Marco Ricca possui uma lista de personagens em seu currículo e boa parte deles são homens mulherengos e, muitas vezes, infiéis. “Já fiz muitos galinhas. Espero que os diretores não me achem com cara de mulherengo”, brinca o ator. O filme Duas Irenes, de Fábio Meira, não foi diferente. O ator faz um pai que possui dois núcleos familiares diferentes com direito a uma filha que possui o mesmo nome que a outra. Neste jogo de dupla personalidade, o papel que desempenha consegue encantar algumas pessoas por seu jeito carinhoso de lidar com as meninas e ganha o ódio de outras que desaprovam o estilo de vida bígamo que mantém. “Existem coisas não ditas naquela família que, ao mesmo tempo parece que todos sabem o que está acontecendo e acho que as cenas expõem isto e tentam dialogar com este fato de uma forma muito legal. O Tonico é um pouco esquizofrênico por manter esta dupla identidade. É um personagem simbólico do conservadorismo, mas cresce ao longo da narrativa e topa enxergar aquela menina como uma mulher em transformação, é afetuoso com as filhas. Mas acho que todos os personagens vão se desenvolvendo ao longo das cenas”, conta o ator.
Para Marco, falar de traição é algo muito comum já que existem várias situações como estas ao longo da história do mundo. O filme já passou por vários países e em todos os lugares havia alguém da plateia que afirmava conhecer um homem parecido com o Tonico. “A dramaturgia é infestada de tragédias no núcleo familiar e a traição faz parte deste jogo da humanidade. Logo, é muito recorrente este tipo de personagem no cinema. Isto faz parte do nosso imaginário mundial. Tenho um filme que será lançado em que eu sou o contrário, sou o marido traído, funciona para os dois lados”, garante.
O ator não está fazendo sucesso apenas nas telonas, na rede Globo ele participou da super série das 11h, Os Dias Eram Assim, que se passava logo após a Copa do Mundo de 1970. Naquele ano, ainda se vivia a ditadura militar no Brasil e o enredo mostrava o período obscuro da sociedade. Marco é um dos responsáveis por esta representação do passado através do personagem Delegado Amaral que ganhou muita repercussão desde o início. “Não sabia que haveria uma repercussão tão grande porque este sim é um personagem muito escroto. Não estamos falando apenas de moral, como na história do Tonico, porque ele é um assassino e estuprador. Não foi inspirado em ninguém, historicamente, mas representa muitas pessoas que eram assim e, talvez, ainda existam. Acho importante a gente saber que em um período muito próximo a nós isto aconteceu, conheço pessoas que passaram nas mãos destes caras”, explica.
No entanto, ao fazer este personagem que colabora ativamente com a ditadura, o ator escutou alguns elogios que não gostou muito. “Algumas pessoas com quem cruzei na rua me disseram que estavam amando o personagem e achavam que o Brasil merecia alguém assim. Estamos em um momento muito difícil porque estão preferindo a volta de um momento obscuro e terrível da nossa história querendo ressuscitar estes vermes. Essa galera continua aí, porque nunca foram julgados e parecem ter políticos parecidos tomando espaço na sociedade. Estamos amedrontados e queremos um salvador da pátria e foi assim que se criou os piores estados totalitários do mundo”, critica o ator. A primeira reação de Marco Ricca a este povo foi ficar mudo e sem reação. “Estava tentando entender se eu tinha compreendido o que as pessoas estavam pedindo. Em um primeiro momento, pensei em sair da série porque achei que estávamos passando a mensagem errada porque parecia que nós não estávamos denunciando nada, apenas estimulando. Com essa repercussão, os autores colocaram mais cenas perversas e acho que agora as pessoas não querem mais este crápula no poder”, comemora.
O ator demonstra muito medo com relação ao momento político atual e demonstra possuir muitas opiniões sobre o futuro do país. “As pessoas preferiram colocar este presidente no poder do que respeitar o voto por medo de alguma coisa acontecer. Estamos tendo retrocessos que pensei que nunca mais fossem acontecer como a miserabilidade. Estamos fazendo campanha da fome de novo porque as pessoas estão precisando. Isto parecia ter acabado”, lamenta. Além disso, Marco Ricca mostra indignação devido a austeridade dos políticos com relação a cultura e a educação. “Se estes caras que estão tomando conta do país pudessem, eles fechariam o Ministério da Cultura, acabavam com o cinema e mandavam matar estes atores ‘vagabundos’ que só sabem falar mal deles. Eles não olham para a cultura, a educação e a divisão de renda. Espero que este período obscuro acabe rápido para que nós possamos escolher o nosso futuro. Temos que ter esperança para 2018. Ao invés de querer ir embora tempos que pedir para eles irem. Deixem as nossas crianças terem o que comer e serem bem-educadas. Eles estão legislando para eles mesmos e isto tem que acabar. Acho que a sociedade ainda está muito calma, daqui a pouco vamos começar a reagir fortemente ao que está acontecendo”, ironiza.
Fomentando a cultura, Marco Ricca possui três projetos de filmes para fazer. Apesar de não ter divulgado o início das filmagens, elas serão feitas em Recife, Porto Alegre e Curitiba. “Gosto muito do cinema nacional, temos uma safra de filmes muito sensacionais e espero que o público consiga ver cada vez mais”, afirma o ator.
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