E a 25ª edição da semana de moda e maior Salão de Negócios da América Latina, promovida pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG), realizada entre os dias 22 e 25, no Expominas, em Belo Horizonte, conseguiu mesmo escrever mais um capítulo para a história da moda brasileira. Foram essenciais e democráticos com a participação gratuita do público os talks, painéis e palestras e sentimos o feedback. Um horizonte de criações no qual o empreendedorismo, responsabilidade social e futuro da cadeia produtiva da moda foram debatidos. A dupla Pedro Themóteo e Gabriela Marcondes abriu a tarde falando sobre “O Poder Transformador da Moda com Sustentabilidade”. Depois foi a vez de Sandra Carvalho e Rogéria Maciel falarem, no SEBRAE Talks, sobre “Acessórios como autoexpressão”. No mesmo espaço, em seguida, Alanka Nasser e Janaína Ortega levaram o tema “Varejo & Estilo” para ser discutido com o público. Na EcoMaterioteca – projeto de Gabriela Marcondes e Denise Frade, o professor Antônio Fernando Santos ministrou a “Oficina Interativa de Estampa com Carimbos”. Fechando o dia com chave de ouro a programação do dia, Raquell Guimarães, da Doisélles, falou sobre “Moda Responsável no Século XXI”, assunto que domina e pratica há alguns anos!
Professor do IED, sócio-fundador da MateriaBrasil e mestre em design e antropologia pela ESDI/UERJ com o tema de pesquisa Biodesign, Pedro Themóteo mostrou que a sustentabilidade na moda vai muito além da matéria-prima e passa, inclusive pelos cuidados com cada peça comprada, o que muitas vezes não é passado para o consumidor. Além disso, ele abordou novos tecidos com a utilização do biodesign. Atualmente existem tecidos feitos através de biomateriais, que têm menor impacto ambiental, maior adaptação com o meio e tem um potencial muitas vezes não explorado. Alguns materiais inusitados como a kombucha foram apresentados. “A kombucha tem vários subprodutos. Um deles é uma camada que é uma celulose pura, tramada que, quando desidratada, fica com um aspecto e toque muito similares ao couro. Ele pode ser bordado, costurado, colado com água, sem uso de cola…”, contou Pedro. Já dando um spoiler sobre sua pesquisa de doutorado, ele mostrou que somos seres simbióticos e que existe uma relação de interdependência entre o ser humano e alguns animais, como o bicho da seda. “O consumo da seda é muito criticado pelo mercado vegano, por uma questão de exploração dos seres vivos, então esse projeto tem duas principais diferenças em relação ao mercado da ‘seda ruim’. No processo comum, o casulo é fervido para que o fio seja extraído, então o animal morre, você beneficia o fio, tinge e trama, para ter o tecido e fabricar os produtos”, frisou. Segundo o mestre, “o que a gente está fazendo é: pegando o bicho da seda, utilizando ele para tramar o chapéu, tirando ele do processo de trama com seda suficiente para ele fazer o próprio casulo. A gente não usa esse casulo para indústria, então ele completa o processo de metamorfose e vira mariposa, e depois disso a gente utiliza o casulo como adorno. Ele trabalha para a gente. A cultura de produzir esse tecido, altamente sofisticado já existe há mais de 5 mil anos, então, como o cultivo do bicho da seda é muito delicado, se pararmos a produção ele entra em extinção”, explicou Themóteo.
Em seguida, Gabriela Marcondes falou sobre a importância da moda sem resíduos ou com baixo índice de desperdício têxtil. “Durante muitos anos, eu trabalhei na indústria de confecção e minha pesquisa de mestrado gira em torno da gestão socioambiental do resíduo têxtil e o que estamos fazendo com ele, o que o poder público tem feito e quais são as nossas alternativas para poder solucionar esses problemas. O desperdício é muito alto, em média são 12%, na melhor das hipóteses, e a gente reutiliza muito pouco, porque o setor de economia criativa não dá conta dessa quantidade”. Ela ainda provocou a plateia, dizendo que só tecidos naturais, como o algodão, conseguem ser reciclados nos dias de hoje, porém, na maioria das vezes, os produtores dessas matérias-primas não têm disponível a tecnologia necessária. Ela ainda destacou o projeto EcoMaterioteca, um espaço de materiais ecologicamente corretos que teve o start em 2017, no Museu da Moda, e que teve um lounge para chamar de seu no foyer Salão de Negócios, do Minas Trend.
Sandra Carvalho, consultora de imagem e visagista, e Rô Maciel, consultora de imagem e estilo focada em acessórios e na mulher madura, foram as responsáveis pelo talk “Acessórios como Autoexpressão”, que foi muito bem recebido pelo público que esteve presente no estande do SEBRAE. A ideia da dupla era mostrar como você, independente do gênero, pode se diferenciar das outras pessoas apenas usando um acessório.
Ainda no SEBRAE Talks, Alanka Nasser e Janaína Ortiga abordaram o tema “Varejo & Estilo” voltado para pessoas que buscam empreender, crescer na carreira e se destacar no mercado da consultoria para o varejo de moda.
Na EcoMaterioteca, espaço destinado a educar o público com oficinas gratuitas diariamente e apresentar amostras de tecidos sustentáveis, orgânicos, biodegradáveis e ecológicos, o professor Antônio Fernando Santos ministrou a “Oficina Interativa de Estampas com Carimbos“, onde foi trabalhada a estamparia por meio de cunhos de madeira. “A gente está voltando lá na antiguidade, na época em que os egípcios usavam carimbos como design de superfície”, contou, ao site Heloisa Tolipan. “Os materiais são simples, baratos e qualquer um pode fazer em casa, além de ser totalmente sustentável. Estamos usando restos de madeira e, como suporte, poliamida sustentável, biodegradável, o que é perfeitamente utilizável na moda”, finalizou.
Fechando o dia com chave de ouro, Raquell Guimarães, nome à frente da marca Doisélles, falou sobre sua expertise durante a palestra magna do dia: “Moda responsável no século XXI“. Ela quando sentiu que precisaria de mais gente trabalhando em suas tramas de tricô e crochê para atender aos pedidos das clientes, enxergou em uma penitenciária masculina de segurança máxima em Juiz de Fora (MG), o local ideal para ensinar um grupo de homens que precisava e queria aprender um novo ofício. Então, montou uma oficina para ensinar essas técnicas com 18 homens que fazem, com maestria, as peças da label, que passam por um rigoroso controle de qualidade. “No final do século 20, eu achava que só empresas com um propósito chegariam ao século 21, mas foi uma ilusão juvenil, de quando a gente acredita na utopia. Infelizmente viramos o milênio com a moda ainda muito devastada pelo abuso, competição, consumo exacerbado e preço baixo a qualquer custo… Fazer moda com responsabilidade social é uma luta, um desafio!”, frisou. Segundo a designer, praticar a moda consciente ainda é algo de vanguarda e, por isso, não é muito compreendida. “Eu começo a perceber em um consumidor muito jovem essa vontade de fazer a diferença e seguir um outro caminho, mas ainda não aconteceu no consumo real, porque esse jovem ainda não tem poder de compra. O mercado mostra pessoas que formaram sua consciência em um equívoco muito grande, de consumo, de quanto mais melhor: tipo “eu quero, eu quero, eu quero…”
* O projeto “Os Clássicos estão na moda” é realizado com recursos da Lei Federal de Incentivo à Cultura, por intermédio do patrocínio da CEMIG.
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