Instalado no sobrado onde morou Tim Maia, brechó na Tijuca faz sucesso entre jovens politizados


Maio 68 tem peças de roupa vintage, com pegada dos anos 1970, objetos como taxímetros Capelinha, e faz um mix de moda, música e gastronomia

*Por Jeff Lessa

Um lugar para se bater papo e trocar ideias. Um café charmoso onde se pode saborear hambúrgueres artesanais, doces e petiscos com calma, num ambiente bonito e muito acolhedor. Uma loja de roupas com “pegada” meio anos 70, meio anos 20. Um palco para bandas que estão começando. Um sobrado centenário decorado com objetos vintage como telefones de baquelite, rádios dos anos 1950, televisões do tempo das válvulas e os adoráveis taxímetros Capelinha (lembra?).

Uma das salas do Brechó Cultural Maio 68 decorada ao estilo dos anos 1970 (Foto: Juliana Carneiro)

Esse lugar existe, fica na Tijuca e vem atraindo uma turma jovem, politizada, ligada em artes, gastronomia, música e, claro, antiguidades. Chama-se Brechó Cultural Maio 68 e é uma mistura charmosa de tudo isso. O “clima” lembra certos bares no estilo dos anos 50 que, infelizmente, são cada vez menos comuns no Rio: pontos de encontro para longas conversas, onde a maioria dos fregueses se conhece e sabe quem vai encontrar no local. O oposto dos papos virtuais. Ah, e nos fins de semana rolam shows na casa.

Ao todo são nove ambientes mais a cozinha. A história do brechó começa na Travessa Soledade, também na Tijuca, onde o pai de Maria Carolina Padula, de 31 anos, tinha um pequeno antiquário chamado… Soledad.

‘Não compro lotes e escolho roupas com uma pegada dos anos 20 e 70’, conta a sócia Carolina Padula (Foto: Rodrigo Martins)

– Meu pai é colecionador de antiguidades e tem uma cantina na Uerj. Eu e meu amigo Rodrigo ajudávamos e acabamos assumindo o lugar, pois ele não tinha tempo – conta Carol. – Lá nós promovíamos eventos na calçada. Uma amiga, Suelen Villafuerte, levava doces.  Nos tornamos sócias. O negócio cresceu e viemos para este sobrado na Rua do Matoso, bem maior.

Os vizinhos costumam dizer que Tim Maia morou na casa. Cuidadosa, Carol prefere ser discreta ao tocar no assunto:

– Não tenho certeza… Prefiro dizer que “reza a lenda” (risos). O povo conta que Erasmo e Roberto Carlos frequentavam muito. Afinal, aqui é muito próximo ao cinema Comodoro e ao Divino, que já não existem mais.

O hambúrguer artesanal faz sucesso (Foto: Afonso Brandão)

(O Bar do Divino ficava na esquina das ruas Barão de Ubá com Haddock Lobo. Foi onde músicos da Jovem Guarda como Erasmo, Roberto Carlos e Wanderléa foram revelados.)

O nome do brechó já entrega o estilo politizado da turma que está à frente do lugar. Maio 68 homenageia o mês e o ano em que os estudantes franceses se rebelaram contra as posturas conservadoras em seu país. Entre outras exigências, eles queriam a renúncia do presidente Charles De Gaulle. Os confrontos em Paris podiam ser vistos pela televisão em todo o mundo. Inflamaram as mentes de jovens em todo o planeta e marcaram profundamente aquela geração. Parece que l’esprit du temps conquistou a juventude de agora.

O manto em patchwork sobre o sofá confere um certo ar de anos 70 à sala (Foto: Rodrigo Martins)

– O pessoal que frequenta é muito alternativo e as compras são diversificadas. Nunca são óbvias. Nós investimos muito em comprar peças de roupa antes de abrir. Não compro lotes, seleciono uma por uma – conta Carol. – Às vezes, adquiro uma roupa imaginando que ficará muito bem numa senhorinha, mas quem leva é uma garota de cabelo verde!

As peças de roupa são escolhidas uma a uma pela sócia Maria Carolina Padula (Foto: Rodrigo Martins)

Pedidos personalizados também são frequentes. Não faz muito tempo, uma jovem procurava por uma fantasia de leão (!). E, no café, alguém queria um hambúrguer de grão de bico (!!). À frente do café, o casal Suelen Villafuerte e Romaika Milagres encara pedidos como esse como uma oportunidade de criar novas opções para o menu.

– A gente tenta absorver as demandas mais interessantes – conta Carol que, junto com o designer gráfico Rodrigo Martins, adquire peças de roupa, objetos e móveis em bazares, feiras de antiguidades e de fornecedores fixos para vender no sobrado.

A cadeira antiga foi restaurada para ficar com um ‘look’ atual (Foto: Rodrigo Martins)

A atitude política que valeu o nome do estabelecimento pode ser encontrada na própria atividade de vendedor de roupas e objetos usados. Maria Carolina explica:

– Um exemplo disso é podermos proporcionar roupas boas para gente normal, que não ganha fortunas. Temos coisas ótimas por trinta, cinquenta reais. Chegamos a receber peças que nunca foram usadas, desperdício puro.

A geladeira vermelha, a cara da década de 70, é objeto de desejo de muita gente, mas não está à venda (Foto: Rodrigo Martins)

O investimento afetivo e monetário valeu a pena. Cada sala do Maio 68 tem uma cara diferente, é retrô à sua maneira. Uma parece a casinha da vovó. Outra lembra a sala de um amigo hippie, com almofadões para a galera se sentar no chão, tecidos estampados e flores por todos os lados. Entrando numa terceira sala, o ambiente remete à década de 1970, com uma vibe disco que se completa com geladeira vermelha e luminária cor de laranja:

– O pessoal reconhece as peças, é comum ouvir gente dizendo “minha mãe tinha”. Aqui é um antigo com jeito jovem, não temos antiguidades sérias, tipo cristais e porcelanas. Todo mundo que trabalha aqui trouxe algo de casa. Somos um coletivo de ideias e de cooperação.

Vida longa ao Maio 68.

A pequena área externa, charmosa e acolhedora (Foto: Rodrigo Martins)

SERVIÇO

Brechó Cultural Maio 68

Rua do Matoso 184, sobrado, Tijuca – 4109-7035

Ter a sex, das 14h às 22h. Sáb, das 14h às 22h (sujeito à programação musical divulgada nas redes)

C.C.: Todos