Allan Souza Lima tem muito o que comemorar. Depois de fazer o maior sucesso como o malandro MC Nenemzinho, de “A Regra do Jogo”, o ator pernambucano de 30 anos tem chamado a atenção do público agora também por sua atuação no filme “Aquarius”, de Kleber Mendonça Filho e estrelado por ninguém menos que a diva do cinema nacional Sonia Braga. E não é para menos. Apesar de rápida, a passagem do rapaz pelo longa-metragem não deixa o espectador indiferente a sua troca com a atriz, já que os dois aceitaram a missão de interpretarem uma polêmica cena de sexo na produção – o que gerou um certo desconforto com a classificação etária do filme. Mas polêmicas à parte, os louros do ator não param por aí. Embarcando também como diretor do curta “O que teria acontecido ou não naquela calma e misteriosa tarde de domingo no Jardim Zoológico”, onde também atua, Allan recebeu seu primeiro Kikito de Melhor Ator em Curtas no Festival de Cinema de Gramado pela película que produziu juntamente com o atro Daniel Dantas. Em entrevista exclusiva ao HT, ele revelou como foi a experiência de participar do filme do diretor pernambucano.
“Eu estou em um momento muito feliz da minha carreira. Foi uma oportunidade única ter participado dessa produção, até por ser o meu primeiro longa. Comecei no cinema com o pé direito com o Kleber, que é um cara fantástico, generoso e muito talentoso que conseguiu fazer um processo riquíssimo em muito pouco tempo. A sensibilidade dele fez com que a realização desse trabalho acontecesse de forma magistral”, disse ele, comentando ainda sobre seu encontro com a grande estrela da produção. “Eu sou muito avoado. Fui descobrir que eu iria filmar com a Sonia dois dias antes das gravações. Eu confesso que cheguei muito tenso no set, mas ela é mito tranquila e me deixou à vontade já no primeiro ensaio. Sonia é muito divertida e profissional”, afirmou.
Na trama, Allan dá vida a Paulo, um michê contratado por Clara (Sonia Braga) em uma noite solitária que, entre uma cena mais picante e outra, surpreende o público com um close de nu frontal. De acordo com o ator, apesar da sensibilidade da história, esse tipo de situação acaba sendo um pouco desconfortável para qualquer artista. “Ela é traumatizada por ter tido câncer de mama e não ter um seio. Quando eles se tocam, isso gera um conflito para ela, que é percebido pelo Paulo. É uma relação delicada, por mais que ele seja um garoto de programa. No entanto, a ideia foi quebrar todos os paradigmas e aproveitar o que a gente tinha naquele momento. Graças à troca que a gente teve aconteceu tudo muito naturalmente. Sobre o nu, o Kleber me perguntou se eu me incomodaria, mas eu acho que existem trabalhos e trabalhos. Eu fiquei super tenso quando descobri que iria ficar pelado ao lado da Sonia, mas acho que as cenas são de muito bom gosto e com propósito dentro do enredo do filme. Não é tão natural quanto parece, mas acho que o cinema proporciona uma entrega completa de seu trabalho”, ponderou ele.
Ainda assim, o filme contém essa e mais duas cenas de sexo, o que teria levado o Ministério da Justiça a classificá-lo para maiores de 18 anos, quando a sugestão dada foi para 16. Surpreso com o fato, Allan acredita que tudo pode ser uma represália do governo, já que no mês de maio, o elenco da produção se manifestou no Festival de Cannes, contra o então governo interino de Michel Temer. “Essa história da faixa etária é intriga da oposição”, disse ele, falando sobre os protestos na França. “Eu também estava em Cannes, mas sou do tipo de pessoa que pode não ter apoiado Dilma e muito menos o que está aqui hoje, e protestar. Quando eu levantei a bandeira “Fora Temer” foi uma opinião pessoal. Acho que tem muita coisa errada nesse momento. Mas já rolou tanta confusão sobre isso que a gente está querendo dar uma abaixada nessa poeira. Claro que o filme em si tem esse contexto político, mas ter sido lançado nesse momento também veio bem a calhar. A gente foi muito bombardeado por esses protestos, mas acho que vai ser uma grande história para contar para os meus netos. Os meus avós viveram a ditadura e eu estou aqui fazendo a minha parte para lutar contra essa nova ditadura que está sendo imposta”, disse.
Muita gente não sabe, mas apesar de ter começado sua carreira em 2007, na novela “Caminhos do Coração”, da Rede Record, Allan Souza Lima vem se arriscando como diretor de curtas há cerca quatro anos. Neste ano, ele apresentou “O que teria acontecido ou não naquela calma e misteriosa tarde de domingo no Jardim Zoológico” na 44a edição do Festival de Cinema de Gramado. “O nome em si já é maior do que o roteiro”, brincou ele. “É um projeto multimídia que começou como uma peça de teatro, mas como o processo de captação está muito difícil no nosso país, eu coloquei uma grana para realizar o curta-metragem. Tive que vender carro e me virar nos 30 para realizar essa produção. Mas a ideia é que ela se transforme também em um longa já para o ano que vem”, adiantou.
No curta, Allan conta a história de Ian (Daniel Dantas), um homem de meia-idade obrigado a conviver com a frustração de não ter realizado nenhum de seus sonhos, mas um encontro inesperado irá tirá-lo violentamente de sua constante e imutável zona de conforto. O projeto desenvolvido ao longo de oito anos, por outro lado, não deixa de ter sua contemporaneidade e realismo. “Quis fazer essa relação entre um personagem que chega aos 60 anos e a sua frustração ao perceber que não fez absolutamente nada da vida. Hoje vivemos em um mundo capitalista onde somos programados para executar tarefa. Vivemos em jaulas e precisamos dos bichos que temos dentro de nós”, avaliou.
Exibir o curta-metragem no festival teve um gosto todo especial para Allan Souza Lima. Ele, que esteve pela primeira vez no evento em 2012, lembra das conversas que teve com o cineasta Marcelo Galvão (o grande vencedor daquela edição com a comédia “Colegas”) sobre o projeto. Mais do que isso, saiu da Serra Gaúcha com um sonho que tomou como uma missão profissional. “Sempre brinquei que só faria meu primeiro longa-metragem quando finalmente conseguisse entrar na competição do Festival. Por isso, a minha alegria foi tão grande em estar lá. Gramado mudou e continua mudando a minha carreira”, comemorou. Mas calma, que ainda tem muito trabalho pela frente. Além da divulgação de “Aquarius” e do curta, Allan ainda vem se dedicando a peça “Dedo Podre”, onde contracena com a atriz Letícia Birkheuer. “Esse ano a gente já levantou uma grana para estrear no eixo Rio/São Paulo. É uma obra baseada no livro homônimo, assinado pela Nivea Stelmann e Lua Veiga, que fala, antes de mais nada, sobre o azar no amor”, adiantou.
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