Ele é um dos maiores nomes da música clássica brasileira mundo afora. Aos cinco anos, João Carlos Martins conheceu o piano e aos 20 já era um dos pianistas mais aclamados do mundo. No entanto, durante sua gloriosa carreira na música, o brasileiro também encontrou o centro cirúrgico. Até a última operação, realizada no começo deste ano, já haviam sido 22 procedimentos para lhe garantir os movimentos das mãos, que foram afetados por razões que vão de uma pancada durante um assalto a um tumor. Aos 67 anos, ele se aventurou na regência e, de lá para cá, já comandou mais de 1500 concertos, além de ter criado a Orquestra Bachiana Filarmônica, que leva música clássica para jovens da periferia de São Paulo. Por tudo isso – mais que isso, na verdade –, João Carlos Martins é a inspiração do filme “João, o Maestro”, que estreia no mês passado nos cinemas.
No longa, a história do pianista é interpretada em três fases, tendo Alexandre Nero como protagonista na maior parte. Honrado com a homenagem em seu país, João Carlos Martins contou que o enredo já estava sendo discutido na Europa. No entanto, a LC Barreto assumiu a produção e assinou a obra com o selo brasileiro. Mas, com histórias que vão além da música e do centro cirúrgico, engana-se quem pensa que esta é a primeira homenagem artística a João Carlos Martins. “Na Europa, já fizeram dois documentários sobre a minha vida e que, por sinal, ganhou muitos festivais. Aqui, a Vai-Vai também fez um carnaval dedicado a minha vida e depois, já tive um outro documentário brasileiro também. Porém, esse filme é a cereja do bolo sem dúvidas”, contou.
Para garantir que o filme honre com os altos e baixos pelos quais o maestro já passou, João Carlos Martins contou que esteve presente em parte da produção. De acordo com o homenageado, sua principal preocupação era que o som do piano, que é das próprias apresentações de João Carlos Martins durante a carreira, não ficasse bem representado pelas mãos dos atores, que interpretavam em um instrumento mudo. “Eu acompanhei tudo o que dizia respeito à palavra sincronização porque o que é tocado são gravações minhas. Então, o que eu mais detesto é ver um filme em que está óbvio que não é o pianista que está tocando aquilo que estamos ouvindo. Por isso, eu fiz questão de acompanhar tudo. Mas foi muito fácil. Com quatro aulas, o Nero já pegou todo o jeito e o (Rodrigo) Pandolfo – que o interpreta na segunda fase – e o Davi (Campolongo) – que faz João quando criança – também. Quando eu assisti, eu jurei que eram eles tocando e não eu”, lembrou.
Com a sincronia perfeita, a história inspiradora e um elenco estelar, que ainda tem Alinne Moraes e Caco Ciocler, “João, o Maestro” estreia como uma obra de arte, tal como a carreira do homenageado. Porém, se para o público o longa é uma mistura de emoção, aprendizado e inspiração, para João Carlos Martins, “João, o Maestro” é a consagração de todos os anos de entrega à arte. “É uma emoção enorme por duas razões: eu tive tantos percalços na vida, mas sempre acreditei que podia continuar sonhando. Hoje, aos 77 anos, é como se eu estivesse complementando uma fase e iniciando uma nova. Agora, eu comecei um projeto para criar mil orquestras pelo Brasil em cidades pequenas. Então, pode ser que daqui a uns dez anos exista o ‘João, o maestro 2’”, disse.
E assim, com essa energia que nem mesmo 23 cirurgias conseguiram minimizar, João Carlos Martins segue como um exemplo para a cultura nacional. Inclusive, o pianista reconhece que o longa mostra isso nas telas. “Esse filme deixa a mensagem de uma pessoa que reconhece seus erros e acertos. Na verdade, que consegue corrigir os erros e aprimorar os acertos. É muito importante na vida que a gente tenha essa capacidade”, destacou o maestro.
Ele ainda quer mais. Como nos contou, sua trajetória nas artes brasileiras continua engrenada e agora a sua missão está nas mil orquestras que criou pelo Brasil. Aos 77 anos, João Carlos Martins acredita que as novas gerações precisam ter a música clássica e os instrumentos por perto. Afinal, a arte sempre teve sua função salvadora. Aliás, este pensamento do maestro vai na contramão do momento de crise e desvalorização da cultura no Brasil. Mas quem disse que isso é um problema para ele? “Villa-Lobos dizia que não é um público inculto que vai jugar as artes, são as artes que mostram a cultura de um povo. Prova disso foi na Segunda Guerra, quando o maior estadista do século XX, Winston Churchill, respondeu ao seu Ministro da Cultura como ficariam as artes naquele período. Ele disse que só estavam passando por isso, justamente, pela falta de cultura na vida de uma nação”, apontou o maestro João Carlos Martins. Saúde!
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