Dona de Si! Suzana Pires cria instituto de aceleração de talentos femininos e vende sua coleção de bolsas


“O cinema no Brasil e no mundo é igual. Não ultrapassamos o número de contadoras de histórias e o que pauta o mundo culturalmente é o audiovisual, a literatura, o teatro… Não dá para não estar inserida no meio. O instituto vai acelerar talentos que já existem e não aparecem: diretoras, autoras, câmeras, diretoras de fotografia…”, afirma a escritora e atriz

*Por Karina Kuperman

Ela conquistou seu espaço na profissão com muito esforço, garra, talento e dedicação, mas sabe que nem todas as mulheres têm ou tiveram as mesmas oportunidades. Foi pensando nisso que Suzana Pires teve a ideia de criar o Instituto Dona de Si, que tem como propósito mudar a vida de inúmeras outras mulheres que estejam precisando de apoio para dar um salto na construção de sua carreira. A ideia é estimular, por meio de projetos, o aumento do número de mulheres em cargos nos quais são minoria, como roteiristas, diretoras, investidoras. “Reconheço meus privilégios, venho de classe média, estudei em faculdade particular, fiz cursos de línguas. Não é ter vergonha dos nossos privilégios, e sim vergonha de não reconhecê-los. Se o que eu tive puder reverter para o mundo, vou ser muito feliz”, afirma.

Suzana Pires (Foto: Gustavo Nogueira)

O ano de 2019 é, portanto, voltado a captação de recursos para o instituto. Por isso, Suzana decidiu começar se desfazendo de sua coleção de bolsas Chanel, antes mesmo de contatar possíveis patrocinadores. “Eu li declarações do Karl Lagerfeld (diretor criativo da Chanel, morto no mês passado) se mostrando contra o movimento #MeToo. A falta de posicionamento da marca sobre as palavras de seu diretor criativo me decepcionou bastante e eu vi que aquela coleção de bolsas não me representava, já não tinha mais valor para mim. Comecei a vendê-las para colocar o Instituto de pé, a ‘Bag Me’ me ajudou bastante e falta apenas uma, vendi todas que eu tinha”, conta. “Com o dinheiro arrecadado eu comecei a resolver a parte de planejamento estratégico, papelada, contador, advogado… levantar um instituto tem várias fases. Só agora que tudo está legalizado, eu dei início às reuniões para patrocínio. Os últimos seis meses foram para colocar de pé de forma que eu chegue em uma reunião e o empresário entenda a seriedade da proposta. Duas pessoas trabalham comigo, uma boa equipe, e tenho estrutura, planejamento, papel, tudo”, diz.

(Foto: Gustavo Nogueira)

Suzana Pires (Foto: Gustavo Nogueira)

De fato, a ideia é incrível. “O cinema no Brasil e no mundo é igual. Não ultrapassamos o número de contadoras de histórias e o que pauta o mundo culturalmente é o audiovisual, a literatura, o teatro… Não dá para não estar inserida no meio. O instituto vai acelerar talentos que já existem e não aparecem: diretoras, autoras, câmeras, diretoras de fotografia…”, explica ela, que pretende buscar lugar para essas mulheres no mercado de trabalho. “Existe um grande número de mulheres que são colaboradoras, assistentes, geralmente de um homem. Esse é o lugar mais difícil de passar para a próxima etapa. Gostaria de convocar essas mulheres e acelerar os trabalhos, e, para isso, tenho um projeto de acompanhamento de roteiro, filmagem, workshop de liderança, de autoestima… Tem muito conteúdo para dar como instrumental para a pessoa estar nesse lugar”, garante.

E Suzana tem uma visão otimista de futuro: “Acho que o ritmo vem esquentando. Por um tempo, eu fui a única mulher em todas as equipes de roteiro que escrevi e eu achava que era normal, mas não é. Tem de ter várias outras. E brancas, negras, trans…. De fato, hoje já temos muito mais roteiristas na Globo, por exemplo, mas eu falo do audiovisual como um todo. Não há as mesmas oportunidades. Fui em uma feira vender meu filme (“De perto ela não é normal”, filme derivado da peça que já dura 15 anos) e só tinham três mulheres. Precisamos de força”, analisa.

O pontapé inicial de tudo partiu do convite para assinar uma coluna. “Eu queria escrever sobre mulheres, sobre ganhar dinheiro, empreendedorismo. Falar sobre quanto o mercado profissional é difícil para nós. Comecei em setembro de 2017 e, seis meses depois, a coluna estava conhecida. Criei a hashtag #DonadeSi e começaram os convites para palestras. Fui a Londres como mentora. Tudo andou muito rápido”, lembra. Não à toa, hoje ela tem orgulho de dizer que é reconhecida muito além de sua imagem na televisão. “Antes me chamavam por bordões de personagens, ou até de Suzana mesmo, mas agora me chamam muito de ‘dona de si’”, conta ela, que, em seu e-mail, recebe mensagens, histórias e desabafos de mulheres que se sentem à vontade de dividir inseguranças e conquistas. “Tenho essa demanda porque me abri. Se eu posso ser um norte, que eu seja um belo norte”. Quem duvida?

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