*Por Brunna Condini
Hoje, 1º de Maio, Dia do Trabalhador. De um lado, uma das piores crises da história mundial, causada por um vírus milimétrico, invisível a olho nu e altamente contagioso. De outro, milhares de profissionais de saúde, entre tantos outros, de outras áreas essenciais, que estão na linha de frente, incansáveis, para salvar as vidas das pessoas que contraem o novo Coranavírus. Mais do que um compromisso com a humanidade, neste cenário de pandemia, atuar na frente de saúde, é um compromisso de vocação, daquela que vem do latim, vocatione, do verbo vocare, que é chamar. Exatamente o que estes profissionais estão fazendo agora: atendendo ao chamado irrecusável de amparar os que estão enfermos. E para isso, abrindo mão de suas vidas particulares, de seu convívio familiar e colocando sua saúde à prova. Eles têm sido merecidamente exaltados, porque são os verdadeiros heróis nacionais, que trabalhando longe das situações ideias, seguem com bravura, saindo de casa e não sabendo como, e se vão voltar.
Pensando em homenagear esses profissionais e ouvir as percepções de quem está próximo de quem está no front, convidamos artistas, que falaram com exclusividade ao site HT sobre os seus heróis, com nome e sobrenome, no combate ao Covid-19.
Dira Paes fala com orgulho do sobrinho, Nelson Paes de Lima, médico em Belém do Pará, com apenas 23 anos, que segue firme na linha de combate ao vírus. Além dele, Dira se emociona ao dizer que a irmã, Eneida Paes, mãe de Nelson, também é médica e segue clinicando. “Meu sobrinho é um menino que desde a infância já falava em ser médico. É filho da minha irmã mais velha, que é pneumologista, e que também está no centro da pandemia, se expondo, como o filho”, revela. “Ao mesmo tempo que a gente fica apreensiva em ver pessoas que amamos na linha de frente, é um orgulho, um sentimento que você tem heróis ao seu lado. Me sinto muito segura de tê-los por perto, além de ter uma admiração imensa pela maneira que eles apaixonadamente exercem a profissão”.
Ela reforça a importância do isolamento social para travar a curva de contaminação. “Nós sabemos que o Brasil é um país com uma desigualdade social abissal. Portanto, a necessidade de ficar em casa também tem a ver com a necessidade de comer e de viver. Sabemos que muita gente que mora em comunidades, por exemplo, precisa subir o morro, e descer com compras, lavar o que comprou, lavar as roupas, é uma lida muito dura. Mas temos que insistir no isolamento, porque só isso vai poder salvar muitas vidas. E nós temos que ser cúmplices da vida e não da morte”.
A atriz destaca ainda, a determinação que os profissionais têm para seguir adiante, mesmo no meio de tantas incertezas e adversidades. “Acho que os médicos têm uma força especial, uma força titânica. Como se fossem deuses do olimpo, pessoas com uma força interior muito grande. Mas sobretudo, esse juramento que eles fazem é muito emocionante: é jurar salvar vidas. Tem coisa mais nobre que isso? É muito emocionante neste momento de pandemia tê-los como heróis”, enaltece. E aproveita para enviar um recado carinhoso para o sobrinho e a irmã: “Eneida Paes e Nelson Paes de Lima, vocês são nossos heróis. Agradeço diariamente aos céus o fato de vocês existirem na minha vida e na nossa família, e também na vida de todos os pacientes que passaram nas mãos de vocês, e ainda passarão. Vocês são especiais”.
O Juramento
Veio de Hipócrates – nascido na Grécia, em torno de 460 a.c., considerado ainda hoje o “pai da medicina” – o juramento que todos os médicos entoam com solenidade de sacerdócio em suas formaturas. O doutor Drauzio Varella, em artigo sobre o tema, afirmou que “embora o juramento contenha intenções filosóficas louváveis a respeito da ética no relacionamento com as pessoas que nos procuram em momentos de fragilidade física e psicológica, convenhamos que a visão social do pai da medicina deixava muito a desejar. Ele era médico dos cidadãos gregos e da aristocracia da vizinhança atraída por sua fama merecida; mas se alimentava alguma simpatia pelo contingente de escravos que constituía a maior parte da população da Grécia naquele tempo, soube disfarçá-la em seus escritos”. E Dráuzio acrescentou: “Sem desmerecer o valor científico de Hipócrates, observador de raro talento, que fugiu das explicações religiosas e sobrenaturais, deixou descrições precisas de enfermidades desconhecidas na época e abriu caminho para a medicina baseada em evidências, repetir o juramento escrito por ele sem fazer menção ao papel do médico na preservação da saúde e na prevenção de doenças na comunidade é fazer vistas grossas à responsabilidade social inerente à profissão. O que faz da medicina uma profissão respeitável não são as noites em claro nem o conteúdo do que juramos uma vez na vida, muito menos a aparência sacerdotal, mas o compromisso diário com os doentes que nos procuram e com a promoção de medidas para melhorar a saúde das comunidades em que atuamos”.
O exercício
Para além dos juramentos, o que vemos no cenário desta pandemia em nosso país e mundo afora, é essa responsabilidade inerente à profissão cada vez mais presente na prática destes profissionais. Como precisa ser. Uma responsabilidade que pode, inclusive, chegar com mais pressão do que se esperava. E com uma prioridade clara: salvar vidas em primeiro lugar. A atriz Jacqueline Sato, entende bem esse “chamado”. Sua irmã, a médica Patrícia Sato, de 28 anos, se inscreveu para trabalhar nos hospitais de campanha, em São Paulo. “Ficamos orgulhosos, claro. Rezamos, desejamos boa sorte e mandamos boas energias, para ela e os colegas. Apoiamos minha irmã em sua decisão e vocação. É um misto de sentimentos. Dá orgulho, mas dá medo, e fico grata que ela pode agir, fazer alguma coisa pelas pessoas. Ela está na linha de frente, fazendo uma diferença no sofrimento alheio”, reflete.
Jacque conta que a irmã não relata em pormenores sua rotina, até porque tem sido bem desgastante. “Se estamos emocionalmente sobrecarregados, imagina quem está lá? Somos a rede de apoio dela, imagino que muitas vezes ela não queria falar muito, porque a dor alheia afeta mesmo, não tem jeito. Profissionais da linha de frente, como ela e tantos outros, têm um papel fundamental. Até porque temos um governo que só aumenta nossa sensação de desamparo com suas ações”, diz. E como fica a família sabendo que a Patrícia está lá fora combatendo esse vírus? “Claro, que em primeiro lugar, admirados, orgulhosos, mandando amor e energia para ela. Mas também tem um lado de medo do que virá, mas procuramos deixa-la tranquila, para que faça seu trabalho da melhor forma possível”.
A atriz se comove quando pensa no aumento de casos no país. “Dizem que o pior ainda está por vir. Temos que apoiar estas pessoas que precisam tomar a frente, sair para trabalhar, e ficarmos em casa. Isso não pode ser levado com leviandade”, aponta. “Eu me emociono mesmo. Quero agradecer muito, tanto a minha irmã, que está nesta luta, se expondo, quanto aos outros. Do fundo do meu coração. Agradeço aos outros profissionais essenciais também, os entregadores, funcionários de mercado, da farmácia, que estão fazendo sua parte, para que possamos passar por isso da maneira menos trágica possível. Para mim, esse é o verdadeiro significado de herói: agir de forma que você beneficie o maior número de pessoas possível”.
O exercício da profissão nestes tempos, tem sido um desafio para médicos de todas as idades. Que o diga Apolônio Siqueira, 71 anos, médico e tio de Barbara França. “Ele mora e trabalha em São Lourenço, Sul de Minas, que é onde eu nasci. Minha família por parte de mãe é toda de lá. Ele trabalha no hospital da cidade, em uma clínica, e também atende no SUS”, conta. “Ele é meu segundo pai, tenho orgulho de como ele se dedica a profissão. Meu tio trabalha desde muito cedo, vem de uma família humilde. Ele faz parte das pessoas que estão na linha de frente arriscando suas vidas, porque é preciso. Tem mais de 70, então, claro que fico preocupada, porque ele faz parte do grupo de risco, e se expõe em todas as vezes que vai trabalhar. Mas ele faz isso feliz, porque pode ajudar as pessoas. É uma missão, está fazendo isso para tentar curar, achatar a curva de contágio. Por isso, peço, por favor, para quem puder, que fique em casa. É um vírus perigoso, que se espalha rápido e ainda não sabemos tudo sobre ele, mas sabemos que mata muito”.
Igor Cosso estava no ar em “Salve-se Quem Puder”, que teve as gravações interrompidas por conta da pandemia da Covid-19, e compartilha conosco as impressões das atividades como médico, do melhor amigo, João Gabriel. “Ele tem 29 anos e trabalha no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, na área de gestão, e uma de suas múltiplas funções no momento é o acompanhamento diário de médicos, enfermeiros e funcionários que contraíram o Covid 19, possivelmente dentro do hospital”, detalha Igor. “Sinto uma mistura de respeito, orgulho e preocupação. Respeito porque eu sei que há mais de um mês a vida dele virou apenas o trabalho com a pandemia 24 horas por dia, todos os dias, sem exceção. E ele se entrega totalmente, é um excelente profissional. Orgulho, porque sei que foi por isso que ele quis estudar medicina, um cara que pensa sempre no próximo, as vezes até mais do que nele mesmo. E preocupação, porque sei que ele está em contato direto, todo santo dia, com infectados, então tenho receio pela saúde dele. Mas vai dar tudo certo”.
O que mais admira em profissionais como o João neste momento? “ Que mesmo exauridos emocionalmente, sem se alimentar direito, correndo perigo todos os dias de serem contaminados, eles estão lá. Eu e João estávamos juntos na terça-feira de Carnaval quando foi detectado o primeiro caso em São Paulo, justamente no Einstein, se não me engano. Desde aquele dia, a vida dos profissionais da saúde que trabalham em grandes hospitais como ele, virou do avesso, e o mínimo que podemos fazer para contribuir, é apenas não correr o risco de sair nas ruas e espalhar ainda mais. Essa nossa contribuição é tão pouca perto da deles, mas essencial”.
E o que dizer de uma médica que teve a formatura antecipada para poder atuar na pandemia? Foi isso que aconteceu com a prima do ator Duio Botta, Vanessa Botta, em Ponta Grossa, no Paraná. “Ela teve a formatura online, para estar habilitada a atender os pacientes que necessitam. Fico feliz porque ela está exercendo a profissão que escolheu, mas tenho muito medo por ela estar na linha frente. Imagino a angústia dos meus tios e me solidarizo com eles”, admite o ator, que está no ar na reprise de “Eta Mundo Bom”.
Duio exalta a trajetória de Vanessa, que se prepara para o front. “Me orgulho da coragem, da luta, e da persistência dela, por ter encarado toda essa batalha de estudar e morar longe da família para poder ter uma profissão e vida dignas, neste país tão desigual. Meus tios moram em Toledo, no Paraná e, talvez essa seja a aflição dela e deles por estarem longe uns dos outros”, conta. “Ela se formou na terça-feira e já está na batalha feito uma veterana, para que na semana que vem, quando já estiver com o seu CRM, esteja pronta para ser mais um soldado na zona de guerra contra o coronavírus. Para ela, a luta já começou e as recomendações são as mesmas da Organização Mundial da Saúde: higiene pessoal, evitar aglomerações, usar máscara e quem puder, por favor, fique em casa. Os médicos são os nossos soldados, e temos muito que agradecer a eles, e também a outras frentes, como as pessoas que trabalham na manutenção e limpeza das cidades, serviços essenciais, entregadores, carteiros, caixas e equipes de supermercados. São muitos heróis brasileiros unidos para que a roda gigante que é esse país, não pare de girar”.
O ator e cantor Pedro Miranda, de apenas 13 anos, nascido em Belo Horizonte, Minas Gerais, e atualmente morando em São Paulo com a família, tem lidado com um misto de sentimentos a respeito da atuação da sua mãe, especialista em fisioterapia respiratória, Danielle Miranda. “Eu vejo o trabalho da minha mãe como um ato heróico. Ela sempre foi a minha heroína, mas acho que agora eu a considero muito mais”, diz, Pedro, que participou do The Voice Kids. “Ela está cuidando das pessoas, está deixando de ficar com a gente nesse momento que é tão bom ficar juntinho com a família. Mas, é por uma boa causa”.
Como se sente em relação a isso tudo? “Fico com bastante medo, ainda mais que ela está trabalhando em um hospital, que é o lugar que tem mais risco de pegar essa doença. Mas o que me tranquiliza é que ela está sempre ligando, confortando a gente. Então, enquanto ela estiver fazendo isso, está tudo bem”.
Que recado você gostaria de mandar para a sua mãe e para os outros que estão nesta linha de frente por nós? “Quero agradecer muito, muito mesmo, não só à minha mãe, como a todos os profissionais da saúde, porque eles estão arriscando as suas vidas para cuidar das pessoas que estão com essa doença. E saber que a minha mãe trabalha com uma coisa tão nobre quanto essa, conforta meu coração”.
A cantora Daya Luz, tem dois integrantes da família no exercício da medicina no momento, a cunhada, Priscila Monteiro, e o marido, Lucas Correia. “Eles estão atuando diretamente nos casos. O Lucas foi diagnosticado com o coronavírus há um mês, permaneceu em quarentena em casa, mas teve que ser internado no CTI onde permaneceu por uma semana”, revela Daya. “O sentimento é de apreensão por estarmos expostos, mas sabemos que a nossa função é ajudar quem está passando por todo sofrimento dessa doença. A vida deles é da casa para o hospital e vice-versa, e chegam em casa extremamente cansados, fisicamente e psicologicamente por todo sofrimento que estão presenciando”.O que eles relatam que é mais difícil de presenciar? “O sofrimento das pessoas por terem que ficar isoladas ou com o sentimento de que irão morrer, assim como todo sofrimento dos familiares que também estão perdendo as pessoas que amam”.
E completa: “Queria dizer que eles e todos os profissionais desta área, têm toda a minha gratidão por se arriscarem por todos que estão passando por isso. É uma verdadeira prova, mas acredito que vamos superar. E faço um apelo, para que nós, que estamos com saúde ainda, tenhamos a consciência de nos preservarmos de todas as formas, enquanto temos essa oportunidade”.
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