De volta ao carnaval, Luiza Brunet fala do ativismo em prol do direito das mulheres e diz que aceitaria cargo político


Em entrevista exclusiva, Luiza celebra o retorno à Marquês de Sapucaí em homenagem ao centenário da Portela. Conta ainda como é ser musa de camarote aos 60 anos e do apoio à estreia da filha, Yasmin Brunet, na folia. No nosso bate-papo, ela comenta as críticas ao envelhecimento feminino e objetificação dos corpos, e revela: “Acho que um cargo na política seria muito bem-vindo e me daria mais motivação, responsabilidade e espaço para seguir adiante. Quem sabe no futuro eu seja convidada? Aceitaria de bom grado. A defesa pelos direitos da mulher é uma pauta que abracei para a vida”

*Por Brunna Condini

Luiza Brunet vem investindo em uma versão importante nos últimos anos: a de ativista. Entendendo a ocupação como missão de vida, ela volta ao carnaval carioca, após sete anos de hiato, em homenagem ao centenário da Portela, escola em que foi a madrinha de bateria no posto por mais tempo, ininterruptamente de 1986 a 1994 – além de 15 anos à frente dos ritmistas da Imperatriz Leopoldinense. Mas, Luiza não quer só folia. Também faz questão de continuar levantando a bandeira que abraçou da violência contra a mulher ao topar também ser musa do Camarote Allegria. “O camarote tem parceria com a Portela. Além de poder levantar a bandeira contra o feminicídio, vamos tentar abrir espaço para um bate-papo ali. E também é maravilhoso ser musa aos 60 anos, por que não?”, indagou a musa de muitos carnavais em entrevista exclusiva.

Amo o que faço hoje, é uma missão. Tenho orgulho da mulher que me tornei – Luiza Brunet, ativista e empresária

Nos últimos anos, a empresária vem exercendo a militância em prol dos direitos femininos e contra a violência, desde que ela mesma foi agredida pelo ex-companheiro em 2016, e revela em primeira mão, que aceitaria um cargo político para dar extensão ao trabalho que vem desenvolvendo no Brasil e no exterior. “Ocupo na vida hoje um lugar que nunca imaginei. Tenho feito isso com responsabilidade. Cada vez mais me qualificando e indo a lugares que não imaginei. Meu cast de amigos vem se renovando, muitos deles hoje estão ligados à causa. Então, acho que um cargo seria muito bem-vindo e me daria mais motivação e espaço para seguir adiante. Aceitaria de bom grado. É uma pauta que abracei para a vida”, declara Luiza, que chegou a pensar numa candidatura à deputada federal nas últimas eleições.

Luiza Brunet fala do retorno ao carnaval, com causa, e do desejo de ocupar um cargo público em prol dos direitos das mulheres (Foto: Agnews)

“Faço um trabalho voluntário e nele tive o privilégio de participar do CNJ, sou conselheira da FIESP, do conselho feminino, faço parte do SEBRAE como embaixadora para falar para as mulheres sobre empreendedorismo. Também sou embaixadora e voluntária de uma plataforma americana que se chama Hope & Justice Foundation, pelo combate ao tráfico humano. Muitas brasileiras são traficadas ainda. E tantas outras ações que tenho me envolvido. Esta semana farei palestra sobre empreendedorismo feminino e violência doméstica nas comunidades do Pavão, Pavãozinho e Cantagalo, em Ipanema. Tenho falado pelo Brasil inteiro para mulheres. Transformei a minha vida. Amo o que faço e é uma missão. Tenho orgulho da mulher que me tornei”.

A Glória Maria foi uma mulher que sempre batalhou para conquistar seu espaço, com coragem, como todas nós podemos. Foi fundamental na minha vida, me deu muito apoio emocional quando passei pelo episódio da agressão – Luiza Brunet, ativista e empresária

Luiza volta ao carnaval em centenário da Portela e como musa do Camarote Allegria (Foto: Renato Wrobel)

Luiza também avalia as vivências dos últimos anos: “Nunca pensei que fosse me tornar uma ativista dessa forma. Sou filha de violência doméstica. Quando era modelo sofri muito assédio e sempre me pronunciei, mesmo sem saber naquela época que isso era violência. Me dediquei muito mais ao tema depois da agressão que sofri, da releitura que fiz da minha vida, entendendo a quantidade de violência que sofri desde menina. Uso minha trajetória para dizer às mulheres que existe luz no fim do túnel e que podemos recomeçar sempre. Aprendi que a gente não cresce e nem amadurece, se não houver tropeços. Melhoramos. Mas cada mulher tem uma sofrimento, história diferentes e isso precisa ser cuidado”.

O Brasil assimila mal essa questão do envelhecimento, que deveria ser uma coisa natural. Aceitar o envelhecimento é preciso, ele chega, com o desgaste do corpo, temos é que cuidar para que exista uma saúde de dentro para fora – Luiza Brunet, ativista e empresária

Há pouco tempo, Luiza mencionou que a jornalista Glória Maria, que morreu no dia 2 de fevereiro, a apoiou quando foi agredida e a incentivou a denunciar. Perguntamos a ela o que recorda do período. “A Glória sempre foi uma mulher extremamente inteligente, independente, que fez escolhas certeiras, sabia o que queria, à frente de seu tempo. Uma amiga querida, que conheci desde os anos 80. Quando fui agredida, ela me ligou e me abraçou. Falou coisas importantes. Algumas mulheres me apoiaram e outras, não. Mas o apoio da Glória foi diferente. Foi de uma mulher que sempre lutou, mas nunca se deixou vitimizar por sua história. Uma mulher que sempre batalhou para conquistar seu espaço, com coragem, como todas nós podemos. Ela foi fundamental na minha vida, me deu muito apoio emocional, disse que não seria fácil, mas eu conseguiria e tudo ia passar”.

Filha no samba

Yasmin Brunet também desfila pela primeira vez na Grande Rio este ano. “Eu desfilei grávida da Yasmin. Depois, eu a levava aos ensaios de barracão e à Apoteose. Ela também participou dos ensaios das escolas mirins em que estive, e de lá para cá, passou anos desejando sair em uma escola de samba, como eu. Mas, o medo das críticas, da comparação, foi postergando isso. Só que felizmente, agora, ela teve coragem e aceitou o convite para desfilar como musa da Grande Rio. Yasmin se dedica bastante para fazer o melhor que pode, mas não nasceu no berço do samba, em comunidade, com legado familiar de sambistas, com isso no sangue, no corpo. Então, espero que as pessoas tenham carinho com ela”, analisa.

Yasmin e Luiza Brunet (Foto: Agnews)

“Claro que acho maravilhoso esse movimento de resgate nos últimos anos da priorização da comunidade nos postos principais, é a raiz. Nasci no interior do Mato Grosso, mas vivi no subúrbio do Rio de Janeiro e sei o quanto isso representa na vida das meninas, das jovens. Vivi em comunidade, inclusive, vi isso de perto. Mas existe a troca e acho que o carnaval tem espaço para toda mulher que se dispõe a contribuir para a escola do seu coração ser campeã”, frisa Luiza.

Sem objetificação do corpo e por liberdade

Luiza comenta ainda sobre a liberdade que é confundida com o direito sobre o corpo do outro no carnaval. “A mulher é mais que um corpo. Claro que o carnaval é uma festa que proporciona essa exposição através das fantasias, dos enredos, é esse momento. E por conta dessa exposição, muita gente também se sente autorizada a criticar os corpos das mulheres. E são críticas duras. Como, por exemplo, tenho visto com a Paolla Oliveira, essa mulher linda, maravilhosa, madrinha de bateria da Grande Rio, que samba, tem um corpo espetacular, de verdade, com curvas, celulite, é de uma beleza, doçura, mas existe muita mulher criticando a Paolla. Não sei se isso passa pela inveja, a posição dela. A internet é uma ferramenta espetacular, dá voz  às pessoas, mas também tem muita gente que se expressa de forma equivocada. Tem que ser um lugar de agregar, de denunciar injustiças, trazer boas palavras para um mundo melhor. Com menos amargura e sofrimento”, analisa.

Acrescenta ainda que conhece mulheres que, por conta das críticas da internet, entraram em profundo desespero, tiveram problemas de saúde e foram obrigadas a procurar tratamento médico. “E até casos de algumas que se suicidaram, não souberam lidar com isso. Eu mesma fui criticada quando fiz a denúncia de violência doméstica contra o meu ex-companheiro em 2016. Passei um ano péssima, encontrei doenças que trato até hoje, com remédios diariamente, por conta de me revitimizarem e dos julgamentos. Hoje aprendi a lidar com isso, mas nem todo mundo consegue. Temos que dar menos importância para as críticas e confiar mais em nosso taco”.

Musa em qualquer idade

“O Brasil assimila mal essa questão do envelhecimento, que deveria ser uma coisa natural. Lá fora, na Europa, por exemplo, lidam melhor. Aceitar o envelhecimento é preciso, ele chega, com o desgaste do corpo, temos é que cuidar para que exista uma saúde de dentro para fora. A beleza vai se diluindo, as rugas vão aparecendo, os cabelos brancos, ou seja, é todo um exercício para nos tornamos visíveis aos olhos das outras pessoas ao envelhecer, porque mudamos. É inevitável”, observa Luiza.

“Falo de mulheres como eu, a Madonna que esses dias foi muito criticada pela aparência. Somos rostos conhecidos e infelizmente as pessoas guardam uma imagem da nossa juventude. E quando vamos envelhecendo, vão se surpreendendo com isso, se chocando. Então as críticas são muito fortes. No Brasil, se prioriza muito a juventude, a exposição do corpo, a sensualidade, tem a coisa do clima, como se tivéssemos que ser assim eternamente”.

“Conheço mulheres, que por conta das críticas da internet, entraram em profundo desespero, tiveram problemas de saúde e foram obrigadas a procurar tratamento médico. Eu mesma passei por isso – Luiza Brunet, ativista e empresária

E faz questão de salientar: “Me sinto maravilhosa aos 60 anos. Nunca escondi minha idade e não tenho a menor pretensão de competir com mulheres jovens. Admiro a juventude, o frescor, a pureza, mas admiro também a mulher que amadureceu, conquistou seu lugar, aprendizados ao longo dos anos, à base de sorrisos e lágrimas, porque é assim que é. Sou fã de mulheres como a Fernanda Montenegro, com mais de 90 anos. É uma artista, lê, estuda, viaja, se preocupa com o mundo moderno. Se nós, mulheres, tivermos essa preocupação de nos mantermos com a saúde mental e física em dia, isso nos torna atraentes. É isso que busco para mim, não a irrealidade de uma juventude, mas o exercício desse magnetismo, desse cuidado, e além da beleza, a admiração pelo que somos, nossa história de vida, legado. Isso é o importante para mim”.