*Por Jeff Lessa
O cantor carioca Leopold Nunan, um dos artistas que agitou a cena cultural dos anos 1990 e 2000, voltou a causar com a canção “Banzé”, um verdadeiro libelo pelas causas dos indígenas brasileiros, como a demarcação e a efetiva posse de suas terras. A canção, que foi composta por Beto Brown, puxador dos blocos Suvaco do Cristo e Monobloco, faz parte do EP “Leo from Rio”. Com quatro canções, o projeto teve seu lançamento oficial no domingo, 19 de maio, durante a Long Beach Pride, que celebrou os 50 anos da rebelião de Stonewall.
As cenas do clipe foram captadas em Los Angeles e no Rio de Janeiro. Nos Estados Unidos foram gravadas em Slab City, comunidade a 272 quilômetros de Los Angeles considerada território neutro, onde ninguém paga impostos ou se submete às leis americanas. Only in America…
Beto Brown define o estilo musical como um Miami bass, ritmo que, apesar do nome, surgiu nas favelas cariocas. A produção ficou a cargo de Donatinho, tecladista e filho de João Donato, que também se apresenta como a drag queen Natasha Oliver. Mas… o que é Miami bass?
– Havia um beat de Miami que tocava muito nos bailes de favela e dos subúrbios do Rio de Janeiro – conta Brown. – Depois, misturado ao batuque carioca de umbanda, virou o funk batidão, também chamado de tamborzão.
O índio Inuia Kamaiura Amarü, da aldeia Kamaiura, no Xingu, participa do clipe, bem como a ativista americana Morena Santos, filha de brasileiro e dançarina de samba. A personagem dela sente-se protegida pelo muiraquitã, uma pedra jade em forma de sapo encontrada no Pará e usada pelos índios como talismã protetor. Na tela, Leopold se transforma no muiraquitã, com pintura corporal realizada pelo grafiteiro argelino Kool Skull.
O título “Banzé” veio da paixão de Brown pela palavra. Um gosto pela sonoridade ouvida em outra música, muitos anos atrás, que nunca o deixou:
– Preparei a canção “Boneca de piche”, de Almirante, gravada em Los Angeles por Carmen Miranda e Nestor Amaral, para o meu pai ver em um show. E a letra continha a palavra banzé. A partir daí, eu me encantei por essa palavra. Ela pode ter a ver com liberdade também. Com esse sentido, gosto mais ainda.
Vivendo há 18 anos nos Estados Unidos, Leopold Nunan conquistou um público cativo. Já cantou em todos os clubes, boates, teatros e festas de Los Angeles e, atualmente, tem um estúdio de gravação em casa, no elegante e exclusivo bairro de West Hollywood. O lançamento da música não deixou tempo livre em sua agenda.
– Estou com a agenda de shows lotada para as próximas semanas – afirma Leopold. – Mas o que me emocionou foi ter sido selecionado para a legendária Long Beach Pride em um ano ultra simbólico para o movimento LGBTQI+, quando a rebelião de Stonewall completa cinco décadas. Fui a atração principal do festival no palco Dance Music.
Parabéns, não é pouco. Apesar de muitos compromissos, Leopold sempre encontra tempo para vir ao Brasil: todo ano está aqui. O artista conta que a partida para os Estados Unidos não foi uma escolha tranquila:
– Minha mudança de país foi bem difícil, porque eu amo muito o Brasil e deixar todos os amigos e a família não foi fácil. Saí do Brasil com 23 anos à procura de novos horizontes na música eletrônica e na performance. Logo tirei um visto de extraordinária habilidade em artes. Hoje, eu sou cidadão americano e tenho muito orgulho de representar meu país aqui.
O motivo para não voltar de vez é puro amor:
– Não voltei porque me apaixonei perdidamente pelo meu companheiro, Thomas Soveg, e estamos há mais de uma década juntos. Formamos um time. Eu, Thomas e um dálmata chamado Miles Davis.
Ainda assim, ele acompanha de perto a cena cultural brasileira. É fã de diversos artistas daqui e, numa dessas vindas ao país, acabou participando do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo.
– Sou fã de vários artistas brasileiros. Omulu, Léo Justi com Heavy Baile, Karol Conka, Liniker, o maravilhoso Johnny Hooker, completamente apaixonado por Letrux. Tem muita música que eu gosto vinda do Brasil.
E o “Amor & Sexo”?
– Foi uma experiência surreal. Tive a oportunidade de homenagear Cazuza para uma audiência inimaginável de telespectadores. Tudo ao vivo. Uma honra ter sido convidado para cantar num programa tão de vanguarda e corajoso. Inesquecível!
Amigos e artistas que se conhecem há 20 anos, tanto Brown quanto Leopold se preocupam (muito) com a situação da cultura no Brasil atual. Para Brown, o governo caminha “na contramão do progresso”. Leopold não fica atrás:
– A primeira ação foi fechar o ministério da Cultura e cortar os recursos. Não entendem a Lei Rouanet.
Cai o pano, rápido.
Artista de talentos múltiplos (além de cantor, ele é compositor, dançarino, ator, modelo e coreógrafo), Leopold participou como bailarino de peças premiadas com o Prêmio Sharp, como “Hair” e “Sweet Charity”. Nos Estados Unidos, produziu a célebre festa Drrrama, no Standard Hotel, no Sunset Boulevard, e participou de duas temporadas do reality show cômico “Worst Chefs in America” (“Os piores Chefs da América”), além de ter aberto shows para Miss Kier do Dee Lite.
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