Cícero para HT: “gostaria que todo mundo tomasse conhecimento das minhas músicas, mas tenho uma timidez que me atrapalha”

*Com Lucas Rezende

Faz mais de um ano desde que o músico Cícero bateu o último papo com HT. À época, ele estava lançando “Sábado”, seu segundo trabalho, e bateu na tecla de que ser famoso não fazia a sua cabeça, a começar pelo fato dele não agir como tal. “Não gosto nada daquilo que a fama traz. Sou apenas um compositor”, tratou logo de avisar.

Capa de “A Praia”, terceiro disco de Cícero

Pois agora, lançando seu terceiro álbum, “A Praia”, ele continua com o mesmo pensamento, só que um pouco menos incisivo. “Gostaria que todo mundo tomasse conhecimento das minhas músicas. Mas, por outro lado, tenho uma timidez que me atrapalha. Venho criando uma terceira via que concilie medo e desejo”, disse o artista que conta com mais de 130 mil curtidas em sua fanpage no Facebook e shows esgotados por onde passa. Ah, e o disco pode ser baixado, gratuitamente, na página do músico.

Cícero lança disco novo e conversa com o site HT (Foto; Eduardo Magalhães)

Com 28 anos, Cícero é um dos nomes mais interessantes que representa a nova MPB. Diferentemente do último trabalho, agora o compositor fez tudo na Terra da Garoa, e, longe da praia, ele percebeu que aquele marzão da urbe-maravilha lhe faz falta, sim, e este acabou até virando inspiração. Aos fatos!

HT: Seus dois primeiros discos, “Canções de Apartamento” e “Sábado”, foram produzidos num “estúdio caseiro”, de forma independente e autoral. Como foi a produção do novo disco “A Praia”? Ele caminha para um lado diferente?

Cícero: Sim. Gravei “A Praia” em estúdio, com técnicos e uma produção mais “formal” por conta de instrumentos como violino, flugel, trompete, piano, que são complicados de gravar em casa sem uma acústica tratada e alguns cuidados. Não queria usar instrumentos digitais e que o disco ficasse sem esses arranjos, então fui para o estúdio.

HT Em uma entrevista você destacou o “azul-final-da-tarde” como inspiração nas suas composições. Em “A Praia”, quais influências você destacaria? O que te inspirou?

C: O fato de eu ter me mudado pra São Paulo. A distância em si. Nunca fui ligado ao mar, nunca dei bola, mas o fato de estar longe dele e ver como ele se relaciona com o temperamento das pessoas, com a noção de tempo, essas coisas me instigaram. A inspiração veio mais da falta do que da presença do mar, mas veio do mar.

HT: E assim como os primeiros álbuns, o terceiro também foi disponibilizado para download gratuito na internet. Qual foi a importância da internet para você?

C: Total. Comecei e estou basicamente na internet; é através dela que venho me movimentando. É mais do que uma ferramenta, é a realidade dos dias de hoje, eu acho.

HT: Você gostaria de alcançar esses veículos de massa ou não tem essa ganância? Prefere seu som caminhando por outra verve… 

C: Gostaria que todo mundo tomasse conhecimento das minhas músicas e não quero excluir nenhum tipo de público. Mas, por outro lado, tenho uma timidez que me atrapalha quando estou na frente de muita gente, quando tenho que me expressar em público. Então venho criando uma terceira via que concilie o medo e o desejo. Resumindo, quero que meu som continue caminhando, pode ser por qualquer caminho, desde que eu saiba caminhar nele.

HT: Qual a maior dificuldade de se fazer música no Brasil hoje em dia? Aquilo que às vezes desanima de continuar…

C: Putz! São tantas chateações. Mas não tenho mais grilo com isso não, nos últimos anos eu vim entendendo muita coisa. Tudo faz parte…

HT: Artistas contemporâneos brasileiros estão cada vez mais próximos de Portugal. Em 2013, você, Wado e Momo, junto a quatro músicos portugueses, Diego Armes, Fred Ferreira, Alexandre Bernardo e Bernardo Barata formaram “O Clube” e lançaram uma coletânea. Inclusive, Fred Ferreira em parceria com o casal Mallu Magalhães e Marcelo Camelo lançaram em agosto do ano passado o álbum de estreia da Banda do Mar. Como é essa relação com o público português?

C: Sou apaixonado por Portugal. Fui algumas vezes e em várias cidades divulgar “Sábado” e muito do astral de “A praia” eu encontrei lá. É um país que admira a gente, acompanha nossa música, nossa dramaturgia, nossa evolução como nação, sempre com um olhar profundo e sensível sobre tudo isso.

HT: Quem são seus ídolos musicais, que te inspiram? Aliás, me conta um pouco como começou a cantar profissionalmente, a ganhar dinheiro com isso?

C: Musicalmente eu tenho tantos ídolos que não dá pra falar de um só. Comecei a cantar obrigado pelas circunstâncias. Montei uma banda de rock no segundo grau e todo mundo cantava mal, inclusive eu, mas gostávamos de Pixies e Sonic Youth, então não ligávamos. Era até mais legal. O tempo foi passando, os interesses musicais foram mudando, a banda acabou, a coisa toda começou a se profissionalizar e virar trabalho para outras pessoas também. Hoje em dia eu já trato o cantar com mais formalidade e respeito pelo ofício. Posso dizer que comecei a me profissionalizar a partir do “Canções de Apartamento”, em 2011.

HT: Chamou nossa atenção, no CD novo, da penúltima música, com a Luísa Mayall. Como surgiu essa parceria?

Nos conhecemos no Rio de Janeiro, ambos morávamos em Botafogo. Ela tocava percussão numa banda, eu tinha acabado de lançar o “Canções”, tocamos juntos algumas vezes, ficamos amigos. Eu adoro ela. Faz tudo com concentração embora viva no mundo da lua que nem eu. Fez circo, teatro, canta, dança, toca pandeiro… faz tudo bem.