Respiro para as artes com o avanço da Lei de Incentivo Fiscal no Rio: “Saímos vitoriosos!”, comemora uma das elaboradoras do projeto


Para Márcia Dias, advogada, produtora cultural e uma das redatoras do projeto, a falta de conhecimento sobre a Lei Rouanet é prejudicial à população: “Chega de mentiras!”

A última terça-feira (18/12) foi marcada por decisões importantes na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Isso porque foi aprovado por unanimidade o Projeto de Lei que garante 100% de incentivos fiscais para empresas que investirem em projetos relacionados ao esporte e à cultura. O próximo passo é ser sancionado pelo atual governador Francisco Dornelles. Depois de acompanhar a votação na Assembleia, a produtora e advogada, que participou da elaboração do texto do então PL, Márcia Dias, conversou com o site HT sobre o que muda, se a lei for aprovada pelo governador, e as expectativas com o novo governo federal e estadual.

Assembleia Legislativa do Estado d Rio de Janeiro, onde ocorreu a votação (Foto: Reprodução)

Durante o recente período eleitoral, muitas pessoas, inclusive parlamentares, invocaram a discussão acerca da Lei de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet (8.313/91), mesmo sem possuírem conhecimento sobre ela. Para aqueles que ainda tem dúvidas, o mecanismo de incentivos fiscais da Lei Rouanet é apenas uma forma de incentivar o apoio de empresas ao setor cultural. Na prática, o governo abre mão de uma pequena parcela de impostos para que eles sejam investidos na cultura. Todos os Estados brasileiros possuem um regulamento que trata desse assunto, mas até terça-feira (18/12), o Rio de Janeiro corria um pouco atrás, pois a lei em vigor ainda é a mesma de 1992, que garante o retorno de apenas 80% ao patrocinador, afastando possíveis investidores. “Quando começamos a pensar em melhorias nesse sentido para o Rio, veio a recuperação fiscal. Apesar de não prejudicar o Estado financeiramente, até entenderem isso estando nessa situação de crise é muito mais difícil”, explicou a advogada Márcia.

Com a aprovação do PL em questão, a situação de desvantagem carioca começou a mudar. “Dessa forma, a gente compete de igual para igual com todos os estados, já que a grande maioria é 100%. A maioria das empresas tem ICMS no Rio e em São Paulo. Uma vez que lá é 100% e aqui, até então era 20-80%, você acha que as empresas vão investir onde? Todo mundo está patrocinando em São Paulo”, afirmou. E prosseguiu dando mais detalhes sobre o que muda na prática, se a lei for sancionada pelo governador: “O patrocinador adianta o dinheiro para a realização do projeto, que é aprovado pela Secretaria de Cultura ou de Esporte. Depois dessa aprovação, o valor pago vai sendo descontado do imposto que ele precisa pagar. Então, resumindo, cada vez que a empresa for pagar a guia de impostos, vai abater aquele percentual até completar o valor total do patrocínio”.

Apesar de aprovada entre os parlamentares por unanimidade, o debate anterior foi marcado pela falta de conhecimento. Havia, inclusive, uma contraproposta que visava reduzir o incentivo para 50%, piorando a situação ainda mais. Segundo Márcia, esse primeiro embate só existiu porque o tema ainda não é claro para todos. “Depois de conseguirmos explicar para eles, que muitas vezes não dominam o assunto, eles entenderam. O problema é que eles acabam não se preocupando em conhecer melhor a cultura, pois já se envolvem em muitas outras coisas. São poucos os deputados que se envolvem com esses temas e esses com certeza entendem, mas ainda não são suficientes. Eu acredito que a gente só deve dizer aquilo que a gente sabe, mas no geral todo mundo tem uma opinião e quer dar essa opinião, mesmo desconhecendo o assunto. Foi uma enorme negociação para que todos concordassem e sobretudo, entendessem o mecanismo. De qualquer forma, foi ótimo, no fim todos entenderam a importância de apoiar a cultura e o esporte. Saímos vitoriosos”, reforçou.

Márcia Dias é advogada, produtora cultural e uma das elaboradoras do PL (Foto: Reprodução)

Como vimos nas discussões geradas pela última eleição, esse desconhecimento sobre o tema habita não só as casas públicas, mas toda a população. Para Márcia, esse problema ainda persiste em nossa sociedade por vários motivos: “O ministério da Cultura demorou muito, por falta de orçamento para isso, para demonstrar resultados, ou seja, as pessoas não ficam sabendo da realidade. Ninguém quer ler e estudar as leis e muitos jornalistas ficam batendo na cultura, na lei Rouanet e tudo isso contribui para esse inconsciente da ignorância, do desconhecimento. Sem informação, sem pesquisas e sem os resultados claros é difícil as pessoas entenderem que as leis de incentivo são fundamentais tanto para cultura, quanto para o esporte”. E continuou, com a esperança de que a situação está sendo modificada aos poucos, citando um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas e encomendado pelo Governo Federal: “Agora, as pesquisas estão informando que o incentivo gera lucro,  como a análise que mostra que a cada 1 real investido pela Lei de Incentivo, há retorno de R$1,59 para a sociedade. Isso significa que a economia criativa e a cultura têm força para alavancar o estado. Dessa forma, com explicações e comprovações, ficou mais fácil conseguir mudar essa lei tão antiga. Demoramos, mas conseguimos”. Esse retorno à população é dado na forma de renda, emprego e arrecadação de impostos.

Seguindo para a última fase, a lei depende da aprovação do então governador Francisco Dornelles. Mantendo essa esperança já citada, a produtora e advogada acredita na vigência final da lei. “Ele [Dornelles]entende a importância dessa lei e a importância de deixar isso para o próximo governo, que também precisa entender que isso é o melhor que podemos fazer pelo Estado. Que a cultura e o Esporte no Rio possam finalmente se consolidar de uma maneira mais efetiva”, informou. Para ela, os novos parlamentares que assumirão em 2019, tanto em nível federal quanto estadual, tem a capacidade de dar prosseguimento à evolução da cultura e do esporte: “Pelo o que já foi anunciado até agora, eu acho que vamos continuar em um cenário parecido com o de agora. Acredito que eles entendem perfeitamente a importância da parte cultural e esportiva, apesar das críticas. Eu tenho certeza que é apenas falta de conhecimento, mas agora temos pesquisas, resultados e argumentos. Só não vê quem não quer”.

Theatro Municipal do RJ que, entre fechamentos e aberturas, segue fornecendo cultura de qualidade (Foto: Sylvia Masini)

Para além do trabalho parlamentar, a sociedade precisa buscar uma transformação, segundo Márcia. “A população e a imprensa contribuem para essa nebulosidade, pois passam informações adiante que muitas vezes não são verdadeiras ou não estão sendo interpretadas como deveriam. Precisamos acabar com isso, não dá mais para envergonhar o Brasil dessa forma. Junto a esse não falar mal, é necessário aumentar a participação popular nesses projetos. Em todo o mundo, a cultura é muito mais participativa e aqui, nós vemos teatros e cinemas vazios. Os ingressos muitas vezes são vendidos a preços populares e ainda assim, as pessoas não tem esse hábito. Não enxergam que a cultura alimenta, faz viver bem e faz das pessoas, melhores. Para essa aprovação de agora, é importante frisar que o Estado não está entrando com mais dinheiro, o limite de incentivo que o Estado dá foi mantido, como determinado em 1992. Chega de mentiras!”, concluiu.