As novelas de Walcyr Carrasco são sempre calcadas em assuntos muito atuais e com O Outro Lado do Paraíso não é diferente. Entre os temas mais polêmicos estão o racismo e a homofobia que já foram abordados em outras tramas da emissora. No entanto, pela primeira vez será abordado o nanismo e todo o preconceito por trás de pessoas que possuem baixa estatura. A atriz Juliana Caldas é a principal porta voz deste tema que promete instruir a população brasileira a conhecer melhor esta deficiência. “O preconceito não é maldade, na verdade, existe devido à falta de informação. A partir do momento em que se aprende o diferente, as ideias são acrescentadas na vida pessoal de cada um”, comentou a atriz. Por isso, é bom todos prepararem um caderno para anotar os conhecimentos que ela pretende passar com esta personagem. A atriz já adiantou logo: não existe o conceito portador para quem possui nanismo.
A personagem de Juliana contracena diretamente com a vilã Sofia, interpretada por Marieta Severo. Estela é filha da malvada e sofre na pele o preconceito por ter a deficiência, o que faz inclusive mantê-la longe da família ao morar fora. “A minha personagem acredita que a mãe fez o melhor para ela ao tomar a decisão de estudar em outro país. Também acredito nisso, porque gerou uma independência na Estela”, contou Juliana. No entanto, devido ao casamento do irmão, ela retorna, o que a fará enfrentar a negação da própria mãe. “Ela é muito forte, inteligente e romântica, no sentido de acreditar no amor em relação à família. Expressa este sentimento por tudo, pelos amigos, família, estudos e livros. A Estela não é depressiva nem revoltada, os irmãos a zoam, mas como irmãos mesmo. Uma relação parecida com a que tenho com o meu, no sentido de brigarmos e depois conversávamos normalmente. Mesmo percebendo a rejeição da mãe, ela a ama, acredita ser recíproco e pensa que a mais velha não sabe lidar com esta situação”, explicou. A atriz afirmou que está sendo uma honra contracenar com Marieta Severo e isto só fez a admiração por ela aumentar.
A história de Estela não irá se basear na relação de mãe e filha. A personagem vai se apaixonar por um português, vivido pelo ator Pedro Carvalho, que será um príncipe encantado galanteador. Até o momento, as gravações entre ambos não começaram. “O foco das cenas ainda são dentro de casa. Ainda não li os capítulos que falam do romance, por isso não sei muito sobre o que acontecerá depois da virada da novela. Se aparecer alguém será ótimo para ela, enquanto isso eu estou solteira”, brinca Juliana.
O Outro Lado do Paraíso é o primeiro trabalho da atriz na televisão. Ela ficou sabendo do papel através de testes que rolaram no Rio de Janeiro e São Paulo. Até o momento, Juliana Caldas atuava no teatro infantil, uma rotina muito diferente da novela que, inclusive, traz um tema mais pesado. “Foi uma grande diferença para a minha carreira. Participar de uma novela era um sonho distante que deixei guardado. Esperava fazer um papel dramático no teatro, saindo do estereótipo engraçado, e partir para um tema mais adulto. A Estela tem tudo isso e traz a questão do preconceito, do nanismo, numa trama adulta”, comemorou.
A mudança já começou com força total, a atriz precisou se mudar da capital paulistana para a Barra da Tijuca, no Rio. Segundo ela, o tempo que sobra entre uma gravação e outra é usado para dormir. “Estamos gravando bastante coisa. As primeiras cenas foram difíceis tanto para mim quanto para a Marieta, porque foram cenas de crueldade. Sempre que lemos o roteiro, conversamos antes para esclarecer quais são as dificuldades. As cenas que são difíceis para a Estela não deixam de ser para mim também, devido às coisas que ela ouve. Para estes momentos, falei com deficientes que sofreram este tipo de rejeição, o que me emocionou muito. Estamos fazendo com muito carinho e com o cuidado de respeitar o próximo”, informou a atriz.
Apesar de nunca ter sofrido com a rejeição da família e nem mesmo na escola, porque estudou no mesmo lugar desde que era nova, a atriz afirmou sentir todos os dias o preconceito da sociedade, principalmente, pela falta de informação. “A acessibilidade, que não existe, é um preconceito. As pessoas caçoam de você por ser anã. Uma vez fui comprar um ingresso numa casa de shows em São Paulo e pedi na área de deficientes, que não é no meio da muvuca. A moça da bilheteria não queria me vender o ingresso, porque, segundo ela, só poderia vender para cadeirantes e eu não era deficiente. Expliquei que se comprasse um ingresso normal só veria bundas. Chamei a supervisora o que não adiantou. Liguei para um advogado amigo meu e avisei que iria processar a ela e a casa. Foi constrangedor não me venderem por acharem que só cadeirante é deficiente. É chato ter que lembrar as pessoas disso. A acessbilidade está começando a aparecer, aos poucos, porque é lei, caso o contrário tratariam na base do ‘o problema é seu’”, lamentou.
O preconceito não está restrito a uma camada social ou ao núcleo pessoal, no trabalho os atores também sofrem. Juliana Caldas enxerga a personagem na televisão como uma oportunidade de abrir portas para todos que possuem a deficiência. “Seria interessante que as emissoras e produtoras nos vejam primeiro como atores e depois como anões. Artes cênicas é dar vida a outras pessoas, afinal. Na sociedade existe anões advogados e médicos. Quero que haja essa visibilidade e respeito pelo nosso trabalho”, garantiu. Seguindo esta ideia de aceitação, um dos grandes ídolos de Juliana é o ator de Game of Thrones, Peter Dinklage. “A minha inspiração não está ligada ao rapaz, mas nas produtoras e nas emissoras que o respeitam como ator e não como pessoa com nanismo. Quero fazer isto acontecer, não somente por mim, mas para outros que estão trabalhando e lutando cada dia para conseguir seu espaço com respeito”, explicou.
Dessa forma, além de O Outro Lado do Paraíso ser importante para a própria carreira, a atriz enxerga como uma oportunidade de atentar as pessoas sobre esta deficiência. “Realmente torço muito para que aumente essa visibilidade das pessoas com nanismo e de quem possui outras deficiências. Sempre quis impor esse respeito, pois vale para todos, até mesmo para quem não é deficiente. Somos seres humanos”, relembrou.
A desconstrução do preconceito vale para todas as esferas do pensamento. A atriz, por exemplo, está solteira, mas garantiu que gostaria muito de ser mãe. Muitas pessoas consideram isto imprudente por acharem que pode ser uma gravidez de risco. “Esta ideia de ter medo de gerar uma criança por riscos é errada, só quem decide se será complicado é Deus. Qualquer mulher pode ter uma gravidez de risco, inclusive uma de estatura normal. É algo comum”, simplificou Juliana Caldas.
Artigos relacionados