Zé Renato, do Boca Livre: “A música brasileira é uma das últimas reservas de criatividade no planeta”!


Em entrevista exclusiva, o vocalista do grupo conversa sobre sua volta, o novo disco, os artistas independentes e o show neste final de semana, no Rio! Confira!

“Amizade não é só um mar de rosas”. Foi assim que Maurício Maestro definiu a volta do Boca Livre, nesta quinta (16), no Teatro Rival, depois de 18 anos sem subirem juntos ao palco. Em temporada neste último final de semana, o grupo vocal – de grande sucesso nas décadas de 1970 e 1980 – embarca em nova turnê com o objetivo de celebrar os 35 anos de carreira, embora os músicos tenham passado boa parte desse tempo em separado, trabalhando em projetos individuais. Além disso, a banda agora aproveita para divulgar o disco “Amizade”, lançado em outubro do ano passado, sob forma de dedicatória àqueles bons anos passados em conjunto.

A temporada foi sucesso nos três dias de espetáculo e, mesmo na estreia, na última quinta, o público lotou o local, com o show começando mais tarde em decorrência da chuva torrencial. Neste dia, Maurício Maestro (contrabaixo e vocal), Zé Renato (violão e vocal), David Tygel (viola e vocal) e Lourenço Baeta (flauta, violão e vocal) começaram o show uma hora atrasados – a fim de que houvesse tempo para todos os fãs se acomodarem na casa. Por volta de 20h30, deram início à noite com o sucesso “Oriente”, de Gilberto Gil, abrindo a sequência de baladas românticas que costumavam embalar as noites de amor durante três décadas e meia. Mas, desta vez, o quarteto privilegia as canções do novo trabalho, todas garimpadas pelo grupo ao longo de dois anos com a proposta de formar um repertório inovador que se adequasse à essência do novo álbum.

Portanto, foram recebidas pelo público, com palmas e gritinhos em uníssono, músicas como “Baião do Acordar” (Novelli), “Tempestade” (Chico Pinheiro e Chico César), “Terra do Nunca” (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro), a balada “Mistério do Prazer”, composta por Zé Renato, Claudio Nucci e Juca Filho, e “Amizade”, faixa-título do novo trabalho, escrita por Mauricio Maestro e Marcos Valle. Porém, um bom show não se faz só com inéditas e, no setlist romântico, também foi possível conferir clássicos como “Toada”, “Quem tem a viola” e “Mistérios”.

Nos bastidores, aproveitamos para bater um papo com Zé Renato, que nos contou, com exclusividade, sobre o processo de criação do novo disco, sua motivação para retornar aos palcos e ainda comentou sobre os cantores iniciantes que optam por uma carreira independente. Confira abaixo!

Boca Livre completa 35 anos de carreira (Foto: Divulgação/Frederico Mendes)

Boca Livre completa 35 anos de carreira (Foto: Divulgação/Frederico Mendes)

HT: Depois da pausa de 18 anos, o que motivou o grupo a voltar aos palcos?

ZR: Nossa maior motivação foi o próprio desejo de renovar o repertório e dar continuidade à nossa trajetória, interpretando músicas que privilegiam melodias e harmonias que caracterizam a canção brasileira.

HT: Como foi o processo de escolha do repertório inédito?

ZR: Seguimos o mesmo caminho de sempre, dos trabalhos anteriores. Cada integrante trouxe suas sugestões e fomos experimentando exaustivamente em cada ensaio, até fecharmos por completo, de modos que todos ficassem satisfeitos.

HT: Qual é a chancela que o grupo buscou para imprimir neste disco de comemoração dos 35 anos de carreira?

ZR: O grupo possui uma sonoridade vocal que, somada aos violões, resulta em um timbre característico. Neste disco, assim como em outros trabalhos anteriores, procuramos sempre preservar nosso estilo mas, claro, inovando o repertório, convidando músicos para fazer participações e privilegiando essa sonoridade sedimentada ao longo da carreira.

HT: O primeiro disco do Boca Livre, em 1979, foi lançado de forma independente. Atualmente, muitos músicos da nova geração seguem essa mesma vertente para construir sua trajetória. Como vocês avaliam um artista independente nas décadas de 1970/80 e o que o difere daqueles que vivem o momento atual?

ZR: As facilidades proporcionadas pela divulgação na internet, assim como a distribuição, talvez sejam as principais diferenças. Quando lançamos nosso primeiro disco, a produção independente ainda engatinhava, e nós, apesar do sucesso relativamente rápido, tivemos que lidar com a precariedade de condições para distribuir e divulgar o material. Depois, apesar de algumas dificuldades conseguimos tornar o grupo conhecido em quase todo o país.

HT: Na década de 1990, o Boca Livre chegou a participar de festivais de música no Canadá, Europa e Estados Unidos. Entretanto, atualmente, os festivais no Brasil acabam dando mais destaque para a música internacional do que para os músicos daqui. Vide o que aconteceu nesta última edição do “The Voice Brasil”. Vocês acham que isso acaba gerando, para os estrangeiros, uma impressão de que não valorizamos nossa cultura?

ZR: Não sei, talvez. Mas o fato é que a música brasileira é uma das últimas reservas de criatividade do planeta e isso é inquestionável, ponto pacífico neste mundo globalizado.

HT: O que falta na música brasileira atualmente?

ZR: Falta ela ser mais vista e ouvida pelos brasileiros, como bem disse Gilberto Gil: “O povo sabe o que quer, mas também quer o que não sabe”.