*Por Brunna Condini
Com prefácio escrito por Nathalia Timberg, posfácio de Caco Ciocler e depoimentos de Irene Ravache, Miguel Falabella e Zezé Motta, entre os de outros atores e atrizes, além de entrevistas com profissionais tarimbados na arte, Marcus Montenegro lança seu livro “Ser artista”, escrito em parceria com Arnaldo Bloch, no qual reúne a história de grandes nomes da TV e do teatro e dicas para quem quer seguir a profissão. São 30 anos no ramo de empresariamento de atores e é essa experiência que ele leva para a obra.
“A Montenegro Talents hoje é uma empresa com 320 atores, 25 autores e 8 diretores. O processo para fazer parte do nosso time é ter talento e espaço dentro da empresa, já que evitamos ter muitas pessoas no mesmo seguimento. Mas o básico, com os atores, é que eles devem ter formação, conteúdo, desenvolvimento de carreira através do estudo. Esse é o perfil que buscamos para trabalhar”.
No livro, que se propõe a ser um guia, o empresário também analisa carreiras bem-sucedidas de atores como Eva Wilma, Nicette Bruno e Fabiana Karla, por exemplo, destacando características que fizeram com que elas se tornassem referências. “O livro é uma mistura das minhas memórias baseadas em produções que desenvolvi com as grandes damas e da palestra de construção de carreira onde eu exponho todo o mercado. Ele tem uma parte didática que ensina como apresentar material, se cadastrar nas plataformas, relação com produtores de elenco e outros profissionais, e também seleciono histórias que servem como legado, bons exemplos para os atores. Acho que todo artista deveria também ser empreendedor, porque precisa desenvolver seu próprio conteúdo. Eu trabalho com a geração que deixou esse legado, que produziu a vida toda. E muito jovens fizeram suas escolhas, montaram suas companhias, espetáculos, suas estruturas de trabalho. E isso faz toda a diferença na solidez da carreira e na construção dela. Então, estimulo esse lado empreendedor nos atores”.
Por espaço para os veteranos
Estudo, formação e dedicação, criam assinaturas, versatilidade e profundidade. Esses são alguns traços do legado que os grandes nomes da dramaturgia brasileira deixam como inspiração e luz para os futuros caminhantes. Mas este ano muitos atores não renovaram contrato com a TV Globo, por exemplo. Isso é uma forma de desligá-los fixamente e atingiu muito os atores veteranos. Você liderou o movimento #euqueroveteranosnatv, certo? Acredita que o artista mais velho é facilmente ‘descartado’ hoje neste país? “O meu movimento #euqueroveteranosnatv não está ligado a contratos. Eu entendo que chega um momento em que uma empresa não consegue manter contratos vitalícios. É claro, estamos no meio de uma pandemia e de uma grande crise econômica”, observa. “O meu movimento é em relação à frenética jovialização do mercado. Um exemplo disso, é que recentemente uma atriz de 42 anos fez a mãe de um ator de quase 30. Os personagens nas novelas estão cada vez mais jovens e a partir de 50 anos, quase não se tem mais personagens bons para os atores”.
Marcus Montenegro defende que a produção da dramaturgia volte o olhar para a criação de papéis desafiadores também para atores mais experientes. “Isso tudo é um estudo que venho fazendo há cinco anos em cima do livro do Ismael Fernandes, “Memória da Televisão Brasileira”, em que ele apresenta todos os elencos de novelas. E nesta obra você vê que as telenovelas tinham 40 atores aproximadamente, e dentre eles, o casal jovem protagonista com seus amigos, mas 50%, 60% do elenco era formado por atores de meia idade para cima. E você via grandes personagens, em quantidade, de 40 anos em diante. A prova disso, é a novela ‘Meu bem, meu mal’, do Cassiano Gabus Mendes da década de 1990, que estreia agora no Globoplay, onde você tem 25 ótimos personagens veteranos”.
Ele defende ainda, a importância do respeito à longevidade da carreira dos atores. “Hoje uma atriz de 50 anos já é uma veterana e disputa um personagem com uma grande quantidade de pessoas, com pouquíssimas opções. A oferta é infinitamente menor que a demanda. Então, o que eu venho pleiteando é que o streaming, a televisão aberta, fechada, o cinema, tenham um olhar para os veteranos. Que escrevam em quantidade, com personagens com consistência, porque senão você vai fadando o ator a ficar desempregado muito cedo, por volta dos 50. E a profissão do ator é diferenciada. Você pode trabalhar muito tempo, até 95 anos, até a saúde permitir, olha a Bibi Ferreira (1922-2019). Fizemos a Bibi cantando em Nova Iorque duas vezes, uma com 92 e outra com 95 anos. E quer exemplo mais bonito que a Nathalia Thimberg fazendo turnê aos 91 anos? É uma carreira digna e um legado muito bonito que elas deixam”.
Sobre seguidores e likes
“Eu lamento a banalização da internet e das pessoas ficarem preocupadas em ter likes e quantidade de seguidores, só por ter. Porque é quantitativo e não qualitativo. Acho que os jovens têm um poder maravilhoso nas mãos, poderiam ser verdadeiros agentes transformadores. Aproveitar toda essa popularidade da internet, esses influenciadores digitais que existem aí, e influenciar a formação de um povo com coisas boas. Imagina se todos esses jovens com muitos seguidores plantassem a arte? Comentassem de bons filmes, boas peças, músicas, livros? Poderíamos fazer dessa máquina que temos nas mãos uma verdadeira revolução cultural e que serve de base para a transformação de um país”, sonha.
“Eu não acredito em um país sem educação como base para uma transformação em direção a um futuro melhor. Então, eu lamento profundamente o quanto é pueril, o quanto o conteúdo é frágil nas redes. Tem gente séria, sim, tentando essa exposição, mas adoraria que tivéssemos um processo de transformação para termos esses agentes de verdade na mudança do mundo. Porque se eles quiserem, podem”.
As celebridades que ganham notoriedade do dia para noite, muitas vezes almejam se tornar atores e atrizes. Você já comentou que esse público não é o foco do seu empresariamento… continua não sendo? “Eu não tenho o menor interesse em trabalhar com uma celebridade que se transformou do dia para a noite em famoso se ela não tiver formação e conteúdo. Ela pode, sim, ser uma pessoa que até então era anônima, batalhou, estudou e se transforma em celebridade. Se essa pessoa tiver esse conteúdo e isso acontecer com ela, isso me interessa. Gosto de pessoas sérias e comprometidas com o ofício. A arte reflete a sociedade e a faz evoluir. Gostaria de deixar essa reflexão”.
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