*Por Fabiane Pereira
Não conheço pessoalmente a jornalista gaúcha Babi Souza, mas já sou superfã de sua coragem. Há poucos meses, ela lançou o livro “Vamos juntas? – O guia da sororidade para todas” (Editora Record), que conta a história do projeto que tornou-se um grande espaço de troca e união entre mulheres na internet.
Tudo começou quando Babi voltava de ônibus à noite de mais um dia de trabalho em Porto Alegre. A guria precisava cruzar uma rua escura e deserta para chegar a seu destino e sentiu medo (quem nunca?). Ao olhar em volta, viu que diversas outras mulheres caminhavam da mesma forma, apreensivas. “E se fôssemos juntas?”, ela pensou. Nascia ali a primeira ideia do “Vamos juntas?”, projeto que incentiva mulheres a oferecer companhia e apoio às outras. Resumindo, projeto que promove a sororidade.
No livro com layout jovem e linguagem de fácil compreensão – presente ideal para aquela sobrinha, filha ou filha da amiga adolescente ou jovem adulta – a autora conta a trajetória da iniciativa, que hoje já tem mais de 300 mil seguidores nas redes sociais e reúne histórias de mulheres que sofreram assédio ou que conseguiram evitá-lo graças a ajuda das outras. Com vários depoimentos, o livro também apresenta conceitos básicos sobre feminismo, empoderamento e defende a união como a melhor saída para as mulheres em sua luta contra o machismo e a opressão. Babi explica ainda como a rivalidade e a competição sempre atribuídas ao sexo feminino não são mais do que construções sociais ultrapassadas. O livro sugere formas de colocar a sororidade em prática e de incentivar o empoderamento.
Esta nova geração XX está cada vez mais empoderada e isso é ouro. Conversei, por email, com a autora e divido nosso papo com vocês.
FP: Quando você se descobriu feminista?
BS: Na adolescência comecei a ter a impressão de que era feminista, mas tinha medo, parecia algo errado, afinal, “feminista” ainda era falado em tom de xingamento.
FP: Como surgiu a ideia de lançar um livro sobre o movimento Vamos Juntas?
BS: Muitas apoiadoras do movimento davam a ideia na página e a Gui Liaga, hoje minha agente literária, me procurou na página dizendo que achava uma grande ideia. Eu acreditei.
FP: No prefácio do livro, Márcia Tiburi diz que em momentos difíceis da vida, sempre há uma mulher do nosso lado. Você acha que temos mais pré disposição à empatia? Por quê?
BS: Acho que todas as minorias acabam tendo algo muito forte que as unem entre si. Com as mulheres não é diferente. Temos as mesmas dores, sofremos das mesmas amarras, assim, fica um pouco mais fácil se enxergar na outra e a entender.
FP: Você, apesar de jovem e nascida num mundo super conectado, já deve ter acreditado no mito da “rivalidade feminina”. O que te fez mudar de ideia? Em que momento da sua vida você percebeu que esta mentira só perpetuava o machismo?
BS: Acho que o fato de eu ter uma melhor amiga desde o 6 anos acabou me ajudando a acreditar na amizade feminina e na sororidade. Pra falar a verdade, esse papo de rivalidade nunca colou direito comigo. Achava estranho. Pra mim não fazia sentido.
FP: Faz parte da história: todas as vezes em que as mulheres se uniram, o mundo mudou. Quais as mudanças você acredita/espera que aconteça no Brasil nas próximas duas décadas? Suas expectativas são otimistas?
BS: A principal é que as mulheres possam passar a ser, de verdade, donas da sua própria vida e do seu próprio corpo. Que a gente tenha certeza disso e que os homens passem a entender também.
FP: Algum medo – seja o de passar por uma rua deserta sozinha, seja o de não ser respeitada como profissional ou qualquer outro tipo de constrangimento comum a tantas mulheres – já lhe impediu de fazer alguma coisa? Que medo foi este?
BS: Não consigo nem contar quantas vezes deixei de sair ou usar a roupa que eu queria por conta do medo. Mas, principalmente, por conta de culpa. Por perceber que quando era assediada ou desrespeitada as pessoas diziam, de várias formas, que a culpa era minha. Além de passar por essas situações, ainda tinha a dor da culpa.
FP: Nesta gincana da vida das mulheres, quais as principais queixas (comum a todas) recebidas na fanpage do movimento Vamos Juntas?
BS: Assédio na rua, assédio de conhecidos, homens que se aproveitam de mulheres bêbadas.
FP: Poderia nos contar uma entre as milhares de histórias que vocês recebem todos os dias na fanpage do movimento que mais te emocionou? Por que este relato mexeu tanto com você?
BS: Com certeza uma das que me mais me emocionou é a que a moradora de rua salvou uma mulher de uma perseguição. A moradora de rua havia visto a minha entrevista no programa “Encontro”, apresentado pela Fátima Bernardes, e salvou a mulher inspirada no movimento. Adoro essa história, porque ela mostra que a sororidade não faz diferença de classe social, poder aquisitivo, grau de escolaridade. Somos mulheres e isso basta!
FP: Que conselho você costuma dar às mulheres que ainda não entenderam que se empoderar é necessário e que juntas somos mais fortes?
BS: Se perdermos tempo brigando entre nós mesmas nunca vamos construir um mundo melhor, com mais liberdade e menos medo, para nós, mulheres. Sozinhas somos apenas uma, mas juntas somos uma multidão.
*Fabiane Pereira é jornalista, pós graduada em “Formação do Escritor”, sócia da Valentina Comunicação — empresa voltada para criação, divulgação e produção de projetos musicais e literários — apresentadora, roteirista, produtora e programadora musical do programa de rádio Faro MPB, da Rádio MPB FM.
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