“A arte está sendo uma ferramenta importante para as pessoas ficarem em quarentena e não surtarem”, diz João Cortês


O ator, músico, roteirista e diretor, fala do isolamento produtivo, mas no exercício da serenidade. Além disso, João revela que escreve um longa para Taís Araújo, sua colega na apresentação de “Popstar”, e também anuncia seu primeiro EP, enquanto pensa no “novo normal”, que teremos que encarar pós pandemia do coronavírus: “Talvez tenhamos que nos adaptar à uma nova normalidade de tudo. O futuro é incerto, mas sempre foi, ou não? Então vamos deixar que as coisas aconteçam no seu ritmo natural. Acho mesmo que sairemos fortalecidos, com outra visão do coletivo, do social, do que é o encontro entre as pessoas, talvez valorizando mais isso. Tudo que muitas vezes subestimávamos, hoje acho que estamos vendo sobre outro ponto de vista. No futuro, se tudo der certo, acho que vamos ponderar de uma forma mais sensata, sobre tudo”

*Por Brunna Condini

Há 45 dias em quarentena, na casa de praia família em Guaratuba, no Paraná, João Cortês tem experimentado tentar viver um dia por vez, buscando alguma serenidade. “Tenho tentando ser o mais produtivo possível, mas respeitando o meu tempo. Tenho escrito muito, terminei um curta-metragem, estou escrevendo um longa, e planejando aqui a filmagem do clipe do meu primeiro single, do disco que estou produzindo”, conta.

João tem consciência que é importante buscar alternativas para os momentos difíceis, até porque não sabemos até quando o cenário da pandemia do coronavírus e do isolamento podem durar. Como está lidando com a ansiedade? “Não vou mentir, têm dias bons e dias ruins. Estamos atravessando uma fase muito delicada da humanidade, difícil e desafiadora. É natural que a gente fique angustiado. Sinto que têm dias que estou muito ansioso mesmo, e acabo me afogando um pouco na minha ansiedade, na pressão que coloco em mim mesmo, na quantidade de informação e de coisas que absorvo do mundo. Desde notícias à Instagram”, compartilha. “Então, tem dias que sufoco um pouco. E têm dias melhores. Que acordo mais leve, mais disposto a criar, ser mais útil, mas acho que o principal é se respeitar, respeitar o seu tempo, esse exercício. Não entrar nessa de ter que ser produtivo todos os dias, toda hora, não se cobrar tanto. Permitir dias sem fazer nada, chorar, ficar emotivo. É um momento diferente, complexo que estamos atravessando, mas acredito, que ao mesmo tempo, sairemos mais fortalecidos”.

“Tem dias que sufoco um pouco. E têm dias melhores. Que acordo mais leve, mais disposto a criar, ser mais útil, mas acho que o principal é se respeitar, respeitar o seu tempo, esse exercício” (Divulgação/Globo)

Um novo “normal”

O Brasil é, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), considerado um dos países com mais ansiosos no mundo, são mais de 18 milhões de brasileiros sofrendo com transtornos de ansiedade, mesmo antes da pandemia. Existe um medo constante em relação ao futuro, e uma apreensão presente de quando teremos as nossas vidas “de volta”. Por isso, o ator acredita que cada vez mais é fundamental se cercar de hábitos que nos deixem bem, de alguma forma.  “Não sabemos quanto tempo isso tudo vai durar, onde vai dar, se vai passar logo ou não, mas acho que temos que nos manter fortes, compartilhar nossa arte, mantermos esse fluxo de conexão, de compartilhamento de amor, solidariedade e força, porque estaremos mais fortes depois como sociedade, como raça humana”, diz João.

Recentemente, ele escreveu e dirigiu o longa-metragem “Nas Mãos de Quem Me Leva”, um drama que fala de empoderamento e superação. E já prepara outros roteiros na quarentena. Um, inclusive, sendo escrito para Taís Araújo, hoje sua amiga pessoal, e colega na apresentação de “Popstar”. “Estou escrevendo uma protagonista para ela. Ainda não posso falar muito do projeto. Taís já leu algumas coisas e ficou super interessada. Mas ainda é um projeto que está no início, então prefiro falar mais depois. É um drama policial, que trata de um assunto muito sério, mas a ideia é fazer algo que prenda as pessoas. Estamos conversando muito”.

“Estou escrevendo uma protagonista para Taís Araujo. Ainda não posso falar muito do projeto. Taís já leu algumas coisas e ficou super interessada” (Divulgação)

Aos 24 anos, o ator, roteirista, diretor e cantor, tem trabalhos gravados antes do período de recolhimento, com estreias previstas ainda para este ano: a produção americana-brasileira “O Hóspede Americano”, da HBO, que conta a história do ex-presidente americano Theodore Roosevelt e Marechal Rondon, quando ambos partiram em uma expedição no Rio da Dúvida, em Rondônia, no começo do século 20. Roosevelt será interpretado por Aidan Quinn. A série conta também com Chico Diaz e Theodoro Cochrane no elenco. “Esse foi um dos trabalhos mais intensos da minha vida. Fiquei 45 dias na Amazônia filmando, com uma equipe enorme e talentosa. Meu personagem é o Tomás Reis, o cinegrafista de expedição, em 1914, pela Amazônia. O Tomás, foi o braço direito do Marechal Rondon, papel na série do Chico Diaz. O Tomás foi um dos primeiros documentaristas do Brasil”, conta.

João também é um dos protagonistas da série “Sala dos Professores” do canal CineBrasil! A trama retrata a rotina de professores e diretores de uma escola particular em São Paulo, a Nova Vanguarda. “Faço o Daniel, um professor de literatura, que chega novo no colégio e tenta se inteirar. É um personagem mais velho que eu, tem quase trinta”.

Inquietude

A natureza do carioca é polivalente, desde o início do trajeto como artista, aos 12 anos. Que necessidade de expressão múltipla é essa? “Sempre tive isso em mim, sempre fui inquieto, expressivo, expansivo. Gostava de entreter as pessoas, fazer humor, isso faz parte de quem eu sou. Mas acho que, por que busco, fui aos poucos, descobrindo outras novas formas que poderia explorar”, analisa. “Comecei como ator, mas tudo que faço parte do meu desejo de expressão, sempre muito grande. Acho que é um equilíbrio entre a minha percepção do mundo, com o que acontece aqui dentro: minhas questões, meu emocional, meus conflitos, epifanias. Acho que como artista, temos que pegar tudo que sofremos, vivemos, sentimos e pensamos, e expressar de alguma maneira. Me sinto completamente apaixonado pela arte, e cada vez mais, quero expressá-la das maneiras possíveis”.

“Acho que como artista, temos que pegar tudo que sofremos, vivemos, sentimos e pensamos, e expressar de alguma maneira. Me sinto completamente apaixonado pela arte, e cada vez mais, quero expressá-la das maneiras possíveis” (Divulgação)

João é feliz com a condição de observador da vida, e é um fazedor nato, o que ele vê de forma natural, fluida. Tanto, que vem trabalhando em seu primeiro EP, Elevador Gourmet, com calma, mesmo antes da pandemia, tentado amadurecê-lo, para lança-lo ao mundo. “Esse disco já está para sair faz um tempo, mas por conta dos meus trabalhos como ator, diretor e roteirista, prorroguei o lançamento do álbum. Já estou com quatro músicas prontas, estou ansioso para mostra-las para o mundo, compartilhar esse som com as pessoas”, revela. “Com a quarentena, não sabemos exatamente como será. A ideia era filmar os clipes, para lançar as músicas junto. E agora, no isolamento, aproveito para dizer que vou filmar o primeiro clipe, e lançar uma das músicas já com o clipe, da quarentena mesmo. A canção é “Não estranha, não”, e depois virão outras. Neste trabalho, misturo minhas músicas autorais, com novos arranjos de músicas conhecidas, de jazz e blues, com as do Michael Bublé, Michael Jackson, Cazuza, Djavan”.

Como acredita que esse período que o Brasil e o mundo estão vivenciando, serão lembrados no futuro? “Acho que esse momento vai realmente ficar marcado na história da humanidade. Porque é um momento ímpar, mesmo não sendo algo bom. O mundo inteiro está passando pela mesma coisa, com diferentes impactos. Vamos atravessar isso, o mundo vai voltar ao normal, talvez não seja o mesmo normal que estávamos acostumados. Talvez tenhamos que nos adaptar a um novo normal. O futuro é incerto, mas sempre foi, ou não? Então vamos deixar que as coisas aconteçam no seu ritmo natural. Acho mesmo que sairemos fortalecidos, com outra visão do coletivo, do social, do que é o encontro entre as pessoas, talvez valorizando mais isso. Tudo que muitas vezes subestimávamos, hoje acho que estamos vendo sobre outro ponto de vista. No futuro, se tudo der certo, acho que vamos ponderar de uma forma mais sensata, sobre tudo”.

“A arte nunca foi tão valorizada. Está sendo uma ferramenta importante para as pessoas ficarem em quarentena e não surtarem” (Reprodução Instagram)

Se pudesse ser um porta-voz de mudança no país, o que gostaria de anunciar? “Nossa, capricharam nesta pergunta mesmo (risos). É uma responsabilidade muito grande responder. Mas se eu pudesse ser esse porta voz de aspectos para a mudança, diria primeiro para termos calma. Diria para as pessoas meditarem, respirarem, e cada vez mais entrarem em contato com seu interior. E não ficarem se preenchendo e se poluindo só de informações. Limparem a mente, se desintoxicarem um pouco, e tentarem entrar em contato com sua voz interior, se escutarem”, aconselha. “Isso tudo vai passar, vamos passar por isso. Sairemos mais fortalecidos e o Sol nos espera do outro lado. Tenho certeza. E vão ser dias lindos, vamos voltar para a rua, os teatros vão voltar a ficar cheios, os cinemas, os restaurantes, os shows, as celebrações. Acho que vamos ter que nos adaptar os novos modelos de vida, por conta do vírus. Mas faz parte da experiência humana. Outra coisa, é que a arte nunca foi tão valorizada. Está sendo uma ferramenta importante para as pessoas ficarem em quarentena e não surtarem. E pensar que ano passado, a arte e a cultura foram tão desvalorizadas, tão martirizadas, mas agora, em um momento tão difícil, veio a resposta paras as pessoas entenderem que a arte é ferramenta essencial para a existência do ser humano”.