. Recentemente participou de uma live para cerca de 400 professores, na qual apresentou nove poemas do português Fernando Pessoa (1888 – 1935). “Ler poemas ao vivo é muito difícil”, admite. E finaliza com um fato que o aborreceu nos últimos tempos. “Alguém colocou na Wikipédia que meu nome é Alcides. Isso é mentira. Sempre foi Cid, negócio chato!”, reclama.
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