Uma semana depois do show histórico dos Paralamas, em Brasília, a capital do rock, com Herbert Vianna mostrando o pulsar da arte falando mais alto, mesmo ele passando mal e precisando se afastar do palco por alguns minutos depois da vista “escurecer muito”, e, ao voltar, desabafar com o público que estava vendo “a hora de apagar e sair de maca” e mandar um recado a todos os amigos que eram meus colegas de escola, de quadra, de transporte. Enfim, vamos em frente, rapaziada, vamos até o sol se pôr”, e ainda Bruno Gouveia, vocalista da banda Biquíni Cavadão, receber a solidariedade e boas energias do público que o viu tirar os óculos diante tanta emoção, mesmo ainda tendo sido submetido a uma cirurgia para a retirada de um tumor na altura da pálpebra, o Rock Brasil 40 anos, evento que celebra o rock da década de 80 com atrações que proporcionam ao público fazer uma viagem sensorial no tempo, no palco do CCBB, mandou ver em atrações incríveis. Conferimos os shows de Paulo Ricardo e Barão Vermelho.
Paulo Ricardo falou sobre “Rádio Pirata Ao Vivo”, que celebra o espetáculo divisor de águas do show business brasileiro dos anos 80 e um dos álbuns mais vendidos da história da música nacional. Há tempos os fãs de todas as idades pediam que Paulo Ricardo voltasse a apresentar o repertório do show histórico de 85, dirigido por Ney Matogrosso, lançado posteriormente em um álbum que é, até hoje, o mais vendido da história da música brasileira. “Em poucos meses, a música Rádio Pirata, do RPM, estava em primeiro lugar nas paradas de todo o Brasil, pasmem, sem que houvesse sido lançada em nenhum disco. Assim, decidimos registrar o álbum Rádio Pirata ao vivo, gravado no Anhembi em Sampa, mixado em Los Angeles, que permanece até hoje como o álbum mais vendido da história do Brasil, assim como a turnê, que quebrou todos os recordes dos lugares por onde passou. Foram 250 shows em 15 meses para mais de 2,500,000 de pessoas”, conta Paulo Ricardo no seu site. E mandou ver no palco do Rock Brasil 40 Anos:
“Abordar navios mercantes
Invadir, pilhar, tomar o que é nosso
Pirataria nas ondas do rádio
Havia alguma coisa errada com o rei
Preparar a nossa invasão
E fazer justiça com as próprias mãos
Dinamitar um paiol de bobagens
E navegar o mar de tranqüilidade (…)
Assim que entrou no palco, Paulo Ricardo lembrou os tempos do RPM com Revolução Por Minuto, que cita Brasil e um contexto dos anos 80:
80:
“Sinais de vida no país vizinho
Eu já não ando mais sozinho
Toca o telefone
Chega um telegrama enfim
Ouvimos qualquer coisa de Brasília
Rumores falam em guerrilha
Foto no jornal
Cadeia nacional, uou! (…)
E o público foi ao delírio com Alvorada Voraz ante de Paulo Ricardo mandar seu recado: “Na adolescência, eu comecei a formar meu gosto pelo rock e fonte constante de inspiração para as letras que escrevo. Bem-vindos aos 35 anos de Rádio Pirata ao Vivo. Nosso primeiro show no Park Shopping, na tenda de um circo. Quem estava lá?”, perguntou à plateia. E prosseguiu falando da atual guerra entre Rússia e Ucrânia e gritou: “Ucrânia!”
Paulo Ricardo ainda comentou sobre a morte de recente de Ray Liotta, astro do clássico de Martin Scorsese, em ‘Os Bons Companheiros’, durante o sono devido a causas desconhecidas enquanto filmava “Dangerous Waters”, na República Dominicana. Ele era produtor também e tinha 67 anos. “Em seguida, morreu o batera do Yes, Alan White, um dos integrantes mais antigos da banda de rock progressivo, que gravou também Imagine, com John Lennon. E, por último, o fundador e tecladista do Depeche Mode, Andrew Fletcher, uma das bandas mais influentes do sinth-pop britânico. E escolhi uma música em homenagem a toda essa galera, que fez algo maravilhoso e inesquecível: Sob a luz do sol”
(…) Já não morro mais de medo que o tempo escorra pelos dedos
Já não vejo quase nada sob a luz do sol
Quero a cidade vazia o clarão do dia me ofusca a visão
Minha cabeça lateja meu corpo cansado se espalha no chão (…)
E o público foi ao delírio quando Paulo Ricardo desceu do palco e cantou recebendo o carinho do público que o tocava. A música escolhida foi London London:
Go looking for flying saucers in the sky
While my eyes
Go looking for flying saucers in the sky
Choose no way
I just happen to be here
And it’s okay (…)
Para o amigo, Ney Matogrosso, que assinou a direção do show mais emblemático dos anos 80, Rádio Pirata, Paulo Ricardo cantou “Flores astrais“, composição de Ney, de 1974, quando integrava os Secos e Molhados:
“Um grito de estrelas vem do infinito
E um bando de luz repete o grito
Todas as cores e outras mais
Procriam flores astrais
Um verme passeia na lua cheia
Um verme passeia na lua cheia (…)
No site oficial de Paulo Ricardo, há um relato de Ney sobre esse encontro com Paulo Ricardo: “Conheci o Paulo Ricardo bem antes, quando ele era jornalista e escrevia para uma revista de música. Durante uma entrevista, ele me contou que tinha uma banda e tudo mais. Um tempo depois, quando “Louras geladas” começava a tocar timidamente no rádio, o empresário Manoel Poladian me disse que estava buscando uma banda de rock e eu sugeri que ele ouvisse os meninos. Depois de contrata-los, Poladian me perguntou se eu queria dirigir o show e a minha condição pra aceitar foi que ele me desse carta branca e condições pra fazer tudo que eu pedisse. Assim foi feito e o show teve uma produção escandalosa! A minha inspiração veio toda do filme Blade Runner: tinha raio laser e luz neon em toda a beirada do palco, que parecia uma nave espacial. Foi um fenômeno para a época”.
E, é claro, que não podia faltar o tema de abertura do Big Brother Brasil, que há 22 edições é cantado por Paulo Ricardo:
Se você soubesse o que fazer
O que você faria
Aonde iria chegar?
Até onde vai a sua fé
O que você faria?
Pagaria pra ver (…)
E vamos falar do Barão Vermelho que também fez um show maravilhoso, incluindo canções como Ponto Fraco.
“Benzinho, eu ando pirado
Rodando de bar em bar
Jogando conversa fora
Só pra te ver
Passando, gingando
Me encarando
Me enchendo de esperança
Me maltratando a visão”
E o rock rolou direto com o hino do Barão, Bete Balanço. E todos relembraram o sucesso que a música composta por Cazuza (1958-1990) fez de Norte a Sul do país. A banda de rock, juntamente com Legião Urbana, Os Paralamas e Titãs, é uma das mais influentes do rock nacional da década de 80, difundindo o gênero musical.
“Pode seguir a tua estrela
O teu brinquedo de star
Fantasiando um segredo
No ponto a onde quer chegar
O teu futuro é duvidoso
Eu vejo grana, eu vejo dor
No paraíso perigoso
Que a palma da tua mão mostrou
Quem vem com tudo não cansa
Bete balança, meu amor
Me avise quando for a hora (…)
Em 2017, o grupo anunciou o retorno ao cenário cultural brasileiro, mas sem Frejat nos vocais e com Rodrigo Suricato assumindo a posição. Honrado em fazer parte do Barão Vermelho, o músico contou que irá levar um novo ar para o grupo de rock. “O Barão é uma banda que, no lugar que eu estou hoje, já teve Frejat e Cazuza. Mas eu só consigo ser eu mesmo. Ficaria ridículo se eu tentasse imitar a posição de alguém. Para mim, o grande indispensável não é um artista ou outro, é a vida. Então, eu fico feliz em poder estar sucedendo, e não substituindo, o Frejat”, nos disse à época Suricato.
“Quando entrei na banda, encontrei integrantes ávidos por mostrar novidades, afinal era uma criatividade que sempre foi pulsante. Eu fiquei muito feliz de integrar esse time, porque eu já entrei ‘Suricato’ e eu pude assumir minha personalidade trazendo bagagem para essa incursão. Cheguei de coração aberto, sem disputa de egos. Fora que eu sempre fui muito fã dos caras, tinha uma euforia aí”, revela Rodrigo Suricato, que já ganhou um Grammy Latino e subiu aos palcos do Rock in Rio e do Lollapalooza.
O disco Viva!’, em 2019, foi desenvolvido a quatro mãos (Guto Goffi, Rodrigo Suricato, Fernando Magalhães e Maurício Barros). Foi a maneira que eles encontraram para dar luz à criatividade e voltar a produzir sob o legado do Barão. Desde 2004, os músicos se dividiam entre projetos solos e turnês comemorativas. Na maioria das vezes, esses retornos dependiam demais da agenda de Frejat, que, a partir de 2001, assumiu carreira solo.
No show, em Brasília, a Cidade do Rock, o Barão, entre várias músicas, cantou Porque a gente é assim?
E não desgruda de mim
Vê se ao menos me engole
Mas não me mastiga assim
Antes que a terra nos coma
Cem gramas, sem dramas
Por que que a gente é assim? (…)
“Alô, Brasília. Como diria Cazuza, essa é a versão velha de uma nova história, que não começou ontem e certamente não vai terminar amanhã. Respeitem tudo o que tem pelo menos 40 anos de idade nessa vida (referindo-se ao rock nacional). Qual é você está chegando agora? Você está na janela? Saudações para quem tem coragem, meus amigos”.
Aos que ‘tão aqui pra qualquer viagem
Não fique esperando a vida passar tão rápido
A felicidade é um estado imaginário (…)
E foi lindo ver a homenagem à Rita Lee, a “rainha da porra toda”, como enfatizou Suricato.
Suspenderam os Jardins da Babilônia
E eu pra não ficar por baixo
Resolvi botar as asas pra fora
Porque
Quem não chora dali, não mama daqui
Diz o ditado
Quem pode, pode
Deixa os acomodados que se incomodem (…)
UM MIX DA NOITE COM PAULO RICARDO E BARÃO VERMELHO
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