*Por João Ker
Com a plateia lotada de fãs e amigos, Malvino Salvador estreou na noite desta quinta-feira (9/10) “Chuva Constante”, peça que entra em cartaz de quinta a domingo na Sala Marília Pêra do Teatro Leblon, Rio. Originalmente lançado em 2007, o texto assinado por Keith Huff foi um sucesso de bilheteria nos EUA quando, em 2009, foi montado na Broadway com Hugh Jackman e Daniel Craig nos papeis principais. Agora, ao lado de Augusto Zacchi e sob a direção de Paulo de Moraes, Malvino se prepara para apresentar a versão brasileira desta história policial.
Na história, Joey (Zacchi) e Denny (Salvador) são dois policiais amigos de infância que vêem suas vidas se transformarem radicalmente no espaço de poucos dias, para o melhor e para o pior, colocando em risco não apenas uma amizade de anos, mas suas próprias vidas. Através de monólogos exaltados e diálogos pingue-ongue, ambos vão contando suas versões de uma trama complicada e ágil, que exige total atenção do público. Denny é um policial casado, com filhos que tem aquela “vidinha perfeita” e que pretende ajudar Joey a alcançar a mesma qualidade de existência, mesmo sem o consentimento ou vontade deste. O outro, por sua vez, está se recuperando do alcoolismo e não vê problema algum em ficar sozinho. O antagonismo dos personagens transcende o momento pelo qual cada um está passando e se estende para as personalidades dos dois, que parecem yin e yang em suas essências. Enquanto Joey tenta seguir as regras com paciência e dedicação, o temperamento curto de Denny o impede de sequer levar a sério as reclamações e avisos do amigo. É exatamente essa precipitação descuidada deste último que acaba resultando em uma epopeia de acontecimentos trágicos e absurdos, que chegam a referenciar o infame caso do serial killer e canibal Jeffrey Dahmer.
A dinâmica e montagem da peça consiste em duas poltronas que são arrastadas pelo palco à medida que as discussões vão se apimentando. No fundo, uma tela de LED vai exibindo closes dos atores captados em tempo real, ao mesmo tempo em que transmite vídeos pré-gravados que servem como um complemento ao visual da trama, com takes da cidade, das cenas de sexo relatadas e da chuva constante, que funciona tanto de forma literal como metáfora para as várias tragédias dos dois. Assim, o uso dessas imagens se torna essencial para a construção da atmosfera desse thriller pós-moderno – o qual já despertou a atenção de Steven Spielberg, de olho em uma adaptação cinematográfica da peça -, da mesma forma que a química entre os dois atores se mostra um trunfo. Malvino e Augusto, os quais já haviam trabalhado juntos no filme “Mentiras Sinceras” (Pedro Asbeg, 2011), constroem assim a base para que os diálogos cheguem ao público como deveriam e surtam os efeitos necessários. Se um aparece exaltado e com a voz sempre vários tons acima do aceitável, o outro equilibra a balança com o sentimentalismo e a vulnerabilidade expostos.
Ambos os atores apresentam performances contundentes que conferem nuances às suas respectivas humanidades, caminhando com facilidade entre os estados de paixão, ódio, medo e, principalmente, desespero. Em bate-papo com o HT, Augusto Zacchi comenta aquilo que o atraiu na produção: “O texto de cara tem uma pungência de história e conteúdo, além de uma tensão muito interessante. A forma como a trama é contada também me atraiu de imediato. Essa peça mostra um momento de passagem na vida desses personagens, então de certa forma eu me identifico com isso”.
Malvino Salvador, que se prepara para o início das gravações de “Qualquer Gato Vira-Lata 2”, descreve o que mais o seduziu no texto, além de todas as variações de seu personagem: “Eu costumo defini-lo como o cara que quer fazer as coisas certas, mas acaba fazendo da maneira errada. A obra como um todo me motivou bastante. É um texto muito contemporâneo que fala sobre amizade, lealdade, traição. Eles serem policiais é um pano de fundo, a única coisa que isso acrescenta é uma tensão maior porque eles lidam com a morte no seu cotidiano. Eu gostei bastante do Denny porque foi uma oportunidade de fazer um personagem diferente de todos os outros tipos que eu já havia feito. É um desafio porque ele é bem diferente de mim, foi algo que eu reparei na hora que eu li o arquétipo desse personagem”.
O texto, ele conta, já estava nos seus planos há alguns anos, quando foi oferecido pela produtora Cínthia Graber: “Há três ou dois anos, nós nos encontramos por acaso em uma estreia e ela disse que tinha um texto maravilhoso para mim. Como o texto estava em inglês – e eu não tenho conhecimento suficiente do idioma para entender uma peça assim – o tempo foi passando, eu entrei em outros projetos e acabei perdendo o fio da meada. Há uns seis meses nós nos encontramos de novo no aeroporto, logo depois de eu ter acabado [a novela]“Viver a Vida”, e perguntei para ela ‘Vem cá, e aquela peça que a gente ia fazer?’. Ela me mandou o texto e, cara, quando eu li, quis fazer na hora”, diz o ator, que ainda comenta sobre a liberdade que sente no teatro. “A diferença é que eu posso escolher o que eu vou fazer no palco. Eu tenho como dizer ‘Eu quero fazer isso, vou lá, produzo e faço’. No cinema isso não dá para acontecer porque é tudo muito caro. Na televisão eu fico a mercê dos convites – e graças a Deus eu tenho tido ótimas experiências. Mas o teatro é o lugar onde eu tenho essa liberdade de escolha e posso até direcionar a minha carreira, dizendo ‘Eu quero fazer isso agora porque eu acho que vai ser bom para a minha carreira e para o meu aperfeiçoamento. Foi por isso que eu resolvi fazer essa peça”.
Aproveitando que a badaladíssima estreia, cheia de personagens interessantes, HT resolveu levar o título de “Chuva Constante” ao pé da letra e perguntou aos convidados: O que poderia faz o carioca entrar na chuva para se molhar? O veredito geral? Bom, faça chuva ou faça sol, o povo do Rio gosta mesmo é de cultura. Confira:
A bela Cris Vianna, no ar com “Império”, afirma: “Carioca é eclético, entra na chuva por alegria, para rever os amigos e para uma boa peça também. Se valer a pena, ele entra na chuva.
Rita Guedes veste o verde na alma e incorpora a defensora do meio ambiente, e declarando: “Carioca entra na chuva pelo calor de 45ºC e pelo efeito estufa”.
Eriberto Leão, que mais tarde seria só elogios com o amigo Malvino, é outro fã dos programinhas cult no circuito: “Entro na chuva por um bom cinema ou por um boa peça de teatro”.
Quase a mesma resposta foi ecoada por Zezé Polessa, que ao final do espetáculo disse se sentir tensa com a trama e resolveu fazer uma listinha de motivos para cair de cabeça no aguacéu: “Carioca entra na chuva para ir ao cinema ou ao teatro, ir a uma feira de produtos orgânicos bem cedinho, passear com o filho, encontrar o namorado…”.
Baluarte do cinema nacional, daqueles que cai de cabeça em um projeto, qualquer que seja o estado climático, Domingos de Oliveira, é categórico e bem-humorado, comentou: “Eu adoro entrar na chuva! Ela só molha, não tira pedaço!”.
Fotos: Zeca Santos
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