Luiza Boê lança EP com foco no desejo, cura e universo feminino


A cantora, dona de singles marcantes, comenta que a principal mensagem que deseja passar com suas produções, é de que há muita cura quando o amor é transformado em arte

*Por Domênica Soares

Em seu novo trabalho musical, com o EP “Terramar”, Luiza Boê celebra um dos aspectos mais importantes da música brasileira e do próprio Brasil: o mix de influências. Com um povo marcado pela miscigenação e pluralidade cultural, a cantora resgata essas características e presenteia o público com quatro faixas, com mix de seu próprio ritmo, que conta com a bateria de Domênico Lancellotti, a percussão mineira de Paulinho Santos e a guitarra paraense de Manoel Cordeiro. “Esse encontro é sobre poder dialogar diretamente com artistas que me inspiram. Poder juntar meu trabalho com pessoas que são referências para mim é consagrar e enfatizar o diálogo que, de alguma forma, já existia antes de nos conhecermos pessoalmente”, relata a cantora. Além disso, quem assina a produção do novo EP, é Alexandre Kassin.

Luiza explica ainda o nome do disco e relata que “Terramar” é uma força criativa com o intuito de falar sobre a relação com o feminino, a mãe e o desejo. Garante que tudo isso faz parte do canto à própria cura. “Terramar” é uma palavra que contempla tudo isso: terra é firmeza, contorno, corpo, terreno, raiz; mar é feminino, é sentir, é imensidão, cura, o que lava e leva. E também diz muito sobre mim. Nasci nas montanhas de Minas Gerais, cresci na ilha de Vitória/ES; sou capricorniana, que na astrologia é representada por uma cabra com rabo de peixe. A capa do disco, assinada por Flora Negri, também representa o corpo como terra, como tronco, em um mar de emoções”, pontua.

No disco, Luiza focou nas misturas de sons (Foto: Flora Negri)

Sobre o processo de criação, a cantora relata que um de seus grandes sonhos profissionais era trabalhar com o produtor Alexandre Kassin. Lembra que, por ser muito sagaz e persistente, foi até o estúdio de Kassin, se apresentou, mostrou as músicas por audio do celular e ele curtiu muito. Estava fechada uma parceria. “Tivemos uma sintonia muito grande sobre a sonoridade que queríamos alcançar, com predominância da percussão, violoncelo em “Mãe” e “Indomável” e a guitarra, para contrapor à organicidade dos sons. No estúdio, era brincar de fazer música e ver o Kassin produzir tudo com tanta facilidade, leveza, me deu certeza de que ele é o grande alquimista da música brasileira”, comenta Luiza, contando ainda que no seu processo de criação, grandes nomes da música brasileira também frequentavam o estúdio de Kassin, como Jorge Ben Jor, Marcos Valle, Frejat e Marcelo Jeneci.

Contudo, em meio a tantos singles marcantes, um deles ganhou destaque: “Terra-fogo vulcão”, em parceria com o cantor Otto. Mais uma vez ela mostra que sua vontade e sagacidade teve destaque, quando comenta que conseguiu a parceria através de uma mensagem direta: “Convidei o Otto para gravar comigo essa música, porque ela tem uma vibe erasmiana que tem muito a ver com ele. Foi uma surpresa linda. É um artista muito entregue a seu ofício, além de ser muito generoso”.

Luiza descreve que, atualmente, está em um ritmo muito frenético de gravações, visto que das quatro faixas, três clipes já foram gravados em apenas quatro meses. Luiza conta que a linguagem audiovisual é essencial para complementar as mensagens que ela queria passar com suas músicas. “Em“Mãe”, principalmente, pude recorrer a diversos atos simbólicos, com referências na Constelação Familiar, em Aguahara, na escultura de Alexander Milov para ir mais fundo no tema da relação materna.“Terra-fogo vulcão” foi um clipe espontâneo, simples, que teve como princípio corpos como terra e o encontro dos corpos como fogo, vulcão. E fluiu super bem a gravação com Otto, fico muito orgulhosa do clipe”.

A cantora expressa ainda a importância de expor temáticas como essas que são abordadas em suas composições e descreve que sua música fala de força feminina, magia, relação materna e desejo. E que essas questões profundas atravessam todo o mundo e,dessa forma, quando compõe há um retorno cheio de cura, tanto para ela, quanto para as pessoas que a escutam. “Acredito que quanto mais as pessoas olharem para o próprio feminino distorcido, para a relação com a mãe, que ainda é repleta de tabus e idealizações, para o próprio desejo, sem censura, para o autoconhecimento, a transformação de dentro para fora, na micropolítica, têm consequências incríveis na sociedade”.

Luiza Boê lança novo EP (Foto: Flora Negri)

A carreira de Luiza Boê começou ainda na adolescência. Hoje, ela analisa em tom otimista o mercado de música e o descreve como muito fértil, plural e que está a todo vapor. Além disso, comenta que aqueles que estão começando agora podem encontrar grandes chances para se destacar e alavancarem suas carreiras artísticas. “Toda sexta-feira são lançados alguns grandes álbuns da música brasileira. É uma oferta imensa. Costumo dizer que adoro o fato de as bandas de uma galera jovem estar produzindo artistas consagradas, como o disco novo do Mautner, produzido pela banda Tono, o “Besta Fera” do Macalé, pelo Kiko Dinucci, da Metá Metá, e Tim Bernardes, d’O Terno, que é a mesma galera que produziu o disco da Elza Soares. E também novos nomes, como Luiza Lian, Luedji Luna, Ily, Duda Beat, Luciane Dom e Julia Mestre, que estou ouvindo bastante”.

“Pragmágica” (a mistura de pragmatismo com a magia), corajosa e resiliente, ela diz que toda sua carreira é baseada em inspirações. Uma delas é a magia, da qual ela acredita ser uma matéria elementar da arte, fazendo com que seu processo de composição musical se torne natural e, com isso, consequentemente, consiga colocar para o público, o que está de fato dentro de seu coração. Além disso, ela cita também algumas personalidades da música, mas também da poesia, como por exemplo, Maria Bethânia, Otto, Céu, Arnaldo Antunes, Rodrigo Amarante, Mãeana, Hilda Hilst, Sophia de Mello, Alice Ruiz e Eucanaã Ferraz. A cantora conta que seu maior sonho é rodar o Brasil e o mundo apresentando suas músicas e sentimentos para as pessoas com a mensagem principal de toda sua jornada: “Acredito que a mensagem essencial é de que há muita cura em transformar dor em dom, em beleza. E amor em arte”.