*Por Rafael Moura
Dona de uma voz densa e uma presença de palco inigualável, Alice Caymmi entende o peso de seu sobrenome. Como uma ave rara do paraíso, a carioca renasceu, ao raspar a cabeça, para encarnar Electra, uma princesa amargurada e impulsiva, levada mais pela fúria do que pela maldade. A cantora que divide o palco apenas com o pianista de Itamar Assiere, cada qual com sua luz, universo e vida própria, de forma a destacar a voz potente de Alice e a sonoridade sublime do piano, fez duas apresentações (dias 18 e 19), no Centro Cultural São Paulo (CCSP) para lançar o seu quarto álbum, Electra, pela gravadora Joia Moderna. “Eu vejo como um dos lançamentos mais corajosos da minha carreira. No sentido de eu saber exatamente o que estou fazendo. Parece que o que sempre esteve em mim era o caminho certo o tempo inteiro. O básico, o ancestral, o fundamental”, ressalta Alice.
No espetáculo, dirigido por Paulo Borges, os antigos teatros gregos e shakespearianos, onde na parte superior (galerias) a plateia podia ver de pé e interagir. Essa atmosfera serviu de inspiração para remontar a apresentação repleta de drama, força e energia. “Essa atmosfera ajuda bastante no conceito cênico e temático que queremos levar ao espectador”, conta Paulo Borges. Já a cantora rende muito elogios ao diretor: “A parceria com o Paulo é maravilhosa, temos uma sintonia incrível e ele possui um olhar único o que torna tudo especial. Uma união para repetir muitas e muitas vezes”.
Dividido em três atos batizados “Tragédia”, “Revolução” e “Futuro”. Nesse percurso, em vestes assinadas por Alexandre Herchcovitch, Alice Caymmi mostra as canções que garimpou, junto de Zé Pedro (diretor artístico do álbum), em obras de antigos compositores; além de revisitar músicas de seus três álbuns anteriores como “Inocente” (do álbum “ALICE”, de 2008); “Como Vês” (de “Rainha dos Raios”, de 2014) e “Unravel” (de seu autointitulado álbum de estreia de 2012).
A rainha dos raios mostra que pode e deve ocupar o posto de um dos maiores nomes da MPB da nova geração. “Com as mudanças do cenário socioeconômico político e com o cenário difícil que assolou o país e atingiu as pessoas que amo, eu não tinha mais clima para fazer os shows do disco pop, porque ele foi produzido em uma outra época, em que eu nunca imaginava que isso fosse acontecer. Se eu não mudasse o meu andar da carruagem, eu não ia conseguir ser verdadeira do jeito que eu precisava”, revela Alice.
O lado cênico de Alice Caymmi, que é formada em teatro, agregou na composição da nova fase da artista. Com uma performance visual intensa e dramática, além da mitologia que compõe a estética escolhida para o disco: o mito grego de Electra. “Essa história inclui todos os aspectos fundamentais da vida humana, todos os arquétipos familiares, coisas do mal-estar atual, que dialogam com esse mito, com essa tragédia. Eu trouxe as músicas que dialogavam com esse estado e fiz o disco”, conta.
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