*Por Brunna Condini
A lei 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha, completou 16 anos no último domingo como um marco na sociedade brasileira no que diz respeito ao combate à violência contra a mulher. Luiza Brunet, infelizmente, já precisou recorrer à lei – quando foi agredida pelo empresário Lírio Parisotto em 2016 – e desde então vem trabalhando na luta pelos direitos das mulheres e no combate à violência doméstica. Ela concedeu entrevista exclusiva ao site, falando sobre a lei considerada uma das melhores legislações do mundo no enfrentamento a esse tipo de agressão. “Não consigo imaginar a nossa vida sem a Lei Maria da Penha. Fora que essa mulher foi icônica, referência para todas nós, transformou seu sofrimento em luta, conseguindo minimizar a dor de outras mulheres”.
A empresária também falou sobre os ataques que a filha, Yasmin Brunet, recebeu no final de semana de uma seguidora em uma rede social, dizendo que a modelo deveria ser agredida, assim como Luiza foi no passado. Yasmin contou que as agressões são feitas principalmente por mulheres. “O que leva uma mulher a falar isso para outra? Deve estar muito mal, precisa se cuidar, está doente, e não percebe. Que ódio é esse? Desejar que a pessoa sofra uma agressão é crime. Falei para a Yasmin fazer B.O., a pessoa tem que parar. Você tem que denunciar quando sofre qualquer tipo de agressão, senão fica tudo igual”, frisa.
“A Yasmin é uma mulher independente, dona da sua vida e escolhas, e isso pode incomodar. Também falta sororidade, é um machismo muito arraigado. Quando fiz minha denúncia de violência doméstica também fui muito atacada por mulheres. Achei tudo tão absurdo que segui em frente, quis lutar. Me xingavam de vagabunda, mas sabia que aquela não era eu e não deixei isso me parar, fui em frente, mas custou a minha saúde”, recorda.
Se eu parasse de batalhar por justiça, poderia parar de ser atacada, mas segui, mesmo com tudo que enfrentei, e hoje sou respeitada – Luiza Brunet, ativista e empresária
Luiza acrescenta ainda que a filha enviou a ela “o print do que a mulher escreveu na madrugada de domingo. Fiquei preocupada. Só que Yasmin me viu sofrer, definhar, mas também me viu lutar. Se eu parasse de batalhar por justiça, poderia parar de ser atacada, mas segui, mesmo com tudo que enfrentei, e hoje sou respeitada. Comecei a ocupar um lugar que nunca pensei antes. Yasmin é forte e corajosa, como eu”.
Marco contra a violência
A Lei Maria da Penha é uma conquista de diferentes organizações da sociedade civil que sempre lutaram em defesa dos direitos das mulheres. A legislação objetiva proteger a mulher da violência doméstica e familiar, e recebeu esse nome devido à luta da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, por reparação e justiça. Ela sofreu constantes agressões por parte do marido, que em 1983, tentou matá-la com um tiro de espingarda. Maria escapou da morte, mas ficou paraplégica. Quando voltou para casa, após a internação e tratamentos, sofreu uma nova tentativa de assassinato. Dessa vez, o marido tentou eletrocutá-la. Depois de muitas agressões e abusos, Maria da Penha criou coragem para denunciar o agressor e lutou por direitos por 19 anos e meio, até que o país tivesse uma lei que protegesse as mulheres contra as agressões domésticas. “Ela é uma referência e o trabalho que faz deveria ter mais atenção, valorização por conta do poder público. As campanhas contra a violência deveriam ser pontuadas o ano todo, serem contínuas. Também é preciso fazer valer punições mais duras”.
“Apesar de já termos avançado neste tema, ainda temos um longo caminho a percorrer. São muitos casos de agressão, feminicídio, abusos. É uma lei jovem, e talvez alguns itens precisem ser modificados, para punições mais severas. Não sei se seria possível. Acredito que isso levaria o agressor a realmente repensar o que fez. Mas essa lei incentiva as mulheres a denunciarem e isso é fundamental”.
As campanhas contra a violência deveriam ser pontuadas o ano todo, serem contínuas. Também é preciso fazer valer punições mais duras – Luiza Brunet, ativista e empresária
Transformando a dor em luta
“Nunca pensei que fosse vivenciar na vida o que a minha mãe passou. Assisti violência em casa (a mãe da modelo, Alzira Botelho, sofreu violência doméstica). Sofri abuso sexual com 12 anos, quando vim do Mato Grosso do Sul para trabalhar como empregada doméstica. Sou vítima da violência sexual. Era uma garota pobre que pegava ônibus e trem, os caras se masturbavam perto das mulheres, se esfregavam. Não falávamos nada por vergonha. Se fosse hoje, daria uns sopapos”, diz.
“Também sofri abusos quando adolescente e adulta, e como modelo, passei por assédio moral e sexual. São marcas profundas, mas reinventei a minha história. E digo para as mulheres, se isso acontecer com vocês, denunciem, é crime. Posso dizer que encontrei uma missão, o meu propósito de vida se transformou nesta luta diária. Nossa responsabilidade com sociedade civil, é procurar direitos. Luto para que as mulheres confiem mais nelas e procurem a justiça, façam as denúncias. Essa batalha não é só por hoje, é para as gerações que virão depois. Passei algo muito ruim, mas isso se transformou em algo bom, maior. É maravilhoso poder dar visibilidade para um tema tão importante e urgente. Me transformei de vítima em uma pessoa respeitada pela sua luta. Tenho falado aqui e no mundo todo para pessoas que são subjugadas, sofrem, e precisam de amparo, saber que existe vida após toda violência”.
Luiza 60
A ex-modelo anunciou em abril deste ano que iria se candidatar à deputada federal, tendo como principal pauta a luta pelo direito das mulheres. “Não vou vir mais candidata, repensei. Quero continuar a ter liberdade para me posicionar, como cidadã da sociedade civil, livre. Considero o meu ativismo política humanitária. Acho que vale mais a pena do que tentar uma candidatura e acabar não fazendo 100% do que eu gostaria.”
Luiza afirma que o amadurecimento tem feito bem à sua trajetória. “Me orgulho de quem me tornei. Sou uma mulher muito mais forte e não tenho vergonha da minha história. Compartilhar o que vivi é trazer as mulheres para perto. Nunca pensei que a Luiza com 60 anos fosse ser tão potente. E tenho muito mais por fazer. Hoje gosto de quem sou. Acredito que todo mundo pode fazer uma vida diferente, transformar sua existência”, divide.
“Me tornei uma mulher de 60 poderosa, que sabe o que quer. A maturidade é maravilhosa e envelhecer está ótimo. Me sinto bonita, sexualizada. Me acho maravilhosa, afirmo isso com segurança e sem problemas (risos). Estou feliz comigo hoje. Me cuido, me sinto sexy, está tudo certo. Não olho para o passado”.
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