“O reggaeton, que vendem como novidade no Brasil, eu já ouvia nos EUA desde os 90’s”, revela Ithamara Koorax


Após 27 anos, a cantora voltou ao palco da Sala Cecilia Meireles para um espetáculo totalmente jazzístico. Em conversa exclusiva com o HT, a artista ainda avaliou o cenário musical brasileiro

*Por Iron Ferreira

O Brasil é um país fértil culturalmente, onde muitos artistas contribuem com seus talentos não somente para a sociedade, mas também para a construção de uma identidade coletiva. Ithamara Koorax certamente é um exemplo fundamental na história musical do nosso país, ajudando a fomentar a relevância e a qualidade do jazz brasileiro. Eleita uma das três melhores intérpretes de jazz, ao lado da canadense Diana Krall e da norte-americana Cassandra Wilson  pelo historiador e crítico musical americano Scott Yanow e com mais de 25 discos lançados, ela é, indiscutivelmente, uma referência. Em comemoração aos 30 anos de estrada, Koorax foi convidada pela Sala Cecilia Meireles para uma apresentação especial, dia 22 de junho. O evento marcou a sua volta ao mesmo palco onde ela cantou, em 1992, ao lado de Edu Lobo.

Prestes a lançar disco novo e estrear seu show no Rio, a cantora conversou com o HT (Foto: Divulgação)

No auge dos seus 56 anos, ela se diz espantada com a atual cultura musical brasileira. Segundo a cantora, estamos sendo pautados pela transformação e incorporação de tendências internacionais. “Somos um povo que absorve influências e recicla tudo, reinventa. O problema está no pop americano, que estacionou. O Prince, último gênio do pop, morreu em 2016. Não aconteceu nada depois do rap e do hip-hop. O reggaeton, que vendem como novidade no Brasil, eu já ouvia nos Estados Unidos desde os anos 90”. Ela ainda aproveitou para comentar sobre a recente parceria entre Anitta e Madonna para o décimo quarto álbum de estúdio da rainha do pop, intitulado “Madame X“: “Ainda não ouvi a música, mas é realmente algo admirável. Algumas coisas demoram a ser aceitas, são diferentes etapas de compreensão. Esta colaboração é muito importante”.

Ainda de acordo com Ithamara, há uma onda de jovens indo na contramão do mainstream e valorizando o trabalho de grandes nomes. Ela expressou também o seu desejo de voltar a colaborar com profissionais do ramo eletrônico e chamou a atenção para uma nova geração de instrumentistas nacionais. “O que eu sei é que existe uma geração bem jovem de fãs, uma galera de 20 e poucos anos, que está vidrada no som do João Donato, do Marcos Valle, do Azymuth, do Arthur Verocai, e que também se interessa pelo meu trabalho. Outro ponto a ressaltar: a cena eletrônica brasileira, a cena clubber, é um caldeirão de talentos. Gostaria de voltar a fazer shows no Brasil nessa área eletrônica, como fiz nos anos 90, e como continuo fazendo na Europa com Parov Stelar e outros DJs. Temos também uma safra de grandes jovens instrumentistas: Pedro Martins, Diego Figueiredo, Hamilton de Holanda, Daniel Migliavacca, essa turma é espetacular”.

Ithamara acredita que o gosto musical dos brasileiros é diretamente influenciado por ritmos do exterior (Foto: Divulgação)

Sobre o show no Rio, Koorax afirma que a Sala Cecília Meireles “é uma espécie de ‘lugar sagrado’, onde já assisti concertos memoráveis. Mas prioritariamente destinada à música clássica. Este ano, após assistir um concerto maravilhoso da pianista Simone Leitão, que tem uma carreira brilhante e honra o nome do nosso país no exterior, ela disse: “você devia fazer um show na Sala”! Eu não tinha me dado conta de que haviam se passado 27 anos desde o show com o Eu Lobo! Parecia que tinha sido há 10 anos no máximo. O tempo realmente voou. Como a Sala está reformada e linda, com uma acústica espetacular, e uma programação aberta também ao jazz, a sugestão da Simone vingou. Farei um concerto acústico, priorizando baladas, com meu trio e o convidado especial Joatan Nascimento, um dos maiores trompetistas do mundo, que vem ao Rio especialmente para o show”.

O espetáculo também irá promover o seu mais recente disco, intitulado “Ithamara Koorax Sings The Jazz Masters”. O show será totalmente dedicado ao estilo que consagrou a intérprete no Brasil e no mundo, além de prestar homenagens aos maiores e mais importantes nomes do gênero. “O disco nasceu como encomenda de uma gravadora coreana. Algumas músicas foram sugeridas e eu completei o repertório com temas de Cole Porter, Dave Brubeck e Herbie Hancock. Será o primeiro show no Rio com esse repertório. Canto músicas que foram consagradas por nomes como Miles Davis (“All Blues”), John Coltrane (“Giant Steps”), Chet Baker (“Love For Sale”) e Ella Fitzgerald (“Autumn In New York”). Desta vez será um show inteiramente acústico e focado no jazz. Tenho 50 músicas que se encaixam neste repertório. Na hora vou escolher 15. Quero cantar também alguma obra de Bach, porque ele e Mozart foram grandes jazzistas, mestres da improvisação”.

No espetáculo, ela irá privilegiar clássicos do jazz (Foto: Divulgação)

Apesar de já ter passado por mais de 20 países, a cantora afirma que nada se compara ao público brasileiro. Ela reafirma que a energia em solo nacional é inigualável. “É realmente o público mais caloroso do mundo. Quando um artista diz isso, não está fazendo média. Pode perguntar para o Paul McCartney, para o Stevie Wonder ou qualquer outro. A energia da plateia é incrível! Em segundo lugar, acredite se quiser, vem o público sul coreano, muito quente e carinhoso. O público japonês também é impressionante, muito bem informado, bastante culto musicalmente, mas mais contido, silencioso”.

Apesar de ter se apresentado em mais de 20 países, a cantora afirma que o público nacional é o melhor (Foto: Divulgação)

A contribuição de Ithamara para a música brasileira é tão profunda que ela já colaborou com os principais nomes do universo artístico, como Tom Jobim, Luiz Bonfá, Edu Lobo, João Donato, dentre outros. Sua essência foi formada pelo convívio e a oportunidade de ter tido experiências ao lado desses grandes símbolos. “Os principais “prêmios” que recebi foram as oportunidades que esses grandes artistas me deram de criar ao lado deles, de cantar com eles. Tom Jobim e Luiz Bonfá eram extremamente reservados, raramente gravavam com cantores. E eles tocaram em discos meus! Pode haver um prêmio maior do que esse? Isso vale também para outros gênios como o Donato e o Edu Lobo, claro, com quem fiz shows emocionantes. Aprendi muito com eles e também com Marcos Valle, Larry Coryell, Gonzalo Rubalcaba, José Roberto Bertrami, Dom Um Romão e João Palma. Quando você toca com músicos desse nível, melhora demais, se aperfeiçoa. Aprendi muito e melhorei meu fraseado, por exemplo, tocando com bateristas como o Dom Um, o João Palma e o Mamão, do grupo Azymuth”.

Serviço:

Sábado, dia 22 de Junho

LOCAL: Sala Cecilia Meireles

HORÁRIO: 20hs.

Ingressos: R$40.

End.: Largo da Lapa 47, Lapa.

Tel: 2332-9223

CLASSIFICAÇÃO Livre