Pode até parecer chavão, mas é inegável que, em uma viagem ao México, o visitante se sinta inserido em um universo incomparável de sensações que passam das referências visuais, sonoras e olfativas e acabam invariavelmente na gastronomia. O país é tão folclórico quanto peculiar, e é isso que HT, a convite do IHG InterContinental Hotels Group e da Aeroméxico, percebe após uma semana de viagem que poderia ter se desdobrado tranquilamente em duas ou três, num pestanejar, tal a riqueza de detalhes. De quebra, nota-se o orgulho do povo pela sua terra, apesar da crise econômica, de desventuras políticas e de tantos percalços. Um orgulho de fazer inveja aos brasileiros, já que temos tantas riquezas como eles, mas não sabemos ser ufanistas a não ser na hora de torcer por bola no gol.
Logo de cara, a viagem de cerca de nove horas para a capital mexicana se revela agradável, com a Aeroméxico cumprindo deliciosamente o papel de uma companhia à antiga, daquelas que se encaixam naquela cultura pré-aviação civil movida a preços pseudo-baratos, programação visual moderninha, barrinhas de cereal, lanches com sabor isopor e elenco digno de figurar em um longa do Mazzaropi. Mas, agora, nada disso! A começar pelo conforto dos equipamentos e as refeições bem preparadas – e também pelo estofo da equipe de bordo –, o passageiro evidencia já ao embarcar que a empresa segue o mote daquelas outras dos anos 1960/1970, tipo Braniff e British Caledonian, que primavam pela “nobreza de voar”.
E, pasmem: a bordo, nenhuma daquelas senhoras com cara de vilã de novela da Televisa, com cabelos armados com cimento (ops, laquê!), chemise com camafeu e maquiagem digna de Paola Bracho. Não. É até possível encontrar esses tipos pelos restaurantes da capital, mas eles não predominam sequer nas cabines das aeronaves, revelando que, assim como não se vê baianas com cabeça de abacaxi pelas ruas do Rio, lá a coisa também não é diferente.
Com dois voos diários partindo de São Paulo e quatro vezes por semana do Rio, a Aeroméxico opera com Boeings 777, tem uma boa sala vip e uma primeira classe excelente – a Clase Premier –, dispondo, a partir da Cidade do México, de conexões para o interior do país, América Central, do Norte, Sul, Canadá, Ásia e Europa a preços bastante convidativos, se comparados os valores com serviços. Vale cada centavo, com atendentes de bordo com tanta educação que parecem até treinados pela antológica Dona Alice Editha Klaus, a temida gaúcha de ascendência húngara que comandou com mão de ferro a formação dos comissários da finada Varig por décadas.
Na Cidade do México (Distrito Federal) – mais de 8 milhões de habitantes segundo o censo de 2012 e englobando mais de 20 milhões, considerando os pueblos vizinhos que constituem com ela a Grande Cidade do México – o povo é hospitaleiro e cordial, tanto nas regiões mais populares como em áreas que fogem do amontoado urbano caótico, como oásis chamado Polanco, bairro chique onde estão os hoteis bacanas, finamente arborizado eno qual não se vê bolinha de papel nas calçadas. Equivalente ao Leblon/Ipanema/Lagoa na Cidade Maravilha e aos Jardins em São Paulo.
Bem localizadíssimo nesse recanto, o moderníssimo Hotel Presidente InterContinental Cidade do México garante hospedagem premium. Dos quartos bem decorados à área de convivência, ele impressiona com a vista defronte para o Auditório Nacional – amplo espaço que recebe grandes shows e onde, segundo os mexicanos, Roberto Carlos promove grandes récitas –e Chapultepec (em nahuatl significa “colina do gafanhoto”, inseto-símbolo do país, equivalente ao que seria uma arara ou papagaio no Brasil) – o delicioso parque público que corresponde ao Central Park, centro pulsante da urbe e verdadeiro caleidoscópio daquilo que há de mais característico, que engloba o Jardim Botânico, o zoo e o palácio onde viveram o Imperador Maximiliano (1832-1867), austríaco da dinastia Habsburgo casado com Carlota da Bélgica que teve breve reinado e fim trágico.
A construção de dimensões megalomaníacas foi edificada pelo nobre seguindo padrão de realeza europeia e hoje é o Museu de História Nacional, bem consevadíssimo e contrastando com o clima de quermesse no entorno, com barraquinhas vendendo parafernália de todos os tipos, brinquedos Made in China (sempre eles!), máscaras de lutadores de luta livre – uma instituição local tipo “Mucha Lucha”, o desenho animado do Cartoon Network, vale trazer várias para apimentar os modelitos de carnaval e Halloween, cada uma entre 60 a 100 pesos, inclusive tamanhos infantis – e um sem número de guloseimas irresistíveis, mas capazes de elevar os níveis de glicose e colesterol a patamares jamais imaginados, além de deixar a língua em colorido vibrante.
Diga-se de passagem, para quem não abre mão de emoções fortes, além do chili (o famosíssimo molho de pimenta) e guacamole (o purê de abacate temperadíssimo), uma ótima pedida é encarar uma lucha libre na Arena México e ver “super lutadores” com modelitos kitsch e capas de cetim se digladiando sob as sugestivas alcunhas de El Santo, Huracán Ramirez ou Blue Demon. Há décadas, essa modalidade que mistura espetáculo clown com pancadaria ingênua é a opção para quem pretende imergir na cultura popular local, mas não quer de maneira nenhuma ceder às politicamente incorretas touradas. Aqui, pelo menos, entra no quebra-pau quem quer, sabendo que está na chuva para se molhar.
De quebra, a rapaziada da velhíssima guarda vai se lembrar de onde saíram os célebres telecatchs da televisão brazuca dos anos 1960, Ted Boy Marino à frente muito antes de entrar para a Turma do Didi.
http://www.arenamexico.com.mx
Neste quesito, aliás, os mexicanos podem ser tão folclóricos quanto El Zorro, e duas máximas proferidas aos borbotões chamam atenção desde quando o visitante aterrissa no Aeroporto Internacional Benito Juarez: “Oye, nossa comida não é tão apimentadas assim quanto se fala” e “Nós, os mexicanos, não bebemos tanto assim. Isso é intriga”. Obviamente, o turista se diverte.
Detalhe: Benito Juárez (1806-1871, si habla Be-ní-to Ruárezzzz) é o líder político de ascendência indígena que presidiu o país por cinco mandatos e pôs a nocaute o imperialismo francês na região, com a providencial ajuda dos Estados Unidos, que forneciam armas e não queriam os franceses metendo o bedelho em seus próprios interesses. O advogado nacionalizou os bens do clero, a Igreja ficou possuída e ele é idolatrado no México até hoje como um heroi nacional, mas a índices espetaculares, como se fosse uma celebridade de outrora. Everybody loves Benito e nessa o Brasil também fica atrás, já que Benito de Paula nunca foi revolucionário.
Mas, voltando ao paladar: sim, no México é possível saborear desde a altíssima gastronomia até aquela culinária local que faz a alegria de quem curte cinema e assiste desenho animado – os chapulins,gafanhotos fritos e caramelados não são mito, e as paletas, aqueles picolés avantajados com recheio cremoso são verdadeiro must eat, dando vontade de comprar um isoporzinho e trazer várias delas na bagagem. HT sugere o de morango ou frutas vermelhas com recheio de iogurte. E, óbvio, saborear uns churros pelo roteiro é algo impossível de não acontecer. Sim, até o “podrão” dos ambulantes faz qualquer um lamber os beiços por lá.
Os restaurantes no distrito federal são espetáculo à parte, e isso inclui um delicioso passeio pelo bairro de San Angel, antiquíssimo e de arquitetura colonial, um primor! Os inúmeros cafés nas imediações, vários construídos em pátios de antigas vilas, garantem literalmente a diversão, com comida trivial e dançarinos de roupas justas ou saias rodadas fazendo a alegria dos turistas.
E, claro, o artesanato local é algo a considerar, tanto na pracinha central, quanto nas imediações. Dica: as barracas dali são bacanérrimas, incluindo música ao vivo e opções de quitutes locais (os temperos e cafés são um charme à parte), mas vale dar um rolé e se afastar um pouco para averiguar achados imperdíveis nas tendas montadas nas proximidades, com aglomerado de bancas, e até averiguar preços nas tiendas e galerias de arte no entorno. Super valem: as bijoux no estilo indígena, as semi joias, as batas e vestidos bordados com jeitinho de peça encontrada na Farm, sabonetes artesanais, itens de decoração, mantas e xales, toalhas e caminhos de mesa, os chapeus. Regalos para todos, com visual de impressionar e precitos do tipo: “El jefe se volvió loco!” (o patrão ficou maluco!).
Fotos: Lucia Furlan e Alexandre Schnabl
E, para quem flerta com o étnico, como não encher a mala com máscaras decorativas (atenção especial para as cabeças de jaguar, cobra e águia, a santíssima trindade dos animais que dominam o folclore local), assim como as cruzes e objetos em ladrilho vitrificado? E os calangos em louça branca e azul fariam a alegria de qualquer Sig Bergamin e poderiam estar à venda na ala de decoração da Le Lis Blanc a preços bem mais caros.
Fotos: Lucia Furlan e Alexandre Schnabl
Mas, aviso aos Sargentos García de primeira viagem: é melhor comprar os indefectíveis sombreros em mercadões populares em cidades do interior ou nas imediações do Teotihuacan, zona arqueológica a cerca de uma hora e meia da capital, com suas pirâmides impressionantes e centro de uma civilização mesoamericana pré-colombiana, não se sabe se foram os náuatles, otomis ou totonacas. Mais barato arrematar um sombrero por por lá. As opções são tão divertidas quanto as da capital, mas, por incrível que pareça – para quem não tem tempo de circular pelo interior do México – ali é mais em conta.E, convenhamos: ir ao México e não trazer um chapeu desses que combine com a cor de sua sala é o mesmo que ir a a Istambul e não arrematar um narguilê.
Fotos: Lucia Furlan e Alexandre Schnabl
E, claro, mesmo que o turista não curta heavy metal, é impossível não se deliciar com as abravanadíssimas caveiras de cerâmica e aquelas esculturas decorativas em papier maché, sobretudo as famosas damas Belle Époque com rosto de crânio e penteado de Sarah Bernhardt, aptas para figurar em uma produção de Tim Burton. Elas são as Catrinas, nome que se dá à entidade asteca que faz o elo entre a vida e a morte, que nada tem de tenebrosa.
Bem, é que os mexicanos, como se sabe, têm uma relação diferente com a morte e La Catrina é motivo de alegria, pois ela é responsável pelas boas lembranças trazidas pelos entes queridos. Daí aquela explosão de cor no dia de finados, aquela espécie de carnaval conhecido com El Día de los Muertos, que a gente vê nos filmes. Alô, alô, Robert Rodriguez!
Após o passeio, a boa é dar um chega até o San Angel Inn, o restaurante que hoje ocupa um antigo convento, com decoração que faz lembrar aquelas estâncias de filmes de época. A impressão que se tem é que a qualquer momento o visitante vai esbarrar com algum Don Pepe, Don Manolo ou Don Juanito. A comida mexicana com toques internacionais tem destaque, a supremacia são os grelhados e os highlights incluem a Barbacoa – ovelha cozida por três a cinco horas em um buraco na terra, coberta de folhas, parecida com aqueles churrascos do Sul do Brasil, mas com temperos típicos –, a Arrochera (tiras de rês macia), o robalo à moda de Vera Cruz e o ceviche de Acapulco, mas quem encerrar a Festa de Babette sem encarar o creme bávaro com morangos desconhece o savoir vivre local. Dos deuses!
Mas, se o turista não for exatamente o tipo aventureiro e preferir fazer as refeições no InterContinental Presidente, HT vai logo avisando: é bom se preparar porque a dieta na volta será inevitável. Com opções variadas, o hotel consegue a façanha de tornar seus restaurantes casas da moda na cidade, onde os moradores bem-nascidos, globettotters em trânsito, executivos, tycoons, estrelas da televisão e celebridades de todos os tipos são habituês.
O lugar é um point, desde a filial do italianíssimo Alfredo Di Roma até o Palm, novaiorquinérrimo, com cortes de carnes e aquela levada cosmopolita, passando pelo Balmoral, pérola encravada no meio de um lobby secundário, misto de casa de chá com local perfeito para aquele café da manhã diferenciado, bem britânico, com aquele ar de que a Mary Poppins pode surgir a qualquer momento com uma blackcurrant pie, caso a petizada tenha feito o dever de casa. Logo em frente, o Epicentro Mixology Bar é local perfeito para a happy hour, com chill out regado a gins e genebras.
Nesse jardim das delícias, sobressaem o Au Pied de Cochon, um refinadíssimo francês que é o suprassumo do complexo, com cozinha comandada por Frédéric Lobjois, parisiense há 15 anos no país. A saladinha de endívias com peras e maçãs é ideal para abrir o apetite e encarar o confit de pato com purê de papas fritas e legumes. E a assiette com pot-pourri de várias sobremesas é de cair o queixo.
Mas a coisa não para por aí: O Zheng Shangai oferece a autêntica cozinha cantonesa amplificada por um olhar cosmopolita e o novíssimo Chapulín atualiza a atmosfera local para um padrão digno de Casa Cor e, além da gastronomia, impressiona a carta de Mezcal, destilado à base do sumo fermentado do agave, mais rústico que a tequila e o típico goró deles, equivalente à nossa xiboquinha.
Com um detalhe: algumas marcas introduzem na garrafa a larva da borboleta chamada gusano, que se desenvolve em meio às plantações de agave, determinando o teor alcoólico da bebida, já que, abaixo dele, ela se desintegra. E mais: segundo a cultura local, quem ingerir a última dose necessariamente tem que comer o inseto. Oyeeee!
Para fechar, dois programas irrecusáveis: a Catedral Metropolitana da Cidade do México, na Praça da Constituição ou Zócalo, monumento barroco que levou séculos de edificação (de 1573 a 1813) e que tem a versão modernista ao lado, tão imponente quanto, mas muito mais fria. A primeira, construída por Hernán Cortés sobre os escombros do templo asteca da antiga cidade pré-colombiana de Tenochtitlán, impressiona e um programinha imprescindível é comprar uma vela na lojinha e rezar (sério!) para Nossa Senhora de Guadalupe, enquanto os mariachis tocam e cantam ao fundo. A imagem que vem à cabeça é que Antonio Banderas , saído diretamente de “A balada do pistoleiro” (Desperado, de Robert Rodriguez, Columbia Pictures, 1995), vai surgir da multidão iniciando uma pancadaria. Mas, como isso não vem, melhor se dedicar à reza forte e pedir uma benção à padroeira do México.
E depois, subir a bela escadaria em direção ao convento, enquanto os músicos tocam em seus degraus, para tomar uma paleta mexicana na lojinha do topo e ter a privilegiada visão da vista. Indescritível.
Para fechar, nada como reservar uma tarde para visitar o hoje Museu Frida Kahlo, instituído na casa onde a artista morou com o muralista Diego Rivera. Inevitável a comparação com La Majorelle e seus jardins, a casa de veraneio de Yves-Saint Laurent e Pierre Berger em Marrakesh. Um mergulho na arte e no tempo, com os ambientes ainda decorados com os objetos e mobiliário do casal, espécie de casinha de bonecas em tamanho real repleta de memorabilia. Depois dessa viagem, já dá até para voltar de viagem com a alma renovada.
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