*por Luísa Giraldo
Em meio à comemoração do trigésimo aniversário, a criadora de conteúdo e empreendedora Lela Brandão ganhou um cobiçado presente no mundo corporativo: o reconhecimento como uma das 30 personalidades mais influentes pela Forbes Brasil, na “Forbes Under 30″. CEO da marca “Lela Brandão Co”, a influencer recebeu a indicação por confeccionar roupas que respeitam as mudanças e fases do corpo feminino, com o objetivo de deixá-lo estiloso de maneira confortável. Em entrevista exclusiva ao site, ela abriu o coração sobre a origem e os desafios da criação de uma marca de vestimentas inclusiva, os distúrbios alimentares que sofreu ao longo da vida e a condição genética rara de ter fios grisalhos desde a adolescência. Lela também criou o conhecido podcast “Gostosas Também Choram”, em que aborda assuntos de cunho emocional feminino e crises existenciais – dela e das seguidoras.
A empreendedora relembra que a “Lela Brandão Co” foi idealizada em 2020, em meio à pandemia da Covid-19, com a intenção de criar opções para corpos femininos diversos no cenário da moda brasileira. A fashion influencer sentia falta de uma marca que desse a “segurança” às clientes que todos os produtos “seriam respeitáveis ao corpo e confortáveis”.
Passei por situações muito difíceis com o meu corpo, acredito que a maior parte das mulheres se identifica quando falo isso. Quando adolescente, tinha uma batalha com questões e percepção corporal. Passei por transtornos alimentares muito sérios e cheguei, até mesmo, a ser internada. Comprava roupas para competir comigo mesma: comprava uma calça menor e colocava como métrica interna que precisaria ficar bem nela em dois meses. A minha relação era de servidão com as roupas, em que eu tinha que servir a elas e não às roupas a mim – Lela Brandão
Segundo Lela, a marca propõe um movimento: a revolução do conforto. Afinal, ela acredita que “uma mulher confortável em si uma revolução”. A reflexão se dá pela contramão da lógica que as mulheres precisam se adequar ao mundo, seja na moda, nos discursos ou na aparência.
Bem-humorada, a criadora de conteúdo rebate ao senso comum do público antes de conhecer o seu trabalho. “Ao falarmos de roupas confortáveis, as pessoas logo pensam que deve ser uma marca de moletom, de pijama ou de roupas para ficar em casa. Não! A marca transcende essa ideia! A gente propõe um novo olhar sobre todas as roupas que o público pode imaginar. Muitas pessoas acreditam que só existe um tipo de roupa confortável e a gente trabalha na ótica que, na verdade, todas as roupas podem ser confortáveis”.
A “Lela Brandão Co” cria roupas comprometidas em respeitar o corpo da mulher que vai vesti-las e trabalha em três frentes: necessariamente, ela precisa respeitar o conforto; ter adaptabilidade no corpo feminino; proporcionar a mobilidade – Lela Brandão.
A influenciadora detalha que as peças são pensadas para se adaptar ao corpo, em um cenário de perda ou ganho de quilos. Lela alerta que muitas mulheres precisam “abrir as roupas enquanto estão comendo” e que um dos efeitos da menstruação pode ser o inchaço e a retenção de líquidos. Para ela, a roupa precisa acompanhar os ciclos e operações do corpo da mulher.
Além disso, Lela observa que a maioria das vestimentas femininas formais, direcionadas para eventos sociais e festas, limita o movimento das mulheres. Ao lembrar que vive em uma sociedade machista, reflete que ainda há, infelizmente, situações em que precisa fugir e correr. Portanto, as roupas não podem e nem devem dificultar a mobilidade da mulher.
“Que icônico é poder subverter o universo da moda e reimaginar as roupas diante da pergunta: e se essa roupa fosse pensada para respeitar o corpo da mulher que vai vesti-la? Depois de três anos de @lelabrandao.co, eu entendo as pessoas que falaram, lá no começo, que seria impossível criar uma marca de roupas no Brasil do jeito que a gente sonhou. Que bom que a gente não ouviu”, escreveu ela, em um post no Instagram.
O faturamento de Lela está em cerca de R$15 milhões, de acordo com a Forbes. Atualmente, a marca conta com 123 mil seguidores no Instagram. Os reels e vídeos publicados sobre os produtos acumulam centenas de milhares de visualizações.
Condição genética dos fios grisalhos
Aos 13 anos, Lela Brandão encontrou seu primeiro fio de cabelo grisalho. Ciente da condição genética que assolou a vida das familiares, a menina propôs uma inovadora relação com as madeixas brancas.
Durante toda a infância, acompanhei as mulheres da minha família pintando o cabelo exaustivamente e perdendo eventos, perdendo tempo e dinheiro, perdendo tempo de descanso, que já é tão raro e tão precioso para as mulheres com a tripla jornada. Muitas precisam cuidar de um negócio ou do trabalho, da casa e da saúde das outras pessoas e aí, quando tem um tempo de descanso, precisa fazer essa manutenção – Lela Brandão.
A influenciadora explica que, pela quantidade grande de cabelo, não seria algo simples de fazer com frequência. “Quando tinha cerca de 23 anos, foi quando começaram a vir mais cabelos grisalhos e as pessoas começaram a me questionar se eu não ia pintar. Em resposta, decidi fazer um vídeo falando que não pintaria o cabelo, que não tinha esse tempo e que não dedicaria essa energia, tempo e dinheiro para isso. Neste momento, não faz sentido para mim porque não me incomoda, inclusive, até gosto”.
Durante a pandemia, as críticas aumentaram a ponto de fazer com que Lela pintasse os cabelos de branco, sobretudo as mechas frontais. Atualmente, apenas as pontas estão descoloridas.
“Dá muito trabalho. Acho que quem não pinta o cabelo não tem essa preocupação, não sabe o quanto precisa de uma dedicação, de um tempo e de um dinheiro que são muito preciosos para mim. Eu cuido muito do meu tempo de descanso porque, hoje, toco duas empresas, cuido da minha casa e outras responsabilidades à medida que a gente envelhece. Imagino até que, quando tiver filhos, vou ter ainda menos tempo. A partir da primeira vez que você pinta o cabelo, torna-se um ciclo sem fim”.
Me sinto muito pioneira, porque não é todo mundo com a minha idade que tem o cabelo grisalho. Poucas são as pessoas que aparecem na internet e na mídia assim. Vejo muitas pessoas mais velhas nesse movimento de assumir, mas poucos jovens fazem as pazes com isso. É um lugar bem solitário, mas também vejo que o impacto nos meus seguidores é positivo. Ao perceber que não escondo e que está tudo bem, a gente percebe que também tem beleza nesse lugar. É sempre um exercício de enxergar a beleza – Lela Brandão
Podcast “Gostosas Não Choram”
Além de ser idealizadora de uma marca de roupas, Lela também criou o conhecido podcast “Gostosas Também Choram”, em que aborda assuntos de cunho emocional feminino e crises existenciais – dela e das seguidoras. A podcaster opta por um posicionamento de acolhimento e proximidade com os quase 300 mil seguidores e entende que a troca com o público é essencial para que os episódios do produto em áudio deem certo.
Lela compartilha uma das formas na qual capta ouvintes. “O exercício de compartilhar frases motivacionais é estratégico de alcance porque elas vêm dos episódios do meu podcast. Na verdade, as frases funcionam como um resumo. Tento resumir o episódio em uma frase muito simples, o que me faz quebrar muito a cabeça e escutá-lo sem parar. Em cada um dos episódios, proponho uma reflexão, que está sempre acompanhada de uma mini-explicação para que as pessoas se interessem”.
Em 2023,, fiz um trabalho muito dedicado em entender como eu poderia produzir conteúdo de uma forma saudável para mim. Daí, nasceu o ‘Gostosas Também Choram’, no qual dobro o meu conteúdo em outros formatos de um jeito que a conversa não se restringe apenas aos 15 segundos das redes sociais, uma conversa muito curta e descartável — Lela Brandão.
A influenciadora explica que propôs “um movimento oposto” à lógica das trocas superficiais das plataformas a partir do desdobramento de assuntos em episódios de 40 minutos a uma hora. Para aqueles que optam por conteúdos mais concisos, Lela disponibiliza curtos trechos dos episódios, chamados de “cortes” atualmente, no Tik Tok e no Instagram.
“O descarte rápido dos conteúdos causa muita ansiedade nos influenciadores por fazer com que eles produzam todos os dias. A gente tem a impressão de que o conteúdo publicado hoje não vai ser mais lembrado amanhã e que ninguém mais vai falar sobre ele. Isso porque temos que postar um novo conteúdo no dia seguinte. É um ciclo sem fim”, desabafa.
A empreendedora destaca, por outro lado, que o podcast foi criado no final de maio. Apesar de ter pouco mais de sete meses, o projeto ressignificou “toda a direção” da carreira dela e o seu “jeito de produzir conteúdo”.
A ideia do podcast em si surgiu porque, no ano passado, por essa ansiedade de criar conteúdos em diversos formatos o tempo todo. Isso acabou comigo profissionalmente, me fez ficar muito desgastada e com uma sensação de ser insuficiente. O processo super difícil de esgotamento físico e mental me fez resgatar esse lugar. Percebi que o que me desgastava era justamente a sensação que as conversas nunca se aprofundavam nos conteúdos e a possibilidade de ser mal interpretada. Porque as pessoas não tinham tempo de escutar todo o raciocínio por trás de uma frase — Lela Brandão
Ela revelou que os temas tratados no podcast em um inesperado momento: durante o banho. “As ideias que passam pela minha cabeça surgem muito da minha análise também. Faço psicanálise há praticamente oito anos. Depois, converso com amigas e vejo que são questões em comum. As reflexões que eu trago são sempre elaboradas, nunca trago pautas que ainda são feridas abertas — tenho esse cuidado comigo e com a minha comunidade”.
Em seguida, Lela descreveu o interesse por questões particulares, geracionais e estruturais relacionadas ao universo feminino. Ela aborda, de forma geral, o contexto da condição social e cultural da mulher no pós-modernismo.
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