Wanessa Camargo abre o coração sobre volta aos palcos, família exposta, a ‘inquisição’ na web e reencontro com Dado


Com sinceridade, peito aberto e sorriso no rosto, Wanessa fala sobre várias passagens da vida – desde a hipotética de rivalidade com Sandy, internacionalização da carreira à relação com os haters na Internet e fakenews. Desde muito cedo nas manchetes de jornais e sites, Wanessa lidou com a pressão de padrões estéticos, os desafios de ter a família exposta na mídia e a redescoberta do amor após um difícil divórcio – “É a minha chance de feliz”, diz sobre a relação com Dado Dolabella. Empolgada com o novo projeto musical, a cantora também descreve o show que marca o seu retorno aos palcos após um período sabático. E ele traz em seu nome a essência deste momento de vida de Wanessa: “Livre”. “O fio condutor desse show é a minha história. A de uma mulher em busca da liberdade. E isso me emociona muito”, frisa

*por Vítor Antunes

A palavra de ordem é “liberdade”. Após um período sabático, Wanessa Camargo volta à cena artística com as delícias de ser o que é: livre. Este inclusive, é o nome do novo show e do projeto de retomada da artista aos palco e que inclui passagem pelo Rio. “É um comeback mesmo. Estou reconstruindo a minha carreira”, pontua a cantora. O plano de Wanessa é tão grandioso quanto o número de hits que emplacou desde que deu por iniciada a sua carreira, em 2000. Algumas das apresentações de “Livre” já correrão pelo país este ano e a cantora já têm alguns EP’s disponíveis nas plataformas digitais, bem como CD’s colecionáveis à venda em seu site. O show, de três horas, também comemorativo, celebra a longevidade de sua trajetória. Os imorredouros sucessos como “O Amor não Deixa” e “Apaixonada por Você” estarão costuradas com as novas canções como “Fragmentos” e “Não Devo Nada“.

Aproveitando-se da canção que afirma que ela não deve nada, Wanessa falou com muito destemor sobre todos os temas que orbitam sua carreira: ter a família exposta desde cedo, a rivalidade fictícia com Sandy, a retomada do namoro com Dado Dolabella, e a quem ousa falar sobre ser uma cantora sem estilo musical definido, ela rebate: “Quem conhece a minha obra, os meus álbuns de cabo a rabo vai ver que todos eles são coerentes com aquilo que acredito. Em todos eles há a minha impressão e a minha essência”. Além destes pontos mais sensíveis, a artista revela o motivo de não ter investido em uma carreira internacional, bem como as razões que a fizeram trabalhar tão pontualmente na carreira de atriz e a sua quase estreia em um musical. Aos 40 anos, Wanessa acredita que a maturidade lhe trouxe mais temperança e que seu público amadureceu junto com ela. “É bacana ver que meu público sente ressonância naquilo que eu vivo”, frisa.

Sempre fui questionada por minha arte. Artista é alguém que está sempre em construção. Arte não é algo sólido – Wanessa Camargo

Todas elas num só ser. Wanessa revisita sua singular pluralidade em duas décadas de sucesso (Foto: Divulgação)

TRÊS ATOS DE LIBERDADE 

A primeira aparição de Wanessa na televisão como cantora foi por volta de 1998 interpretando o tema de “Titanic” (1997) – numa apresentação no programa da Hebe Camargo (1929-2012) -, que a própria cantora classifica como “desastrosa”. Dois anos depois, mais amadurecida  e após enviar algumas demos, teve, finalmente o seu primeiro disco lançado no final de 2000. Com uma trajetória artística plural, Wanessa mergulha na sua própria história e nos seus sentimentos em “Livre”, seu novo projeto. Conta-nos ela que o trabalho “advém de uma construção. Quando começo a pensar este álbum, imagino coisas que falam comigo, ao meu coração. O fio condutor do show é justamente a possibilidade de contar uma história com a minha própria voz, e com esse jeito de ver o mundo”.

Em razão da pandemia, na qual não pôde comemorar as duas décadas de carreira, a Tour “Livre” aglutina sucessos com músicas do trabalho novo e canções lado B. “O primeiro ato do show traz minha obra com um recorte mais empoderado. Neste, músicas como “Livre” e “Amor Amor“. O segundo ato mostra meu lado mais romântico, sensível, então consta de músicas como “Tanta Saudade“, “Filme de Amor” e a nova, “Fragmentos”. O terceiro é mais festeiro, mais farofa e conta com músicas como “Shine it On“.  As próximas apresentações de “Livre” são em agosto nas praças Rio, Belo Horizonte e Curitiba”.

O fio condutor desse show é a minha história. A de uma mulher em busca da liberdade. E isso me emociona muito – Wanessa Camargo

Wanessa Camargo na Hebe no fim dos anos 1990 (Foto: Reprodução/SBT)

Durante sua carreira, Wanessa foi duramente questionada por transitar em vários estilos musicais: o primeiro disco tem uma cara mais teen-pop, “DNA”, mais pop eletrônico; “33” mais sertanejo. Essa fluidez estilística gerou um ruído entre os críticos, algo que ela discorda com veemência: “Quem for ao meu show vai ver coerência e parar de pensar que eu fiz muitos estilos. O fã que me conhece e meus álbuns de cabo a rabo vai ver que todos eles são coerentes com o que acredito, com a minha essência e que sempre brinquei com os estilos. Isso esteve presente em tudo o que fiz em alguns álbuns mais que em outros. Quem ouve o “DNA“, disco tido como mais pop, vai ver ali músicas românticas. No show, eu canto “O amor não deixa“, do primeiro disco, ao lado de “Coração Embriagado“, do álbum “33”, tido como sertanejo, e elas parecem irmãs. O show se propõe a entregar essa viagem musical. Eu não tive uma trajetória reta, eu fiz curvas”.

“ISSO FEZ A MULHER QUE EU SOU. VOCÊ CONHECE A MINHA HISTÓRIA”

A frase acima é a tradução livre de um dos versos de “Fly” um dos maiores sucessos da carreira da Wanessa. Na época, a cantora tirou o Camargo do seu nome artístico, pois dizia-se que ela queria investir na carreira internacional. “Fly” era cantada em inglês e tratava-se de um feat com o rapper norte-americano Ja Rule. O buzz em cima da cantora foi tão intenso e até indelicado, que ela, não raras vezes foi creditada como Wanessa ex-Camargo. Alguns anos depois, a cantora diz que essa intenção internacional efetivamente não existiu. Era apenas uma linguagem artística: “Foi legal cantar músicas em inglês, apesar de não ter feito um trabalho internacional de fato. Eu não quis divulgar e fazer nada lá fora. Era algo voltado ao meu público nacional mesmo. Havia uma demanda para uma carreira internacional, mas para isso eu teria que sair do país. Optei por não deixar o Brasil e por manter minhas raízes aqui. Logo depois, eu me tornei mãe. Mas isso não quer dizer que eu negue as oportunidades de fazer um trabalho novo, como para entender o mercado latino. Essa mistura de trazer artistas internacionais enriquece. Não foram muitas parcerias, mas foram enriquecedoras e pelas quais eu tive um carinho grande. Eu funciono assim, com gente com quem eu tenha história, entrosamento, amizade”. Além de Ja Rule, Wanessa fez uma parceria com outro rapper, o Souja Boy e o grupo mexicano Camila.

“Wanessa…”/ “Hey, Ja Rule” – Todo fã de Wanessa conhece o diálogo inicial de “Fly”, música de 2009, que compõe o primeiro ato do show “Livre” (Foto: Tinhu Lopes/Divulgação)

Wanessa teve experiências pontualíssimas como atriz e apresentadora. Esteve à frente do “Jovens Tardes“, programa de 2002 exibido pela Globo, e no ano anterior, debutou como atriz em “Xuxa e os Duendes“. Perguntamos se ela voltaria a desempenhar a função de atriz e ela disse não ter intenção imediata de fazê-lo. “Não pretendo, mas não descarto. Se houvesse a oportunidade de fazer um teatro musical bacana, eu faria. Sempre tive vontade e nunca consegui. Quando surgiu a oportunidade, não pude. Mas um dia quem sabe?… Meu foco é a música. Eu estou louca para começar a compor de novo”. Investir na composição é algo que efetivamente direciona o lugar de fala para sua intérprete: “Tem homens que escrevem lindamente para mulher, bem como acontece o contrário, mas nunca vai ser igual. O meu lugar não é apenas o de uma mulher compositora, mas de uma mulher contando a sua própria história. Eu mesma trago coisas minhas, frases, emoções que me tocam e percebo que isso faz toda a diferença”, divide.

Wanessa Camargo em “Xuxa e os Duendes”. A artista teve experiências pontuais como atriz (Foto: Acervo/Site Wanessa Camargo)

Quando o pai, Zezé Di Camargo, e o tio, Luciano, explodiram nas rádios com “É o Amor“, em 1990, a cantora tinha 8 anos. Ou seja, desde muito pequena encontra-se com os holofotes sobre si e à sua família. De lá para cá muitas coisas aconteceram, como o divórcio de seus pais, o sequestro de seu tio Wellington e o fim do casamento com o empresário Marcus Buaiz, no ano passado. Tudo gerou grande comoção e mesmo os assuntos mais delicados nem sempre foram tratados com gentileza. Por vezes, a descortesia antecipou a notícia. Perguntamos à artista como ela lida com estes fatos que tornam muito misturados os conceitos de vida íntima e vida pública. “É muito triste ver fofocas envolvendo seu nome, fakes, ofensas… Priorizo o real, o carinho das pessoas para comigo, as pessoas que acompanham a minha carreira e sabem quem eu sou. Como ser humano tento ter minha liberdade sem machucar ninguém, sem derrubar ninguém. E tenho a humanidade de reconhecer os meus erros. Essa é minha regra mor”. Sempre permeada por fãs e haters, Wanessa diz que aos “odiadores” ela não dá plateia. Dá block: “São pessoas que precisam de amor próprio. Ninguém xinga na Internet se não estiver bem consigo mesma. Quem está feliz não incomoda ninguém”.

Ante a avidez dos cliques, Wanessa exalta o bom relacionamento com a imprensa: “Quando há alguma coisa que não é legal, eu converso com os jornalistas”. Hoje em dia, há uma grande quantidade de desinformação circulando pelas redes e com veículos nanicos e pouco confiáveis. O que gera na artista uma ponderação maior no agir: “Quando é uma mentirinha menor, eu às vezes fico preocupada em desmentir e acabar transformando em fogueira o que era uma chama. Há pessoas que falam horrores de nós, sem ligar para os nossos sentimentos e alguns nem jornalistas são e se acham nesse direito. A estas pessoas, eu recorro ao meu advogado para agir judicialmente”.

Quando eu nego algo é por que, efetivamente, não trata-se de verdadeiro. Já vivi situações delicadas com pessoas que amo e que me pediram que eu desmentisse e eu não o fiz por ser algo que aconteceu realmente. Eu prezo a credibilidade – Wanessa Camargo

Wanessa apresentando o “Jovens Tardes”. O programa fez sucesso na tela da Globo nos Anos 2000 (Foto: Reprodução/TV Globo)

Conviver com alguns rótulos impostos pela sociedade e até por outras artistas foi, claro, bem difícil para a cantora. Alguns dos que tentaram imprimir em Wanessa foram o da sensualidade e o da rivalidade. Ao ver da artista, trata-se de algo “complexo”. E ela afirma: “Claro que eu, quando comecei, queria me sentir sexy. Me colocavam assim e assim eu queria me sentir, especialmente por ter inseguranças com relação ao meu corpo. Eu não tinha esse olhar de beleza para comigo. Fui entendendo com o tempo que eu podia me sentir bonita e ter uma melhor relação com o espelho. Nós podemos nos sentir bonitas sem que para isso precisemos da validação do outro. Lançar mão do artifício da sensualidade deve ser uma escolha da mulher. Mas houve uma época em que isso se impôs, acreditava-se que era isso que vendia. Hoje, eu compreendo que o púbico quer ver a nossa verdade, o que há de melhor em nós”.

Nessa mesma época também foi inventada uma rivalidade com Sandy. Coisa que, entre elas, nunca existiu: “Vimos com o tempo que tínhamos que mudar isso. E não adiantava criar uma situação para que isso acabasse. Ela e eu somos muito verdade e hoje pudemos externalizar. Hoje temos uma parceria de vida além da musical. O mais legal da nossa relação é isso. É uma bobeira essa coisa do só pode gostar de uma e não gostar de outra”.

Wanessa Camargo e Sandy no Domingão com Huck (Foto: divulgação/TV Globo)

EU NÃO VOU DEIXAR DE AMAR, NEM DE SONHAR

A frase acima é um trecho do primeiro hit da cantora: “O Amor não Deixa“. Conforme dito anteriormente, 2000 foi o ano marco da carreira de Wanessa. Em 2002, o primeiro programa. Em 2012, nasceu José, seu filho. Em 2015, no programa de Gugu Liberato (1959-2019) uma falha do playback transformou “Shine it on” em “Xainirô“. Com sua a criatividade inata, a cantora soube como capitalizar em cima disso e ver com leveza, de modo que “Xainirô” hoje é nome de bloco de carnaval. Em 2022, a cantora completou 40 anos. “Simboliza maturidade. Vejo a vida e o tempo passarem de outra forma. Meu público cresceu, e hoje é, especialmente, composto de pessoas nascidas entre as décadas de 1980 e 1990. Elas vivem as mesmas questões e conflitos que eu. Não cabe mais nas músicas falar sobre primeiro amor, balada, relação com os pais, porque essas pessoas, assim como eu, vivem outras situações, como a maternidade, a relação com o trabalho, a reposição com a vida e o redirecionamento de rota, ou separações e novos relacionamentos”.

Divorciada em 2022, Wanessa iniciou neste ano um novo relacionamento com o ator Dado Dolabella. A palavra “novo” não é inadequada. Ambos já haviam estado juntos no início dos anos 2000 e, agora, assumiram uma relação. Nova, afinal, ambos não são os mesmos meninos de vinte e tantos anos atrás e carregam junto a si uma história. Perguntada sobre Dado e esse reencontro, Wanessa abriu um sonoro sorriso: “É a minha chance de feliz”.

Quando perguntamos à Wanessa o que a faz ver música na vida, ela disse ser “amar as pessoas, ter luz, estar com amor e em família. Essa é a beleza da vida”. Talvez diante dos desafios da vida não soubesse que cantaria a canção do bem querer. O amor – que mexe com sua cabeça e a faz assim – revela-se sem anestesia. Arde de doce, e em nada traz cá, amargo. Queima, acalma, canta, vive e (re)nasce.

O reencontro de Dado e Wanessa: “Minha chance de ser feliz” (Foto: Reprodução)