Com a palavra, os veteranos! Luciana Braga analisa ausência da TV, mercado excludente e falta de equilíbrio nos elencos


Em nossa nova série ‘Que saudade de você na TV’, trazemos o protagonismo do veteranos para o debate da ausência de nomes mais experientes em posições de destaque no audiovisual. Nossa primeira convidada é a atriz Luciana Braga, que participou da primeira versão de “Renascer” e viu agora a audiência subir com a entrada de Malu Mader no elenco da nova versão em cartaz. “Deixo aqui a impressão que o mercado para atores e atrizes hoje, está bastante confuso. Precisamos de uma boa ‘faxina’ para entendermos como a coisa pode ficar boa para todo mundo”, afirma. Luciana tem rodado o país há dois anos com o espetáculo ‘Judy – o arco-íris é aqui’,e pôde ser vista pela última vez na TV aberta em uma participação no remake da novela ‘Éramos Seis, em 2020. E é enfática: “Não faço mais novela por falta de convite. Acho que estou naquela idade complicada para fazer novela, porque as mulheres vão sumindo à medida que vão envelhecendo. É como se a vida delas fosse perdendo sentido para as tramas”

*Por Brunna Condini

Não é de hoje que estamos sentindo a falta de mais veteranos na TV. É preciso que as emissoras comecem a repensar a escalação das suas produções. O público deseja se ver representado, e esse mesmo público também vê o passar dos anos. Sem falar, que as tramas deveriam abrigar a diversidade de narrativas e de existências de forma mais ampla. É preciso dar oportunidades aos veteranos, seja na dramaturgia, seja na vastidão de cargos que compõem o quadro de funcionamento da televisão brasileira, como nas áreas do jornalismo e do entretenimento. A experiência e o conhecimento precisam ser valorizados. Pensando nisso, trazemos o protagonismo para quem construiu uma jornada com dedicação até aqui, em nossa nova série ‘Que saudade de você na TV’. Nossa primeira convidada é Luciana Braga, 61 anos, que completa 40 anos de carreira em 2025.

A atriz que esteve na primeira versão de ‘Renascer’, em 1993, como Sandra, comenta, a nosso pedido, o retorno de Malu Mader à TV após seis anos, fazendo o que de início seria uma participação de poucos capítulos no remake da trama, estendido por conta do impacto positivo no público e na audiência. “Tenho a impressão de que o público realmente sente falta de ver atrizes e atores mais experientes em cena. Acho que é interessante contarmos histórias de mulheres mais velhas. Parece que não acontece mais nada na vida da gente, mas acontece. E muito na minha vida, que é bem ajustada e movimentada, assim como acredito que seja a da Malu. Acho que deveria se escrever mais para veteranos”, diz Luciana, vista pela última vez na TV em uma participação do remake de ‘Éramos Seis‘ em 2020, e fala sobre sua ausência da televisão:

Não faço mais novela por falta de convite. Acho que estou naquela idade complicada para fazer novela, porque as mulheres vão sumindo à medida que vão envelhecendo, é como se a vida delas fosse perdendo sentido para as tramas – Luciana Braga

Luciana Braga fala sobre ausência da TV, sobre falta de interesse em veteranos, analisa o mercado e revela curiosidade de 'Renascer' (Divulgação)

Luciana Braga fala sobre ausência da TV, sobre falta de interesse em veteranos, analisa o mercado e revela curiosidade de ‘Renascer’ (Divulgação)

Ainda sobre o sucesso da participação de Malu Mader em ‘Renascer‘, Luciana acrescenta: “Malu fez tanta coisa, tantos trabalhos na televisão, e aí eu acho que tem uma festa em torno da volta dela, uma festa merecida. Quando comecei na TV, existiam muitos veteranos nas novelas que eu fazia, sabe? Me lembro, por exemplo, em ‘Tieta’(1989). Nossa, tinha um monte de atores das mais variadas idades. Grandes personagens. Eu lamento um pouco que não tenha maior presença hoje. Espero que isso seja circunstancial e que as coisas comecem a se equilibrar, porque já foi melhor. Não sei se me engano, mas eu tenho a impressão de que já foi melhor”.

Luciana Braga e Ary Fontoura em cena da novela 'Tieta', em 1989 (Acervo/Globo)

Luciana Braga e Ary Fontoura em cena da novela ‘Tieta’, em 1989 (Acervo/Globo)

O etarismo estaria mais escancarado hoje, por isso falamos mais sobre o tema? “Acho que tudo está mais escancarado, o machismo, o feminismo, o etarismo. As pessoas têm refletido mais sobre as circunstâncias sociais que nos envolvem, e as redes sociais foram muito legais para isso, tem muita informação hoje que não chegava para muita gente. Acho que as pessoas estão refletindo mais sobre como vivem, e não vivendo tanto no piloto automático. Mas atualmente tenho sentido na minha vida profissional mais esse tipo de preconceito. Mesmo no streaming, que trabalhei até dois anos atrás (ela fez em 2022 a série ‘De volta aos 15‘, na Netflix), já são personagens meio periféricos, sempre fazendo a mãe…então existe essa coisa do etarismo”. E faz questão de frisar:

Parece que não temos histórias para contar, mas homens e mulheres que já passaram de uma certa idade têm muitas narrativas interessantes. Esse preconceito com a idade é algo da nossa sociedade, mas que já vem sendo lindamente questionado – Luciana Braga

E acrescenta: “Envelhecer em nossa sociedade não é fácil. A juventude é super valorizada. Depois de uma certa idade, vão botando as pessoas meio para escanteio. Mas a minha saúde mental não depende de eu estar sob os holofotes. Faço a minha vida interessante, independente disso. Movimento-a, estudo, viajo, me formei na faculdade há poucos anos atrás, estou querendo fazer uma pós agora. Ou seja, tem muita coisa legal ainda para fazer na vida. Cuido da minha autoestima assim, fazendo o que me interessa, fazendo a minha existência interessante”.

Mercado

A entrada dos streamings no mercado está melhorando, expandindo as oportunidades de fato, percebe isso? “Achamos, um pouco ingenuamente, que isso ia ser incrível para o mercado, mas na verdade teve um achatamento salarial enorme e problemas de direitos autorais que estão acontecendo. Com as plataformas, realmente vem existindo uma expansão no tipo de trabalho que é feito, para além de novelas, um outro tipo de dramaturgia que não tínhamos muito no Brasil e que, de uns anos para cá, explodiu nesse aspecto. Por outro lado, é preciso que se reveja toda uma legislação em torno dessa coisa dos streamings. Se, por um lado, ampliamos um pouco o mercado de trabalho, por outro, está acontecendo um achatamento também da profissão. Principalmente agora, com o chegada da inteligência artificial. Tudo isso é uma questão bastante profunda, precisa de um debate enorme”.

Deixo aqui a impressão que o mercado para atores e atrizes hoje, está bastante confuso. Precisamos de uma boa ‘faxina’ para entendermos como a coisa pode ficar boa para todo mundo. Estou um pouco afastada desse mercado de audiovisual e trabalhando mesmo, ultimamente, no teatro – Luciana Braga

No teatro

A atriz está há dois anos em cartaz com o espetáculo ‘Judy – o arco-íris é aqui‘, com texto e direção de Flavio Marinho, e diz que em breve vai anunciar a última temporada da premiada produção, em que dá vida à Judy Garland (1922-1969),  misturando sua própria história à da estrela norte-americana, jogando luz sobre as lutas internas e externas que o artista até hoje enfrenta. “Devemos encerrar esse trabalho com uma temporadinha aqui no Rio de Janeiro no final do ano. Essa peça dá muita alegria. Estou cantando, né? Exercitando uma coisa que ficou ali de ladinho por muitos anos na minha vida, é um espetáculo delicioso, que o público adora”.

Luciana Braga é Judy Garland em espetáculo que faz há dois anos (Divulgação)

Luciana Braga é Judy Garland em espetáculo que faz há dois anos (Divulgação)