Bruno Ahmed, da série Reis, sobre o vício em apps: ‘Qual é a cultura que tem isso? Fazer dancinha e ser famoso?’


O ator e produtor chama atenção para o excesso de tempo que as pessoas permanecem online, mostrando tudo o tempo inteiro. “Às vezes, nem estão felizes, mas têm que mostrar que estão, porque outros querem comprar essa ideia. Quando eu era criança não tinha esse excesso de ter que filmar e fotografar tudo. Agora, estão falando de metaverso. Imagina, se encontrar no metaverso. Estou um pouco assustado. Gosto do contato pessoal. E fazer conteúdo sem conteúdo com a falsa ilusão de que pode ganhar muito dinheiro viralizando com cenas tolas, é esquisito, não é a minha onda, não é esse Bruno Ahmed que eu quero ser”, frisa ele que, recentemente, produziu e atuou na remontagem do espetáculo “A História é Uma Istória”

* Por Carlos Lima Costa

Ao refletir sobre o tempo que todos dedicam no dia a dia fazendo postagens até mesmo de fatos corriqueiros e banais para alimentar as redes sociais e ganhar likes dos seguidores, mostrando até inverdades e deixando de lidar com as pessoas frente à frente, o ator Bruno Ahmed, conhecido por novelas como Em Família, Boogie Oogie, Rebelde e Gênesis, e que, recentemente, interpretou o príncipe filisteu Alemér, na série Reis, da Record, tem repensado a relação com as redes sociais e diminuindo a quantidade de postagens, como muitos podem estar fazendo.

“Você acaba ocupando muito do seu tempo. Em vez de comer, está tirando foto do prato e aí quando vê a comida já está fria. A gente já fica muito tempo online com pessoas mandando mensagens e mostrando tudo o tempo inteiro. Às vezes, nem estão felizes, mas têm que mostrar que estão, porque outros querem comprar essa ideia. É meio doido isso. Criou-se um mundo artificial nas redes sociais. As pessoas estão caminhando para conversar online, do que estar na sala conversando. Então, é melhor dar uma segurada. Quando eu era criança não tinha nada disso, esse excesso de ter que filmar e fotografar tudo. Agora, estão falando de metaverso. Imagina, olha isso, encontrar no metaverso. Estou um pouco assustado. Eu gosto do contato pessoal, de me reunir com as pessoas”, enfatiza.

Bruno Ahmed, da série Reis, reflete sobre excesso de uso das redes sociais (Foto- Anderson Marques)

Ele sabe que hoje em dia uma vídeo chamada facilita a vida, mas questiona: “E aí, vamos fazer somente teatro online? E fazer conteúdo sem conteúdo com essa falsa ilusão de que pode ganhar muito dinheiro só fazendo vídeo, viralizando com cenas tolas, bobas? Mas qual é a cultura que tem isso, ficar fazendo só dancinha, e aí ficar famoso e vão pagar para divulgar não sei o que. É esquisito. Isso não é a minha onda, não é esse Bruno Ahmed que eu quero ser. Posso ficar rico, virar um grande youtuber e depois produzir as minhas peças, mas me tornando um cara sem conteúdo. Hoje, não me orgulharia. Estou com 30 anos, buscando o equilíbrio. Eu gosto de atuar, elaborar um projeto, produzir, cuidar da contabilidade da minha empresa”, pontua.

Bruno lembra que viu uma matéria dizendo que o Tik Tok é pautado para viciar as pessoas, que a sensação que ele passa é de dopamina. “Os jovens sentem esse prazer e cada vez mais buscam isso. Por isso acabam aumentando o tempo nessa rede social. Pra mim, hoje, as nossas redes sociais são ferramentas de trabalho e de diversão, mas achar um equilíbrio é importante para não cair no exagero”, acrescenta ele, que desde 2015, realiza projetos através de sua produtora, a B&A.

Em agosto, Bruno retorna aos palcos com a peça A História é Uma Istória (Foto- Anderson Marques)

No momento, está envolvido com o espetáculo A História é Uma Istória, de Millôr Fernandes (1923-2012), dirigida por Ernesto Piccolo, que teve uma primeira temporada, em maio, no Sesc Tijuca, e que vai retornar na Sala Mário Tavares, do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, de 12 a 27 de agosto, às sextas e sábados. “Somos três atores e cada um faz vários personagens da história mundial. Abordamos desde a criação do mundo até a idade contemporânea, representando personagens históricas, relembrando frases históricas. É uma grande brincadeira e crítica, com grande sarcasmo”, explica ele sobre o texto encenado pela primeira vez em 1976. No palco, Bruno interpreta nomes como o imperador francês Napoleão Bonaparte  (1769-1821), o 16º presidente dos Estados Unidos Abraham Lincoln (1809-1865), o estadista britânico Winston Churchill (1874-1965) e a monarca do Reino Unido Elizabeth II.

“O texto do Millôr já crítica os políticos, fala da corrupção, brinca, coloca todos em um saco só e a gente dá uma brincada com o momento que estamos vivendo. Não levantamos uma bandeira, mas tacamos a pedra em todo mundo”, ressalta. E acrescenta: “Política me interessa, eu acompanho, mas não sou de abordar esse tema, por exemplo, em rede social. Agora, espero que o novo presidente, em 2023, tenha um olhar mais humano e cultural. Como produtor, criador, eu sinto que de fato, sofremos muito com certo descaso, principalmente do governo federal. Independentemente de quem entrar, por exemplo, a lei federal de incentivo à cultura existe há mais de 30 anos, então, que seja respeitada, mantida. A lei não dá dinheiro para ninguém produzir, ela te permite captar através de um benefício fiscal. Essa informação poderia ser melhor transmitida e não ficar brigando sobre quem pegou dinheiro da lei. Agora, é fato, não existe educação sem cultura. Pesquisas comprovam que a criança aprende mais quando tem acesso a cultura, sabe, a livros de história, filmes, peças.”

Bruno tem uma produtora e um dos pilares de seu trabalho é a inclusão social (Foto- Anderson Marques)

Em sua produtora, inclusive, Bruno faz um trabalho pautado em quatro pilares: educação, sustentabilidade, democratização da cultura e inclusão social. “Esta última, por exemplo, vem de oferecer vagas para atores deficientes, que não vão fazer deficientes. Tem ainda a questão da formação, com cursos, palestras para jovens de escolas que queiram entender mais sobre produzir cultura, ter formação de produtores ou oferecer cursos com atores negros que não tem a oportunidade de trabalhos. No espetáculo atual, por exemplo, fazemos as apresentações com um intérprete de libras, para que exista a democratização do acesso a cultura”, conta.

Em seu mais recente trabalho na TV, a série Reis, seu personagem era mulherengo, tinha duas esposas. “É um machismo criado pelo homem. A gente até fala disso no espetáculo. Os árabes, criaram a poligamia, mas a proporção de que era um homem para dez mulheres. A poligamia era sempre do homem. O homem pode, a mulher, não. É algo cultural deles, mas ultrapassado. Hoje em dia, isso deve ficar a critério de cada pessoa, de cada relação. Se existe um respeito, um acordo e as pessoas estiverem felizes, ok. Isso é de cada casal. Mas não acho que deva acontecer por ser algo obrigatório de que o homem pode ter dez mulheres. Agora, existem relacionamento aberto, trisal. Eu acho muito doido isso. Não consigo me imaginar com tantos relacionamentos simultâneos. Nunca nem namorei duas mulheres ao mesmo tempo, nem tenho relação aberta. Não sei se conseguiria lidar com isso”, frisa Bruno, casado com a enfermeira obstetra Tatiane Frois, mãe de sua filha, Maitê, de 2 anos.