*Com Vítor Antunes
Um furacão. A passagem de Madonna pelo Rio foi algo meteórico, transcendental. Além de grande repercussão e foco na cidade e de continuar reiterando o grande potencial para realizar eventos portentosos como o show da diva no qual foram contabilizadas 1,6 milhão de pessoas na Praia de Copacabana. A presença da Material Girl também revelou para o mundo dois talentos na realização de imagens: o fotógrafo Ari Kaye e o expert em vídeos aéreos, o droneiro Ricardo Cyrillo. Ambos já consagrados em seus fazeres artísticos no Brasil são parceiros na captação de imagem, especialmente as relacionadas com as belezas naturais do Rio de Janeiro. E as imagens da montagem do pré-evento e do grande show de Madonna foram registradas pelos feras das lentes. Madonna chegou a postar um dos vídeos no feed do Instagram e televisões e redes sociais do mundo.
O lado agridoce da questão deveu-se ao fato de um vídeo postado pela dupla com as imagens aéreas da mega montagem do super palco para o show do último sábado – o que levou quase um mês de planejamento da ação da dupla – e registros do espetáculo da Rainha do pop que acabaram por ganhar o mundo e pelos quais os profissionais não foram creditados. “Fizemos um registro focado em mostrar a evolução da montagem do evento. Ninguém tinha esse material específico. No dia do show fomos com sangue no olho, focados em viralizar mesmo. Tanto que já havia, inclusive, fãs que estavam esperando por esse material. Quando subimos o post antes do show, ele explodiu. Em 10 minutos, alcançamos 1 milhão de visualizações. E conseguimos produzir com alta qualidade as cenas. O material, porém, foi republicado por vários perfis nas redes sociais, incluindo de veículos de comunicação, sem ganharmos nenhum crédito”, lamenta a dupla.
Não é possível mensurar o alcance que estes vídeos tiveram, mas só nas plataformas de Madonna rendeu quase 45 mil comentários. “Há os direitos de imagem. O ideal seria colocar marca d’água, mas isso estraga o vídeo. Postamos automaticamente e estava escrito que o crédito deveria ser dado. Há pessoas que não têm o entendimento dessa questão e postam sem dar crédito, mas há quem faça de má-fé. Quando o material chega em algo da grandiosidade da rede social da Madonna a gente perde o controle”, disse Ricardo. Ari acrescenta: “É uma sensação de impotência. O mínimo que tem que haver é o respeito como uma artista como ela, o que exige mais sensibilidade aos profissionais”.
As imagens foram feitas por nós, não nasceram espontaneamente – Ricardo Cyrillo
Traduzir em imagens aéreas um evento como o de sábado, em Copacabana, no qual Madonna encerrou The Celebration Tour, em comemoração aos 40 anos de carreira, Ari conta tratar-se de “uma trajetória de muito trabalho. Não é só voar [com os drones] no show da Madonna. Um evento assim traz no céu também helicópteros e outros drones, além de um sinal ruim para controle deles. Isso nos exigiu maior atenção, já que o espaço aéreo estava bem carregado e até com pessoas tentando derrubar drones”. Cyrillo ratifica que a dupla pensou em todos os pontos importantes. Não só do zelo com o conteúdo, mas também o cuidado com o público presente.
LENTES DA ALMA
Reza que os olhos são espelhos da alma. Mas e os olhos que observam lentes? Seriam camadas que se sobrepõem às camadas de espelhos e de sensibilidades da alma? Como congelar aquela fração do tempo para a eternidade em um show que já tinha em si a chancela de ser singular? Através do amor e da dedicação, sem dúvida. “Recebemos muitas mensagens das pessoas. O nosso nome está repercutindo, tanto que não conseguimos responder a todos ainda”, diz Ricardo Cyrillo. Ele, que também é chef de cuisine e foi convidado para estar à frente de uma grande rede de restaurantes, optou pela arte da fotografia e se consagrar como expert em capturar imagens com drone.
Já Ari Kaye, carioca, começou com a paixão em ektachrome desde a infância. Sua família é composta por grandes nomes da fotografia. Seu pai, Ari Gomes é consagrado na profissão. Ari Gomes aprendeu a arte com o pai, o famoso fotógrafo de esportes dos anos 40 e 50, Ângelo Gomes, sobrinho de Sérgio e o irmão Paulo – todos com passagens pelo Jornal dos Sports. Ari Gomes foi repórter-fotográfico do Jornal do Brasil por 25 anos (com quem eu, Heloisa Tolipan, tive o prazer de trabalhar) e também assinou diversas coberturas para a revista Placar. Durante esse período, participou da cobertura de cinco Copas do Mundo, quatro Olimpíadas e do maior torneio de vôlei de praia do mundo, o Circuito Banco do Brasil. Como registram o site da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Associação Profissional dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio de Janeiro (Arfoc): “Tendo sempre o esporte como foco principal de sua câmera, presenciou também a primeira vitória de Ayrton Senna na Fórmula 1, em 1985, no circuito de Estoril, em Portugal; o dia em que João do Pulo bateu o recorde mundial do salto triplo no México, em 1975; e as conquistas do vôlei brasileiro, como a medalha de ouro da seleção masculina em Barcelona, em 1992, e o bronze conquistado pela eleição feminina em Sydney, em 2000”.
Trago em mim a fotografia desde criança. Sou um autodidata por haver aprendido tudo com o meu pai, que é um grande fotógrafo e me preparou para vida na fotografia. Entendo muito de luz e traduzo muito a partir do que aprendi dele. Meu olhar é apurado de modo a ver texturas a todo lugar – Ari Kaye
Durante a pandemia, Ari Kaye mergulhou na fine art e hoje seus quadros com fotos são comercializados com um grande sucesso. As imagens vão compor, inclusive, um livro que está sendo alinhavado.
Os dois firmaram a parceria a partir de uma amizade nascida pela coincidência de terem um amigo em comum. Hoje ela se solidifica por meio de uma confiança mútua: “Ele tem credibilidade e confiança de muita gente”, diz Cyrillo, que, por sua vez, foi o responsável por fazer Ari mergulhar nos registros fotográficos por drones. “Ricardo que me aconselhou”, disse.
Para Ari, o Rio traz muito de sua essência, efetivamente. Mas a foto do seu acervo que mais traduz a sua emoção é a que ele tirou no título da Libertadores, vencido pelo Fluminense. “Essa é a que mais me marcou a carreira. E me trouxe a consciência de que temos de ter o equipamento certo, em sinergia com a natureza. É uma soma de fatores para tudo fluir”, pontua
Em tudo na vida eu gosto de colocar minha alma, meu coração e energia. Imagem é isso. Um resultado grandioso numa imagem passa necessariamente pela necessidade de que a energia seja entregue em sentimento a quem vê de fora. Isso faz com que as coisas fluam organicamente – Ari Kaye
A fascinação que esses dois artistas das imagens possuem não pode ser traduzidas senão através da lente do amor, essa grande angular, a qual ao se abrir o ângulo, foca-se sobre a vida e a qual transcende. Se antigamente os discos RCA Victor se orgulhavam por trazer a frase “A voz do dono” simbolizados em sua logomarca, a fotografia poderia ser resumida para eles como sendo “a lente do dono e os donos do olhar”. E do olhar, direto ao coração e o saber compartilhar.
Além do companheirismo que os une, há uma cidade: o Rio de Janeiro. Cyrillo veio para cá para passear e acabou estabelecendo aqui uma rede, ainda que não tenha abandonado sua terra natal, São Paulo. Inclusive, é Rio o local que mais o emociona. Nos registros fotográficos que mais o deslumbraram está uma foto do Cristo Redentor.
“Meu sonho era fazer uma foto do Cristo e eu achava isso impossível. Na minha primeira vez, eu tremi de medo de perder o drone ou não captar a foto perfeita. Eu era chef de cuisine para viver de imagem. “O Cristo, o pôr do sol e nascer do sol, as cores do Rio, nos inspiram. O vídeo, a fotografia são sinônimos de colocarmos sentimento e técnica para tocar as pessoas – Ricardo Cyrillo
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