* Por Carlos Lima Costa
Um Michel Teló introspectivo, diferente do que os fãs estão acostumados a escutar em seus discos. Essa é a proposta de Pra Ouvir no Fone, novo EP do cantor com sete faixas, lançado hoje, com o clipe de O Tempo Não Espera Ninguém. O tom mais reflexivo das canções e o desejo de abordar temas simples do cotidiano remetem à ideia da inspiração ter surgido nesse momento delicado de pandemia presente em todo o mundo.
Na verdade, o cantor resgatou projeto guardado há cinco anos. “Tenho a vivência na música sertaneja, ouço e ouvi muito Almir Sater, Renato Teixeira. Esse tipo de som é algo que eu canto muito em casa, são modas nessa pegada que rolam nas reuniões de família. Comecei a fazer quando fiquei sabendo que ia ser pai, quando a Thaís (Fersoza) estava grávida da Melinda. Acho que a paternidade mexe muito com a gente, na questão do que queremos passar para nossos filhos. Desejamos nos tornar seres humanos melhores”, lembra ele, que além da menina de quatro anos, hoje, é pai ainda de Teodoro, de 3 anos.
Curiosamente, nesta semana de lançamento, o tema filhos estava sendo comentado na internet dando conta de que a atriz poderia estar grávida novamente. Ideia reforçada com postagem dele sugerindo à mulher a ideia de mais uma criança. “A pandemia, no entanto, provocou essa parte difícil, um momento complicado para o mercado de eventos, de shows. Por outro lado, me trouxe esse lado bom que eu sempre quis viver, de acompanhar bem cada desenvolvimento, o crescimento. Sempre quis participar mais da vida deles. Vinha planejando isso desde o ano passado, me organizando. E a quarentena me fez viver mais junto esse dia a dia, todos os cafés da manhã, os almoços, porque normalmente três dias da semana eu não estava em casa. Quer dizer, Gostamos de ficar grávidos, mas esse lance de ter mais um filho não está nos nossos planos. Foi uma brincadeira”, diverte-se.
E prossegue lembrando quando sozinho, em quarto de hotel na estrada começou a compor O Tempo Não Espera Ninguém. “A letra veio junto com o pensamento de quando será que a vida vai ser boa, porque a gente fica sempre esperando aquele momento que vamos dizer ‘ah, agora sim’. Estava fazendo o que sempre fiz e amei e vieram esses pensamentos de achar o equilíbrio disso tudo. Será que a vida é só trabalhar o tempo todo”, acrescenta. Ao chegar em casa, mostrou para a mulher, que gostou. “Com esta música quis mostrar que o tempo, às vezes, não dá chance para a gente dizer que ama alguém, para dar um abraço. Por exemplo, agora, a gente entrou nessa pandemia, eu não vejo meus pais desde março. Fui a Campo Grande e os vi quando minha avó faleceu, queria ter ido mais vezes lá, fui no velório dela”, acrescenta.
A partir dessa canção, Teló foi trabalhando outras. Em certa ocasião, Melinda já tinha nascido, e enquanto compunha, ao ouvir um suspiro da menina, isso o inspirou e ele acrescentou a letra de Sonhos e Planos o trecho “suspiro profundo no entardecer e Deus tocando viola”. Mas como ele mesmo diz, no corre corre da vida as canções ficaram guardadas. “Até que veio esse momento maluco que estamos vivendo, essa pandemia. E aí, no final de abril, decidi levar este projeto adiante. Queria fazer algo mais MPB, cantar de um jeito diferente e esse projeto me trouxe paz, me soou de maneira agradável. Tem a simplicidade do que a gente queria, do que a gente ouve na nossa vivência. Por causa de tudo que temos vivido, acho que realmente este trabalho aconteceu no momento certo”, aponta. O EP traz ainda as faixas Motivos, Dia Nada a Ver, Café Coado, Verão de Um Amor Caipira e a canção título Pra Ouvir No Fone.
O elemento fé também está presente. “Quis falar dessa paz, de Deus e de como é importante a gente planejar sim e pensar positivo. Eu sempre tive muita fé. Levo isso para a minha vida e me vejo como exemplo. Quando fui lançar minha carreira solo, desenhei um quadro e escrevi tudo que queria pra mim. Acredito na força do planejamento. Agora, não escrevi que queria fazer sucesso no mundo inteiro, quer dizer, foi além do que eu imaginava. Mas, então, este é um projeto totalmente diferente. Espero que as pessoas sintam esse gostar no coração igual eu sinto quando ouço. Quis falar de como a gente leva a vida ou gostaria que fosse, são reflexões”, explica.
Lembrar a forma como fez sucesso no mundo, remete a internet. Mas como Teló lida com ela, com os cancelamentos nas redes sociais? “Como tudo, a internet tem o lado maravilhoso e o lado ruim. Pra mim, por exemplo, Ai Se Eu Te Pego é uma canção que foi lançada na internet, no YouTube, viralizou e com ela eu rodei o mundo. Música cantada em português. Antes dela, acho que só aconteceu isso com Chorando Se Foi e depois mais nenhuma. Então, pra mim foi positivo. As redes sociais estão aí para dar voz a muita gente que tem trabalhos maravilhosos, mas, ao mesmo tempo, tem espaço para dar voz ao ódio, a polarização, ao desrespeito. Infelizmente tem muito isso e é difícil de lidar. No começo, no Twitter, me incomodava mais. Hoje, consigo levar mais na boa, vou lá bloqueio”, diz, sorrindo.
E frisa um detalhe importante: “Na rede social, a pessoa só mostra o que quer, às vezes não está bem, está chateada e coloca uma mentira e vai se vendendo mentiras. Outras vem e falam: ‘O cara está o tempo todo feliz e a minha vida não é assim’. Quer dizer, vão se imaginando vidas perfeitas que não existem. Ninguém, nem o cara mais rico, bonito, saudável e forte do mundo tem a vida perfeita. Todos tem problemas, perrengues, dificuldades externas e internas consigo mesmo. Esse é um risco. Todos nós temos que ter essa consciência com relação a rede social. Senão começa a achar que a vida de todo mundo é perfeita e só a sua não é. Então, temos que nos atentar para esse lado que é importante.”
Em termos de sucesso internacional, ouvimos falar hoje em dia sobre resultados obtidos pela cantora Anitta, por exemplo. E a música sertaneja? “Sempre tive a consciência de que aquilo era um processo natural, que era difícil manter uma música cantada em português. Estava em um momento que queria ter minha família, aproveitar esse sucesso aqui no Brasil, trabalhar muito aqui. Começar uma trajetória lá fora, como me disse o Zezé Di Camargo é ter cada pé em um barco, teria que me dedicar muito. Acho que teve aquele momento. Eu sempre tive a consciência de que ia surfar aquela onda. Naquela época, o Gusttavo Lima estourou lá fora também com o Tchê Tchê Rere, músicas fáceis de serem cantadas lá fora, porque se tiver com muita letra fica difícil, por exemplo, para o cara da Croácia cantar. Foi um momento legal, mas depois coloquei meu pé no chão. Meu trabalho é aqui no Brasil. Não tenho pretensão de ter carreira internacional, nunca tive. Sou grato pelo que vivi. Viajei o mundo e vi as pessoas cantando, foi surreal, mas tenho consciência dessa dificuldade de transpor o idioma em música e tocar no mundo inteiro. Estou tranquilo com relação a isso”, analisa.
Preocupado em ser um ser humano melhor, se questiona sobre o que deseja passar para os filhos. Entre as questões mais sérias está a da sustentabilidade. De certa forma, quando se assiste ao seu novo clipe gravado nas montanhas de São Luiz do Paraitinga, na região do Vale do Paraíba, São Paulo, o cenário remete a esse tema que o preocupa. Tanto que em sua fazenda tem instalado painéis solares.
“É um vale tão lindo e estar cantando músicas tão especiais, nesse momento que estamos vivendo, naquele lugar, vendo o pôr do sol, me emocionou várias vezes. E realmente me lembrou essa questão. Temos fazenda no Pantanal e está tudo muito complicado. A questão da água, por exemplo, estamos furando os poços, mas estão secando. Eu tenho fazenda de reflorestamento de mogno, então, a gente tem essa cultura da roça. Na minha casa, a gente tem os painéis solares e vamos colocar agora na fazenda. Acho importantíssimo a gente pensar e passar para as crianças sobre essa questão da sustentabilidade. Elas são pequenas, mas na escola já estão aprendendo sobre reciclagem. Isso tem que estar presente cada vez mais na nossa relação com o meio ambiente para cuidarmos do futuro desse mundão para os nossos filhos”, ressalta.
Ainda sobre o álbum, aponta que ele traz a mensagem de cada um se voltar para o interior. “Estou em casa desde março. Já estamos em dezembro. Não imaginávamos que íamos viver essa loucura toda que estamos vivendo. Infelizmente, muita gente não está respeitando isso, não está levando a sério. É triste ver isso, a pandemia trouxe muitos extremos. Só a gente sabe o que vivemos dentro de casa, as dificuldades, os perrengues, a loucura toda, então, chegou um momento que tocou muito forte o meu coração de fazer este trabalho. Estamos em casa, mas é um corre corre danado administrar todas as coisas, as crianças são pequenas, tem que estar sempre de olho. Estou ouvindo esse álbum e está gostoso. Espero que faça bem para as pessoas como faz para mim. E este é um momento para todo mundo repensar um pouco.”
E prossegue: “Desde Ai Se Eu Te Pego e Fugidinha, sempre quis trazer algo diferente do Teló, da balada, da festa. Vim dos bailes, sempre gostei de ver a turma dançando. O melhor grupo é o que coloca a turma para dançar, o salão fica cheio, então, sempre me diverti fazendo música animada, mas nada pode limitar você de falar também do que você gosta de ouvir, do seu dia a dia, dos seus sentimentos, das coisas simples da vida. Então, esse álbum agora veio a calhar com canções que estavam guardadas no coração faz tempo, que tem o lado do Teló, mas tem também o do Michel do interior, que eu gosto e acho importante mostrar também, pois faz parte da minha vivência, da minha vida aqui em casa. A música Sonhos e Planos também é do interior do Michel. O que seremos e viveremos no mundo que vem depois. A gente planeja sonhos, mas com o pé no agora”, finaliza o técnico do The Voice Brasil, que venceu as cinco edições anteriores.
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