Selton Mello está com tudo: em cartaz em dois filmes recordistas de público, ele também se desnuda em autobiografia


Só dá Selton! O ator, que comemora 52 anos em 30 de dezembro e contabiliza 40 de carreira, tem uma próspera trajetória artística que revisita em sua autobiografia ‘Eu me Lembro’, na qual 40 colegas e parceiros o entrevistam e ele compartilha memórias da sua vida profissional e pessoal. Fora isso, queridinho do cinema, ele protagoniza a já considerada maior estreia brasileira desde a pandemia, ‘O Auto da Compadecida 2’, que chegou aos cinemas nesta semana de Natal atingindo a marca de mais de 176 mil espectadores. O artista também pode ser visto em outro fenômeno: o longa ‘Ainda Estou Aqui”, indicado a grandes prêmios internacionais. Selton celebra o bom momento do cinema nacional, fala da relação com Guel Arraes, diretor de ‘O Auto da Compadecida’ e de sua sequência; e também de Ariano Suassuna, autor da peça que deu origem à produção. “Tenho muita gratidão pelo Suassuna. Li toda sua obra. Quando o conheci, ele me falou que ficou muito fã do Chicó que fiz, tanto que tinha o sonho de escrever uma nova peça com esse Chicó”. E diz ainda, o que esse personagem, que revive 25 anos depois, significa em sua história. “Ele é uma espécie de ‘anjo da guarda’. Seguiu comigo nesses anos todos me protegendo e poder fazê-lo novamente é uma bonita chance que a vida me deu. É muito emocionante e o meu personagem mais popular”

Já considerada a maior estreia de um filme nacional desde a pandemia, ‘O Auto da Compadecida 2’ lançado neste Natal (dia 25) levou até agora mais de 176 mil pessoas aos cinemas de todo o país. O longa superou na largada ‘Ainda Estou Aqui” – indicado a prêmios importantes, como o Globo de Ouro de Melhor Atriz Dramática para Fernanda Torres, e finalista a uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2025. O filme de Walter Salles contou com 50 mil espectadores em sua estreia, no início de novembro, mas já registra a impressionante marca de 2,5 milhões de espectadores até agora. Reconhecido pela versatilidade na pele dos personagens, o trabalho de Selton Mello pode ser conferido simultaneamente nos dois filmes e ele celebra o bom momento do cinema nacional.

Ao falar sobre o reencontro com Chicó após 25 anos na sequência de ‘O Auto da Compadecida‘, o ator se comove. “Ele é uma espécie de ‘anjo da guarda’. Seguiu comigo nesses anos todos me protegendo e poder interpretá-lo novamente é uma bonita chance que a vida me deu. É muito emocionante e o meu personagem mais popular”, diz ele, que comemora  52 anos em 30 de dezembro e contabiliza 40 de carreira. Celebremos Selton!

Mesmo tantos anos depois, o Chicó vem com a mesma pureza, graça, irreverência e com mais emoção. Este filme está mesmo ainda mais emocionante que o primeiro. É uma história essencialmente sobre amizade que é algo muito importante – Selton Mello

Selton Mello fala que personagem de 'O Auto da Compadecida 2' é 'anjo da guarda', diz que o filme é sobre amizade e celebra o cinema nacional (Divulgação)

Selton Mello fala que personagem de ‘O Auto da Compadecida 2’ é ‘anjo da guarda’, diz que o filme é sobre amizade e celebra o cinema nacional (Divulgação)

Sobre a composição do inesquecível personagem hoje, Selton analisa que “não tem muita diferença para o primeiro filme. Fui bem fiel à minha criação original do Chicó, ele só está mais velho. A ‘casca’ está diferente, mas na essência é a mesma criança, um palhaço. Na história, os personagens estão intactos e toda a trajetória deles é muito crível. As pessoas vão poder ir ao cinema e brincar novamente com esses personagens, algo raro, porque não sabemos quando essa oportunidade vai acontecer novamente”, frisa.

Ele também ressalta como o personagem ‘colou’ nele nos últimos anos: “Não dou um passo em qualquer lugar do Brasil sem que alguém venha me falar do Chicó. Todo mundo, independente da geração e da classe social, viu o ‘Auto da Compadecida‘. Tem gente que tem DVD, que sabe as falas, faz batalha de dublagem nas redes sociais. É algo muito poderoso. Quando falamos em fazer o segundo filme, fez sentido por tudo isso, e pelo amor que as pessoas sentem por essa dupla (Chicó e João Grilo, interpretado por Matheus Nachtergaele, o outro protagonista do longa). A produção é um carinho que a gente oferece ao público”.

Selton Mello e Matheus Nachtergaele em 'O Auto da Compadecida 2' (Divulgação)

Selton Mello e Matheus Nachtergaele em ‘O Auto da Compadecida 2’ (Divulgação)

Selton compartilha como se preparou para retomar o personagem. “A gente leu e ensaiou as cenas. Conheço o método e a linguagem do Guel (Arraes, diretor) muito bem. Fiz também ‘Caramuru‘ (2001) e meu filme predileto ‘Lisbela e o Prisioneiro’ (2003). Sou com orgulho um ‘ator do Guel’. Foi muito curioso, porque era como se eu só precisasse colocar a roupa e virava o Chicó de novo. Foi lindo demais, porque esses palhaços já estavam dentro da gente, apesar do longo tempo sem revê-los”.

E exalta mais uma vez a parceria de longa data com Guel: “Ele é a minha referência máxima, o cara com quem eu fiz meus maiores sucessos populares. Antes de trabalhar com o Guel, já era fã dele. Sou de uma geração que cresceu assistindo ‘Armação Ilimitada’, ‘TV Pirata’,
‘Comédia da Vida Privada’  (produções que Guel também dirigiu), e ali eu já comecei a ser parceiro dele, para a minha alegria. E pelo jeito para a alegria dele também, porque logo viramos companheiros inseparáveis e fizemos coisas muito bonitas juntos”.

Brincamos que o Guel Arraes é o Spielberg do sertão. Ele tem uma linguagem
muito própria, não tem ninguém no mundo que filme igual ao Guel. Ele é mais que um diretor, é um visionário, um inventor e isso é muito raro – Selton Mello

"Não dou um passo em qualquer lugar do Brasil sem que alguém venha me falar do Chicó. Todo mundo, independente da geração e da classe social, viu o 'Auto'" (Reprodução/Instagram)

“Não dou um passo em qualquer lugar do Brasil sem que alguém venha me falar do Chicó. Todo mundo, independente da geração e da classe social, viu o ‘Auto'” (Reprodução/Instagram)

Legado de Suassuna

O longa original de Guel Arraes é baseado na peça ‘Auto da Compadecida‘ de 1955 de Ariano Suassuna (1927-2014), com elementos dos espetáculos ‘O Santo e a Porca‘, ‘Torturas de um Coração‘ e ‘A pena e a lei‘, todas do mesmo autor. Além de ter influências do clássico ‘Decamerão‘ de Giovanni Boccaccio. Selton, que é um fã declarado de Suassuna, fala da relação com o dramaturgo a quem chama de mestre.

Tenho muita gratidão pelo Suassuna. Li toda sua obra. Quando o conheci, ele me falou que ficou muito fã do Chicó que fiz, tanto que tinha o sonho de escrever uma nova peça com esse Chicó – Selton Mello

"Suassuna ficou fã do Chicó que fiz, e tinha o sonho de escrever um novo espetáculo com ele" (Reprodução/Instagram)

“Suassuna ficou fã do Chicó que fiz, e tinha o sonho de escrever um novo espetáculo com ele” (Reprodução/Instagram)

Sobre Suassuna, um dos maiores expoentes da literatura brasileira, completa: “Quando falo da relação de gratidão é por que dei vida a um personagem icônico dele. O Chicó segue sendo amado por décadas e seguirá assim. Tem uma geração nova que não viu o primeiro ‘Auto‘, então vai ter gente que vai adorar ‘O Auto da Compadecida 2′ e aí vai ver o primeiro. Algumas pessoas vão preferir o primeiro, e tudo bem, vai existir sempre e é um clássico. O segundo vem para cravar um lugar na História do cinema”.

Uma vida revisitada

Selton está com tudo mesmo e não parece estar prosa. Além da elogiada performance como Rubens Paiva (1929-1971) – embora em breve aparição – no filme ‘Ainda estou aqui‘, que já é considerado um marco histórico do nosso cinema, com indicações a prêmios internacionais, ele também decidiu abrir mais sua intimidade em uma autobiografia, mesmo fazendo o estilo low profile ao longo da sua trajetória. O artista comemorou suas quatro décadas de carreira lançando este ano ‘Eu Me Lembro’ (Jambô Editora), que traduz memórias pessoais e profissionais, além de sua relação com a arte, através de perguntas feitas por 40 artistas, entre eles Fernanda Montenegro e Fernanda Torres, Lázaro Ramos, Zuenir Ventura, Marjorie Estiano e Fábio Assunção. “São pessoas com quem trabalhei ou admirava de alguma forma. Foram meus melhores entrevistadores, me ajudaram a lembrar de muitos fatos. Foi muito bom recordar. É gostoso ver que deu tudo certo”.

Na obra, o ator revelou que Chicó foi tão importante em sua carreira como na vida pessoal. Nos anos 2000, ele passava por um momento difícil e o personagem o salvou. “Para quem gosta de signo, somos dois capricornianos, focados no trabalho, tudo muito responsável. Mas, o Chicó me bagunça um pouco, azucrina minhas certezas, fala: ‘vai zoar’, e isso faz um bem espiritual”, analisa.

 "Fui bem fiel à minha criação original do Chicó, ele só está mais velho. A 'casca' está diferente, mas na essência é a mesma criança, um palhaço" (Reprodução/Instagram)

“Fui bem fiel à minha criação original do Chicó, ele só está mais velho. A ‘casca’ está diferente, mas na essência é a mesma criança, um palhaço” (Reprodução/Instagram)