A frase “respeita a minha história” cairia bem para Adriane Galisteu. Aos 50 anos, a apresentadora segue vivendo intensamente o presente, mas buscando honrar o passado que a trouxe até aqui, tanto nos momentos difíceis, quanto nos sublimes. “A morte do Ayrton Senna dele foi uma das experiências mais traumáticas da minha vida. Sempre vivi meus dias como se fosse morrer amanhã. O Ayrton potencializou isso pelo fato de ter morrido aos 34, trabalhando, mas sem realizar sonhos – ele não concretizou quase nenhum. Ayrton sonhava em conhecer a Disney, ter filhos, correr pela Ferrari. Sonhos possíveis. Acho que o meu trauma foi tamanho que entrei em um modo automático de sobrevivência. Levei muito tempo pra parar, respirar, olhar e reconhecer o que já havia feito”, reflete Galisteu, que descobriu na própria potência sua fortaleza e abrigo, mesmo diante das críticas e ‘puxadas de tapete’ da vida. Sua versão atual equilibra maturidade, energia e está em paz: “Aos 50 anos, escolhi ser melhor do que nunca! Tempo para mim é luxo – tempo com meu filho, tempo para viajar, tempo para mim mesma, tempo para não fazer nada ou para fazer tudo”.
O Ayrton foi uma porta na minha vida. Cabia a mim botar a mão na maçaneta e abrir essa porta. Foi um labirinto onde eu entrei. Poderia ter me perdido, mas não me perdi – Adriane Galisteu
Como no site somos fãs de mulheres potentes, trazemos em primeira mão o ensaio deslumbrante e o conteúdo incrível da matéria com Adriane Galisteu para a POP-SE, idealizada pelos jornalistas Allex Colontonio e André Rodrigues, nomes referência no mundo das revistas de moda e design. A publicação criada para revolucionar os veículos impressos no Brasil, nasceu ousada em 2018, e se mantém fresh, valorizando a relação orgânica com o papel e com a leitura de uma nova forma, através de publicações trimestrais altamente colecionáveis sobre arte, arquitetura, design, moda, lifestyle e cultura. “Alvo na mira e à prova de likes, Adriane Galisteu vira meio século de vida, revela a pele que habita e entrega seu coração embrulhado entre sakuras e armaduras invisíveis à POP-SE em ensaio-entrevista que é uma ode à liberdade de ser o que se quiser em qualquer tempo, a todo momento”, pontua Allex.
“Mulher naturalíssima, Galisteu mantém o mesmo viço, rechaça o etarismo, assim como nós, e imprime na pele o viço da juventude num shooting fotográfico orgânico, sem intervenções de photoshop ou inteligência artificial (por sinal, uma das discussões que levantamos no conteúdo intenso da POP-SE), com pouca roupa e muito estilo, coberta em pinturas de flores de cerejeira pintadas à mão e em tempo real sobre seu corpo em clima bem “Cherry Baby”, evocando a filosofia japonesa auspiciosa representada pelas sakuras. A decisão de usar um lib e um tapa sexo, foi da revista, porque não queríamos vetos dos bots do Instagram, mas ela ficou muito à vontade, foi um ensaio fluido”, nos conta o publisher Allex Colontonio. “Adriane também é paciente pacas. Só a pintura corporal durou mais de quatro horas, e o shooting, ao todo, levou 12″.
E Allex descortina o ensaio: “O mais legal é ter conseguido essa plasticidade a partir de uma foto muito orgânica, com zero retoques. Escolhemos Adriane porque ela é uma mulher muito natural. Jamais fez qualquer interferência, harmonização. A indústria pegou muito no pé dela para que operasse o nariz. E ela aconteceu, com aquele nariz mesmo. Ao falar sobre beleza e padrões na publicação, a apresentadora foi certeira: “Já ouvi todo tipo de comentário sobre o formato e tamanho do meu nariz. Quer saber? É meu! Sou dona do meu nariz. Esse nariz vai continuar aqui, não vou mexer”.
Me livrei de um relacionamento abusivo do mesmo jeito que parei de fumar. Chegou um dia em que eu decidi que aquilo não iria mais me controlar e procurei ajuda de um psiquiatra – Adriane Galisteu
Ainda falando a respeito de pressões estéticas, Galisteu que começou a carreira como modelo aos 16 anos, recorda: “Sou da época da Ming (@mingliaotao), coach de modelos que andava com uma fita métrica em volta do pescoço. Só as meninas com quadril entre 89 e 90 cm embarcavam para trabalhos no Japão. Eu saía de casa medindo 90, mas quando Ming encostava a fita no meu quadril sempre marcava 92 ou 93 cm. Nunca passei. Hoje damos risadas juntas, mas na época eu ficava apavorada”, conta à POP-SE.
O luxo da maturidade
Vivendo um período de plenitude, sem tempo para crises e colhendo os frutos da maturidade, ela afirma. “Minha medida não está em uma balança, mas no meu próprio corpo. Carrego em mim histórias e memórias, cresci em uma geração em que para trabalhar neste mercado a mulher precisava cumprir uma série de requisitos físicos que não foram inventados por nós. Não se falava nada sobre body positivity. Eu acho esses movimentos libertários fundamentais, embora eu siga em guerra, por exemplo, com meus cabelos brancos. Odeio – e eu tenho, claro, um tufo de cabelos brancos bem na frente. Muitas amigas se libertaram nesse sentido, ficam mandando WhatsApp me perguntando se os meus pentelhos já estão brancos também! Eu não posso ver um único fio que arranco”.
“Tenho muito a fazer. Quero ser líder total de audiência, atuar mais no teatro – acabei de lançar meu avatar! Quero abrir caminhos no Metaverso. Uma das coisas que eu falaria para a Adriane Galisteu do passado é: calma, o mundo não vai acabar e você não vai morrer amanhã. A gente se fala de novo quando você chegar aos 50 – Adriane Galisteu
Adriane comemora a mulher que se tornou e os ganhos que chegam junto com os anos que passam: “Não achei gostoso fazer 50 anos pela idade cronológica, mas sim pela maturidade. A gente descobre que não importa a idade: o que importa é como você chega nela. Esse é o grande barato da vida. Não importa se é aos 50, 60, 70, 80 – o que importa é como você chega lá. Até hoje não fiz nenhuma cirurgia plástica. Mas como sou eu quem determina a minha própria dignidade, se eu sentir que apareceu algo que não curto, vou mexer. Acho que a pessoa precisa se admirar até o final da vida, sabe? E cada uma tem um olhar próprio sobre si”.
E conclui, sem descartar mais um filho: “Hoje eu tenho a Claudia Raia como foco, porque a maternidade foi a coisa mais impressionante que aconteceu na minha vida e vejo que dá tempo de pensar nisso de novo. Eu achava que era amorosa com as pessoas, mas o Vittorio (filho de Galisteu com Alexandre Iódice) desperta em mim um sentimento que eu nem sabia que tinha. Você descobre um amor novo e único dentro de você”, compartilha.
O abusivo e o tóxico
Ainda refletindo sobre amadurecimento e os momentos de virada, Adriane desabafa: “Me livrei de um relacionamento abusivo do mesmo jeito que parei de fumar. Chegou um dia em que eu decidi que aquilo não iria mais me controlar e procurei ajuda de um psiquiatra. Fumei durante 20 anos, pouca gente sabe, porque eu morria de vergonha, fumava escondida. Mentia pra mim e pra todos que eram 10 cigarros por dia – mas, na verdade, eu consumia dois maços por dia. Eu estava na Disney com Vittorio, e me via saindo das filas dos brinquedos, jogando fora o tempo que teria junto do meu filho, pra atravessar o parque até o fumódromo. Na metade do caminho de volta, eu já ficava com vontade de fumar outro. Mentia que ia ao banheiro e ouvia meu filho dizer: mãe, eu sei que você tá indo fumar. Ali eu entendi que havia perdido o controle, que não tinha limites. Parei. Isso tem nove anos”.
Após sete anos de terapia, ela diz: “Só descobri que vivi um relacionamento abusivo depois que obtive informações sobre o assunto. Não fui agredida fisicamente, mas ele me jogava pra baixo, manipulava meu psicológico profundamente. Me sentia como uma marionete. A psicoterapia me salvou, fui abrindo minhas caixinhas aos poucos. Quando entendi quais eram os gatilhos e botões que as pessoas não devem apertar em mim, me libertei”.
Acho movimentos libertários como o body positivity fundamentais, embora eu siga em guerra, por exemplo, com meus cabelos brancos – Adriane Galisteu
A versão atriz
Com trabalhos na TV, no cinema e no teatro atuando, ela recorda que quase não insistiu neste caminho após integrar o elenco de ‘Xica da Silva’ da extinta Manchete, sua primeira novela. “Peguei o diretor Walter Avancini (1935-2001) em uma fase difícil, em que ele gritava com todo mundo. Sofri pra caramba! Era um sucesso estrondoso e eles ficavam alongando a trama. Gente, eu morri três vezes na novela – e ressuscitei as três. Voltei bruxa, fantasma, voltei sem orelha! Minha personagem reaparecia detonada, sempre mais sofrida, ficou até muda. Olha, foi um caos. Ali eu prometi pra mim que não faria mais novelas – não é pra mim”. Mas ela voltou e numa experiência feliz em 2018 em ‘O Tempo Não Para’, na Globo.
“Quando a Bibi Ferreira (1922-2019) me convidou para substituir a Lucélia Santos em ‘Deus lhe Pague’ no teatro, como eu tinha essa referência da novela, declinei. Bibi insistiu, pediu que eu fizesse testes, prometeu me ensaiar quatro meses e me colocar em cartaz. E foi genial, um trabalho incrível, um grande sucesso. Uma virada. Depois disso, fiz outros 12 espetáculos”.
Hoje eu tenho a Claudia Raia como foco, porque a maternidade foi a coisa mais impressionante que aconteceu na minha vida e vejo que dá tempo de pensar nisso de novo – Adriane Galisteu
A construção do caminho até aqui
Completando 40 anos de uma trajetória profissional que começou como cantora de grupo musical infanto-juvenil, passando pela versão modelo, a atriz, chegando à apresentadora, que vem se mantendo em ascensão nos últimos anos, Galisteu pontua o start do caminho que a trouxe até aqui, com um triste plot twist que foi a morte de Ayrton Senna. “Quando comecei a namorar o Ayrton, eu já pagava minhas próprias contas. Minha vida era pequenininha, mas eu me bancava. A morte dele foi uma das experiências mais traumáticas da minha vida. No ano de 1994, só sobrevivi, porque fui acolhida pelo Antonio Carlos de Almeida Braga – empresário e amigo de Senna. Eu e minha mãe fomos morar de favor na casa dele”, recorda.
“Eu não estou dando essa entrevista para me justificar, mas para falar a verdade. O Ayrton foi uma porta na minha vida. Cabia a mim botar a mão na maçaneta e abrir essa porta. Foi um labirinto onde eu entrei. Poderia ter me perdido, mas não me perdi. Fiquei completamente catatônica com a perda do parceiro, não do ídolo, porque eu não estou nem aí para o ídolo. E eu tinha que fazer alguma coisa. Porque a Eletropaulo não espera. Corta a luz. Foi aí que surgiu o Nizan [Guanaes], o Nirlando [Beirão], o livro (“O Caminho das Borboletas). Foi meu recomeço”, lembra.
Apresentadora de reality
À frente de A Fazenda nas duas últimas edições (a próxima está prevista para setembro na Record), ela também apontou no bate-papo, como é a função nos bastidores do programa: “Preciso estar disponível 24 horas por dia, sair correndo de casa pra entrar no ar. E tem toda a angústia de lidar com as opiniões polarizadas que circulam na internet. Fui muitas vezes cobrada para me posicionar nesta ou naquela direção”.
“Acho que nesta edição de A Fazenda, participantes perderam bastante a noção do convívio, do respeito ao próximo – como acontece em todos os reality shows do planeta. E também como acontece, em muitos casos, no mundo real. Eu fui, por exemplo, uma das grandes incentivadoras da entrada de alguns jogadores, que achava interessantes. No primeiro convite, a empresária de uma delas declinou. Insisti. Ela topou. Mas eu nunca pensei onde ela seria capaz de chegar. E cadê ela hoje? Nunca mais vi”.
E dispara: “Sou da época em que o não era jogado na cara. Não era na semana seguinte, muito menos por mensagem”, conta ela que, num dos episódios mais reverberados na internet, tomou a palavra direto da boca da participante. “Por favor, não é sua vez de falar. Não é um problema seu”, avisou Galisteu, calejada pelos muitos anos de estrada e dando uma voadora de peito nos haters que lhe cobravam posicionamento. “Quando comecei, nas agências, era quase um paredão – a gente chamava assim mesmo, de paredão. Eles olhavam pra gente e gritavam ‘você sim, você não’. Tudo na sua cara e na frente de todo mundo. Ouvi muitos nãos – nenhum me derrubou. Todos me fortaleceram”.
Dinheiro
“Na relação com o dinheiro, você precisa decidir rápido quem vai mandar em quem. Dinheiro não compra felicidade. Não comprou a saúde do meu irmão”, diz, referindo-se a Alberto, que faleceu aos 28 anos de idade. “A questão não é quanto dinheiro você tem. Quem tem mais dinheiro? Quem ganha 1 milhão por mês e gasta 2 milhões, ou quem ganha 2 mil reais por mês e gasta 1 mil?”, pondera Galisteu, que já ocupou durante muitos anos o posto de celebridade mais requisitada e mais bem paga pela publicidade nacional.
Imagem e essência
Adriane também pensa na mulher que teve que lutar sempre pelo que quis: “Sempre focada nos meus objetivos. O Paulo Lima, que foi meu diretor no programa Ponto G, brincava que ao me ver enxergava uma mulher no meio de uma floresta abrindo caminhos, com a mãe ao lado. Abrindo, abrindo, abrindo, abrindo. Ele me dizia que eu não parava nunca pra olhar e ver os muitos caminhos que percorri – que abri. Eu era essa mulher”.
E satisfeita com a mulher que se tornou, Galisteu anseia pela que virá: “Tenho muito a fazer. Quero ser líder total de audiência, atuar mais no teatro – acabei de lançar meu avatar! Quero abrir caminhos no Metaverso. Uma das coisas que eu falaria para a Adriane Galisteu do passado é: calma, o mundo não vai acabar e você não vai morrer amanhã. A gente se fala de novo quando você chegar aos 50”.
Ficha técnica ensaio
Direção criativa @decornautas @r_andreh Allex Colontonio (sem insta)
Fotografia @dom_diego
Figurinos/Instalações @brunoliveira
Produção @superdricks @rodrigobraulina @felippefefo
Arte botânica @_gabrielanora @_galeriabotanica
Styling @thidyalvis
Hair @fortesthiago
Make up @charlesgran
Pintura corporal @claudineihidalgo
Arte gráfica @pilints @andersonbmiguel @chrstoledo
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